17.01

 

Sem um transporte público que atenda as necessidades de deslocamento, o carro ainda é opção.

Tânia Passos (texto)
Paulo Paiva (foto)

Os 200% de aumento da Zona Azul nas vias públicas do Recife, na última semana, assustaram muito mais pelo tamanho do percentual do que o valor em si. Durante 18 anos, o estacionamento regulamentado em vias públicas foi de R$ 1 para uma, duas ou cinco horas. E agora custa R$ 3 para as mesmas quantidades de horas. Em nenhum estacionamento privado se paga esse valor, nessas condições de tempo de uso. A maior insatisfação no aumento talvez tenha sido a falta de timing da Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU), que em quase duas décadas não poderia ter escolhido uma época pior, ainda mais após o reajuste da passagem dos ônibus na Região Metropolitana do Recife, que passou a R$ 3,20, o anel A, e diante de uma crise econômica, sem precedentes.
Na hipótese de levar em conta as necessidades da CTTU de readequar o valor, que não estaria dando para cobrir sequer os custos da confecção do cartão de 30 folhas da Zona Azul, ( aliás porque ainda utilizamos folha no lugar de uma plataforma online mais eficiente?) Há também uma outra questão que merece atenção dos agentes públicos: o dominío dos flanelinhas sobre as vagas da Zona Azul. Eles controlam, literalmente, o espaço público, movimentando a posição dos veículos (que são deixados sem marcha) para usar as vagas como lhes convier e cobrando mais caro do que o valor da Zona Azul. Os R$ 3, na prática, já vinham sendo cobrados, e a depender da cara do “cliente” , o valor poderia chegar a R$ 5. Agora não se sabe que tipo de constrangimento o motorista terá ainda que passar, após o aumento oficial.
Lembro, de uma conversa com o presidente do Instituto da Cidade Pelópidas Silveira, João Domingos, sobre a forma arcaica de cobrança da Zona Azul e o problema dos flanelinhas e ouvi dele, que o mais importante é estimular o uso do transporte público e reduzir o impacto da presença do carro na área central. Concordo 100%. Mas, enquanto isso, ainda é uma realidade bem distante para nós, o danado do carro, teima em ser útil. São três mil vagas, insuficientes para uma demanda estimulada a usar o carro. O cenário, claro, é incompatível com qualquer lógica de estímulo ao uso do transporte público.
No mundo idealizado pelos urbanistas, o uso do transporte indivual motorizado para a região central deve ser caro o bastante para não valer a pena e, dessa forma, reduzir o tráfego e deixar as ruas mais vazias para o transporte não motorizado e faixas exclusivas para os ônibus. É o que ocorre nas grandes metrópoles. O problema é que o nosso transporte público ainda não é atraente e não atende às demandas de deslocamento dos usuários que têm o carro como referencial. Outro problema é que as calçadas não são adequadas para um caminhar seguro, tanto do ponto de vista físico, quanto de segurança pública. E andar até um ponto de ônibus desestimula quem ainda se sente mais seguro dentro do carro.
Outra questão que traz resistência na mudança para o transporte público é o esvaziamento das ruas depois das 18h. Sem moradias e com o comércio fechando as portas no horário comercial, as ruas ficam desertas e ainda mais inseguras até mesmo para quem vem de carro. Não está fácil para ninguém.