m_Julio Verne

Existe futuro no jornalismo. Pelo menos para Júlio Verne (1828 – 1905). O escritor francês, que nos presenteou com obras que ainda hoje passam de pai para filho, publicou em fevereiro de 1889, na inglesa inglesa The Forum, a narrativa O Dia de um Jornalista Americano no ano de 2889. No pulo de mil anos para o século 29, Júlio Verne imaginou um mundo onde a oferta abundante de energia faria com que as estações do ano fossem regulares, sem calores ou frios extremos, beneficiando a agricultura e também o comércio. O mundo seria governado por poucas potências, sendo que os Estados Unidos controlariam as Américas e a Grã-Bretanha. A nova capital seria Universal City, onde funcionaria a sede do jornal Earth Herald, administrada pelo homem mais poderoso do mundo, Francis Benett.

Homem das letras e da imprensa do seu tempo, Julio Verne imaginou o que seria a evolução das comunicações sob a batuta de Francis Benett. Em vez do papel, em 2889 funcionaria um serviço parecido com o nosso já familiar podcast, só que personalizado:

Difundiu uma energia e uma vitalidade sem paralelos ao inaugurar o jornalismo telefônico. Conhecemos esse sistema, que se tornou prático com a difusão do telefone. Todas as manhãs, ao invés de ser impresso, como nos antigos tempos, o Earth Herald é recitado: em uma rápida conversa com um repórter, um político ou um cientista, os assinantes se põem ao corrente do que lhes pode interessar. Quanto aos compradores dos números avulsos, sabe-se que por poucos centavos informam-se do exemplar do dia nas inúmeras cabines fonográficas. Esta inovação de Francis Benett revitalizou e antigo jornal. Em alguns meses sua clientela chegou a oitenta e cinco milhões de assinantes e a fortuna do diretor aumentou gradualmente até os trinta milhões, valor facilmente superado atualmente.

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Ilustração de George Roux (1910)

Verne imaginou também que as comunicações seriam feitas também com a transmissão de imagens em tempo real, onde os comunicantes poderiam se ver:

O telefone era complementado pela telefoto, mais uma conquista de nossa época. Se há tantos anos a palavra é transmitida por correntes elétricas, só muito recentemente pode-se transmitir também a imagem. Valiosa descoberta, a cujo inventor Francis Benett não foi o último a agradecer naquela manhã, quando viu sua mulher, reproduzida no vidro telefótico, apesar da grande distância que os separava.

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Ilustração de George Roux (1910)

Para um jornal de grandes dimensões, a redação do Earth Herald abrigaria um batalhão de jornalistas, todos com funções específicas:

Ampla, esta sala era coroada por uma grande cúpula translúcida. Em um canto, diversos aparelhos telefônicos pelos quais os cem literatos do Earth Herald narram cem capítulos de cem novelas a um público enraivecido. Enxergando um de seus folhetinistas que descansava por cinco minutos, Francis Benett disse:

– Muito bem, meu caro amigo, muito bem, seu último capítulo. A cena em que a jovem camponesa aborda com seu namorado uns problemas de filosofia transcendente é produto de um agudo poder de observação. Jamais foram melhor descritos os costumes campestres. Continue assim, meu caro Archibald! Ânimo! Dez mil novos assinantes, desde ontem, graças a você!

Tendo dado essa breve lição, Francis Benett continua a inspeção e entra na sala de reportagens. Seus mil e quinhentos repórteres, então sentados em frente de vários telefones, comunicavam aos assinantes as notícias do mundo inteiro recebidas durante a noite. A organização deste incomparável serviço é frequentemente descrita. Além de seu telefone, cada repórter tem diante de si uma série de comutadores que permitem estabelecer a comunicação com um telefoto particular. Assim os assinantes não só recebem a narração, mas também as imagens dos acontecimentos, obtidas através da fotografia intensiva.

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Ilustração de George Roux (1910)

A história toda se passa no dia 25 de julho de 2889:

No dia seguinte, o diretor do Earth Herald recomeçava sua ronda de vinte quilômetros através de suas oficinas e, à noite, quando operou seu totalizador, estimou os lucros daquele dia em duzentos e cinquenta mil dólares: cinquenta mil a mais do que na véspera.

Que boa ocupação a de jornalista no final do século vinte e nove!

Os trechos da narrativas foram retirados do site Biblioteca Júlio Verne, que pode ser visitado clicando aqui.