JANEK SKARZYNSKI/ AFP PHOTO

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Há 71 anos, soldados do Primeiro Exército da Frente Ucraniana entravam na Polônia em um complexo industrial com quatro chaminés abandonado às pressas pelos alemães. Era o dia 27 de janeiro de 1945 e o que testemunharam os militares soviéticos, comandados pelo marechal Ivan Konev, mudou a concepção do mundo em relação ao tratamento dado a seres humanos. As quatro chaminés e os galpões ao redor pertenciam ao complexo de Auschwitz, maior e mais emblemático campo de concentração construído pelos nazistas onde 1,1 milhão de pessoas perderam a vida. Cerca de 7,5 mil prisioneiros, abandonados por estarem doentes ou fracos demais, foram libertados. Judeus em sua maioria, também sobreviveram para dar testemunho políticos poloneses, membros da resistência antinazista, ciganos, homossexuais, elementos antissociais e soldados comunistas capturados durante a ofensiva alemã à Rússia.
Desde 2005, por resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, 27 de janeiro foi definido como o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. A data será lembrada hoje em todo o mundo, inclusive no Recife. Às 19h, na sinagoga Kahal Zur Israel (Rua do Bom Jesus), a Federação Israelita de Pernambuco promove a mesa-redonda Tolerância, minorias e direitos humanos. Coordenado por Jader Tachlitsky, o debate terá a participação de Rita Ribeiro Voss, Moisés Monteiro de Melo Neto e Maxwell Anderson de Lucena Vignoli.
Na segunda-feira, em São Paulo, vinte sobreviventes de campos de concentração acenderam seis velas – em memória aos seis milhões de judeus mortos durante o regime nazista – e criticaram o interesse pela republicação do livro escrito por Adolf Hitler, Mein Kampf (Minha luta), agora em domínio público. Segundo o rabino Ruben Sternschein, a obra fala claramente em extermínio.
Mesmo com relatos durante a guerra de que os inimigos dos nazistas estavam sendo sistematicamente aniquilados, a questão dos campos de concentração não ganhou espaço da imprensa naquela época. A palavra Auschwitz só veio a ser publicada no Diario de Pernambuco no dia 2 de novembro de 1945, citada em uma reportagem de Jean Mazon e Franklin de Oliveira (da revista O Cruzeiro), que trazia um relato do francês Jean Mailly, prisioneiro do horror. “Auschwitz, Dachau, Buchenwald, Dora Bikernau, Elbruch, Ravensbruck, Valhingen, Belsen: franceses, russos, tchecos, poloneses, judeus, belgas, holandeses, alimentando os fornos, pendendo das forcas, empapando de sangue a terra dos campos”.
Com a derrota da Alemanha, a Europa se viu com uma multidão de refugiados, estrangeiros em sua própria terra. O desconforto dos campos de concentração e a discussão sobre o tratamento dado aos judeus aceleraram a decisão da ONU de aprovar, em maio de 1947, o plano de Partilha da Palestina, dando condições ao surgimento do estado de Israel. No processo de independência das colônias europeias, países recém-criados se viram às voltas com conflitos étnicos e religiosos, que no caso do Oriente Médio fomentaram grupos extremistas voltados atualmente também contra o mundo ocidental.
“Auschwitz é um lugar onde ninguém deveria ter estado”. Esta frase, pronunciada por Oskar Gröning, ex-contador do próprio campo de concentração, condenado na Alemanha em 2015 pela “cumplicidade” no assassinato de 300 mil judeus entre 1942 e 1944, ganha mais força hoje. Aos 95 anos, o último dos nazistas a enfrentar o banco dos réus passará mais três anos na cadeia. Sem Auschwitz e pessoas como ele, este editorial não precisaria ter sido escrito.