Somente em situações consideradas especiais é que o Diario de Pernambuco publica um editorial em sua capa. Isso ocorreu há 30 anos. No dia 22 de abril de 1985, o jornal utilizou este recurso, na edição em que anunciava a morte do presidente eleito Tancredo Neves. O mineiro de 75 anos de idade não resistiu a 38 dias de internação, iniciada na véspera de tomar posse. No dia 15 de janeiro, ele havia vencido, no Colégio Eleitoral, por 480 votos contra 180 dados a Paulo Maluf, reabrindo a esperança do país voltar à democracia. “O esperado inesperado terminou ferindo a Nação inteira: Tancredo Neves está morto. Numa das horas mais negras do País, ele restaurou a confiança do povo nos seus políticos, apanhou a bandeira da liberdade sacudida no chão e a ergueu em suas mãos limpas unificando uma Nação que já perdia a fé na sua História”, afirmava o texto do Diario abaixo da imagem de um Tancredo pensativo.
Pela TV ou pelos jornais, o Brasil inteiro acompanhou o sofrimento de Tancredo Neves, que foi submetido a várias cirurgias após ser internado no Hospital de Base em Brasília, na noite de 14 de março. No dia 15, ele não pôde fazer o juramento, mas o vice-presidente, José Sarney, cumpriu o protocolo e assumiu interinamente o comando do país enquanto se esperava pela volta de Tancredo. O milagre não aconteceu. O político mineiro de 75 anos não resistiu.
“A Nação está consternada. O presidente Tancredo Neves, idealizador da Nova República, faleceu, ontem, às 22h23m, depois de 38 dias de lenta agonia, oito dos quais dormindo à base de sedativos, em estado de choque, provocado pela destruição do sistema capilar periférico. A pressão caiu para o perigoso nível de 9 por 4 e o coração, bastante desgastado, começou a falhar. Os médicos não tiveram mais dúvidas: o paciente caminhava lentamente para a morte, pois o quadro se caracterizava como de insuficiência múltipla dos órgãos”. O texto da manchete antecipava que o país entraria em oito dias de luto.
A edição do Diario que foi às bancas no dia 23 de abril, com a foto do presidente no caixão, contava que o velório se iniciaria em São Paulo e que sepultamento seria em São João Del Rey, terra natal de Tancredo, destacando ainda que o Recife ficou mais triste com a notícia. “Em volta do aparelho de televisão, entre perplexos e abatidos, desempregados, camelôs, profissionais liberais, estudantes e mendigos se comprimiam para ver passar o cortejo fúnebre que seguia pelas ruas de São Paulo. Alguns ainda traziam na mão fotografias do ex-presidente e cartazes com o slogan Muda Brasil. Mais emotivas, as mulheres choravam e não procuravam esconder a dor daquela perda”. No dia 24, a comoção em Minas Gerais acabou em tragédia. A capa do Diario destacava cinco mortos e 271 feridos em confusão na sede do governo em Belo Horizonte. No dia 25, o jornal apresentava os detalhes do sepultamento em São João Del Rey, com manchete citando frase de José Sarney.
A última vez em que Tancredo Neves estivera no Recife foi no dia 3 de janeiro, quando participou, juntamente com José Sarney e Marco Maciel, de um encontro com lideranças empresariais de Pernambuco. Na oportunidade, Tancredo fez um discurso voltado ao programa de governo que pretendia executar, destacando que o Nordeste teria vez, chegando a declarar que “sem um Nordeste redimido de suas tradicionais dependências, descontinuidade e abandono,não poderá haver um País íntegro e justo, democrático e fraterno”.
Ainda em 1984, um comício em Boa Viagem marcou o fim da série de grandes atos públicos em favor da candidatura de Tancredo Neves. Foi no dia 15 de dezembro, num evento chamado de “Um Lugar Ao Sol”, que reuniu políticos e artistas como Fafá de Belém num palanque montado na areia da praia. Sob uma temperatura de 40 graus e interrompido várias vezes pelos aplausos, Tancredo saudou os jovens e garantiu que conhecia as angústias e as aspirações de todos.
Em solidariedade à morte de Tancredo, os taxistas recifenses decidiram não cobrar a Bandeira 2 a que tinham direito por causa do feriado de Tiradentes. Os seis mil motoristas da categoria usaram ainda fitas pretas nas antenas para demonstrar o luto pelo presidente.