Em Foco 3008

O manejo adequado da água e do esgoto é sinônimo de desenvolvimento. Um indicador que nem sempre foi levado a sério pelas cidades brasileiras ao longo da nossa história. Em Pernambuco, Jaboatão e Petrolina foram apontadas pelo Instituto Trata Brasil como exemplos incômodos do muito que ainda tem que ser feito para acabar com o desperdício e reduzir doenças. A análise do Em Foco do sábado do Diario é de Luce Pereira.

As raízes do atraso

Estudo mostra duas das maiores cidades de Pernambuco, Jaboatão dos Guararapes e Petrolina, entre as piores do país nos quesitos saneamento e distribuição de água

Luce Pereira

O Instituto Trata Brasil, uma das maiores vozes do país em termos de saneamento ambiental, acaba de cravar uma verdade incômoda na atual imagem de Jaboatão dos Guararapes, que aposta do discurso do desenvolvimento como forma de fechar criticadas janelas do passado. É que pelo mais recente estudo da entidade, o município aparece ocupando a terceira posição entre os dez piores do país neste quesito, ainda com o agravante de, apesar da confortável situação econômica, aparecer como o de menor investimento no setor.
Desde que saneamento deficiente é sinônimo e ao mesmo tempo sintoma de atraso, a atual condição mostra um mar nem tão cor de rosa assim na poderosa propaganda centrada em “avanços” conquistados pela gestão. Eles existem, claro, mas são questionados ante a preocupação da maioria das grandes cidades brasileiras em se ver livres da vergonha histórica – tão grande que pode funcionar como um dos piores cartões de visita. Jaboatão não só não fez o dever de casa como insiste, ao não investir na medida necessária, em permanecer longe da meta de universalização, que tem a reta de chegada em 2033.
A atual gestão pode e deve dividir a conta pelas deficiências nesta área com administrações verdadeiramente desastrosas, que afundaram as contas públicas e deixaram o município sucateado, com infraestrutura pedindo socorro, além de índices de desenvolvimento próximos do quase inaceitável. No entanto, apesar de todas as lições dadas país afora, exemplos os mais possíveis de serem seguidos, Jaboatão permanece dando prioridade a outros assuntos e áreas, como se esta não fosse a maior das necessidades. E este ônus não tem como ser dividido.
No entanto, há sempre uma explicação oficial e neste caso, ela é dada pela Secretaria de Desenvolvimento Humano e Sustentabilidade, que aponta a Compesa como responsável pelos baixos investimentos, além do processo de adesão à Parceria Público-Privada, que promete zerar esta conta até 2025.
Mas não é só o município administrado (pela segunda vez) por Elias Gomes (PSB), o único a depor contra a imagem de desenvolvimento cuidadosa e politicamente cultivada por Pernambuco, nos últimos oito anos. Outra grande economia regional, Petrolina (Sertão), também, não se preocupou em dar conta deste recado, apesar de aparecer como exemplo de crescimento. Pelos dados do instituto, a segunda cidade mais populosa do estado, em lugar de avançar regridiu. Deixou de ser a quarta (ano passado) para figurar como a terceira (em 2014) entre as piores do Brasil no quesito saneamento.
Apenas com isso, a dor de cabeça enfrentada por alguns dos maiores municípios do estado já estaria de bom tamanho, mas ainda resta o quesito abastecimento de água – e aí as disparidades saltam aos olhos. Apenas para citar alguns dados, enquanto a média brasileira de atendimento de abastecimento fica em 82%, Jaboatão está nos 55% e Caruaru atinge 92%. Por outro lado, enquanto Petrolina perde 45% de água na distribuição, Jaboatão registra perda de 65%.
O cidadão, que sofre diretamente os efeitos do problema, deve achar um absurdo, por exemplo, que a cada dois litros de água tratados e distribuídos pela Compesa, um seja desperdiçado antes de chegar ao destino final. E é. Ainda mais quando se verifica que 25% dessas perdas ocorrem por vazamentos nas redes.
Detalhes deste quadro nada animador podem ser vistos em ampla matéria publicada na edição de hoje de Local. Diante da riqueza de números e comparativos, a população deve se perguntar o que as economias mais pujantes de Pernambuco faziam enquanto as maiores do Brasil se preocupavam com essas questões a longo prazo. E pensar que já estivemos bem na fita até o começo do século 20, quando pelo menos o Recife se mostrava como uma das cidades mais saneadas do Brasil.