Em Foco 2605

Partidos não morrem facilmente, mas envelhecem – e na política o “envelhecer” vem sempre na pior acepção do termo, como sinônimo de acomodação e abandono da ideia de ser instrumento de transformação. A imagem que ilustra a página é de autoria de Alcione Ferreira.

O PT vai acabar?

Vandeck Santiago  (texto)
Alcione Ferreira  (foto)

Quando Leonel Brizola morreu, em 21 de junho de 2004, escrevi em algum lugar que uma das consequências do seu desaparecimento seria o provável fim do PDT. O partido agonizaria pela falta de sua liderança maior e definharia até a extinção. Todas as vezes que vejo alguém prognosticando fim de um partido, lembro-me dessa história. A bola da vez no campo das profecias do cemitério partidário é o PT, por motivos que todos vocês conhecem. Já vi colunistas, políticos e até professor prevendo a morte do PT. Por favor, aprendam com o meu exemplo: um partido não morre por circunstâncias de um momento.
Se o argumento não for suficiente, lembremos que, bem ou mal, o PT ainda está no poder – e um dos motivos que leva uma legenda a definhar é exatamente a distância do poder (evitarei citar exemplos, para não constranger ninguém). Sem falar nas bancadas no Congresso, nos governadores e prefeitos, o partido tem ainda 3.206 diretórios municipais e 1.494 comissões provisórias. E um legado reconhecido pela história.
Mas o fato de estar longe de uma eventual extrema-unção não é sinônimo de que se está gozando boa saúde. Não está em sua saúde perfeita um partido que tem um tesoureiro preso na operação Lava-Jato, que tem outros líderes levados à cadeia em um processo de corrupção política, que vê o governo de sua presidente ostentar uma reprovação recorde e que tem de fazer malabarismos verbais para defender medidas que antes criticava.
Toda esta situação tem suscitado ultimamente diversas reflexões sobre o PT. Uma delas – já que estamos falando de vida e morte… – é que o PT vive o fim de um ciclo de poder, e Dilma deve preparar-se para entregar a faixa da sucessão em 2018 a um adversário. Quem defende essa tese é o cientista político Octávio Amorim Neto, da Fundação Getúlio Vargas. “Não sei se será bom, nem para o PT nem para a democracia, um quinto mandato presidencial. O partido precisa lamber suas feridas, se revitalizar e redescobrir suas raízes. O exercício do poder torna conservadora qualquer organização política, e essa não é a vocação do PT”, diz ele, em entrevista à Folha de S. Paulo (10/05).
Nunca é bom para um partido quando começa esta história de “lamber as próprias feridas” – é sinal de que os ferimentos estão à mostra e que muitos deles podem ter sido provocados pelo próprio corpo ferido. Mas é exatamente o processo que estamos vendo no PT, e verbalizado (de diversas formas) não apenas por analistas políticos e adversários. O atual ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, por exemplo, escreveu um documento defendendo que o PT “retome os princípios éticos” que o fizeram diferente dos outros partidos no início de sua história. Em entrevista a Helena Chagas (ex-ministra da Comunicação do governo Dilma), ele propõe “um reencontro do partido consigo mesmo” (Fato Online, 25/05). Quer, por exemplo, que o partido e os seus candidatos não recebam mais um centavo das empresas: “Não foi o dinheiro que nos constituiu, não foram os recursos de empresas nas campanhas eleitorais”. Quer também o fim do chamado PED, processo de eleições diretas, porque isso teria criado um “voto de cabresto” no partido – filiações de pessoas que não têm nada a ver com o “ideário petista” e entram para fortalecer este ou aquele dirigente, esta ou aquela tendência. Patrus Ananias não é líder de uma tendência minoritária do PT; é integrante da corrente hegemônica do partido e um dos petistas mais respeitados no mundo político. O documento dele (que tem outros pontos além dos citados aqui) está sendo motivo de debate nas reuniões preparatórias para o congresso do PT, em junho próximo.
Partidos não morrem facilmente, mas envelhecem – e na política o “envelhecer” vem sempre na pior acepção do termo. Significa acomodação e abandono da ideia de ser instrumento de transformação.