Os personagens variam do cantor norte-americano Al Jolson ao cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva. O cenário principal: Rio Branco, povoado do Sertão pernambucano, depois rebatizado com o nome de Arcoverde, pioneiro por abrigar uma das primeiras salas de projeção do interior do estado. O ano: 1917, marcado pela entrada dos Estados Unidos na I Guerra Mundial e pelos lançamentos dos primeiros discos de jazz e samba. O jornalista alagoano Carlos Nealdo dos Santos fez sua première na literatura com uma homenagem ao cinema mudo e à cultura nordestina em O pianista do silencioso, vencedor da edição 2006 do prêmio Alagoas em Cena, na categoria romance. O livro de 200 páginas tem apresentação do cineasta Cacá Diegues, ilustrações de Léo Villanova e capítulos com títulos de filmes famosos. Uma história que poderia se transformar em roteiro com, além dos citados jazz e samba, forró e xaxado na sua trilha sonora.
A história começa com a chegada do cantor Al Jolson à capital pernambucana, depois de ter o navio em que seguia para a Inglaterra ser desviado para o Brasil por conta das ameaças dos submarinos alemães. O responsável pela gravação do primeiro disco de jazz nos Estados Unidos – foi ele quem levou a Original Diexeland Jass Band de Nova Orleans para Nova York – acaba circulando pela cidade e, em um café na Rua Nova, escuta Pelo telefone, de Donga e Mauro de Almeida, o primeiro registro sonoro que levava o nome de samba. Pelo percurso da ficção e desconhecimento da língua local, o norte-americano acabaria embarcando num trem ao lado de um sertanejo que recebeu treinamento para operar o projetor do futuro cinema Rio Branco, no lugarejo situado a 270 quilômetros do Recife.
Carlos Nealdo afirma que o fato de Rio Branco abrigar um cinema mudo quando ainda era um povoado perdido no interior de Pernambuco foi o responsável pelo surgimento do livro. Na futura Arcoverde do início do século 20 viveria Dago, o protagonista do O pianista do silencioso, responsável pela trilha sonora ao vivo das fitas onde brilhavam estrelas como Chaplin, Francesca Bertini, Rodolfo Valentino e Theda Bara. Filho de um estrangeiro inglês que decidira ficar em Pernambuco mesmo após o fim do seu trabalho na Great Western, Dago seria a ligação entre Al Jolson e o cenário empoeirado de músicas e culinária estranhas.
Resultado de dois anos de pesquisas, O pianista do silencioso traça um painel que cobre os anos entre 1917 e 1934, quando o filme O cantor de jazz, com o já conhecido Al Jolson, é exibido no Rio Branco. É o fim da carreira para o pianista Dago e para uma época que teve, além da guerra mundial, a gripe espanhola e a Revolução de 1930 a marcar corações e mentes do Brasil. Interagindo suas criaturas fictícias com personagens históricas, Carlos Nealdo mostra a consolidação da supremacia norte-americana na sétima arte no momento em que se comemoravam 80 anos do lançamento do primeiro filme falado. Tema para uma outra história.