O trem vinha de Rio Branco (hoje, Arcoverde). Dentro dele, entre os passageiros com destino ao Recife, um morador do Sítio Catimbau, nos arredores de Buíque. Localizado pelo repórter do Diario de Pernambuco no do vagão de segunda classe, ele teve a sua triste história estampada no jornal no dia 26 de maio de 1936. Aos 22 anos de idade, vestindo camisola branca e calças de brim comum, o sertanejo sangrava nas partes baixas e vinha buscar socorro médico na capital depois de ter sido vítima do bando de Lampião.

Solteiro, noivo, dono de uma pequena propriedade rural, ele acabou emasculado como represália a um possível informante da polícia. A malvadeza foi praticada por Virgínio, cunhado de Virgulino, que usou um trinchete – faca grande e muito afiada com cabo de madeira – para castrar o coitado. O relato, feito de forma entrecortada pelos espasmos, é um raro registro em primeira pessoa de uma das mais bárbaras punições realizadas pelos bandoleiros das caatingas.

O Diario havia voltado a dar destaque às ações do bando de Lampião em Pernambuco. Para colher o depoimento do castrado, o repórter do jornal embarcou no trem em Vitória de Santo Antão. A medida tinha uma ordem prática. Como estava perdendo muito sangue, era possível que a vítima não chegasse com vida ao Recife. O sertanejo estava prostrado em um banco no fim do vagão. O mau cheiro já indicava quem era o desgraçado pelos cangaceiros entre todos os passageiros.

Dentro do trem, depois de ouvir “pilhéria” do condutor por estar em um vagão de classe menor, o repórter do Diario coletou outros depoimentos sobre as ações de Lampião. São histórias de mortes por tiro e sangramento, ameaças, roubos e sequestros. O bando comandado por Virginio era composto por sete homens e duas mulheres, uma das quais Maria Bonita, que trajava calça culote, com dois parabelluns – apelido da Pistola Luger P08 – à cinta e cartucheira.

Quanto ao emasculado, a reportagem encerra informando que ele foi internado no pronto-socorro e apresentava “algumas melhoras”. Uma testemunha viva do cangaço. Abaixo, o texto na íntegra.