08.05

 

Na Rua Betinha, em Nova Descoberta, a São José Sport Club já era um patrimônio do bairro.

Marcionila Teixeira (texto)
Peu Ricardo (foto)

Era uma escola simples. Nela havia, basicamente, quatro salas de aula, pátio e biblioteca. Seus ocupantes eram meninos e meninas pobres do Alto do Progresso, Alto da Betinha e Alto Doutor Caetés. Todas comunidades do bairro de Nova Descoberta, na Zona Norte do Recife. Nos últimos dias, já não se ouvem mais o tagarelar dos alunos, a voz alta dos educadores e dos funcionários, o cheiro de merenda. Os jovens estudantes partiram. Na semana passada, apenas alguns funcionários ainda faziam serviços burocráticos no que restou da Escola Estadual São José Sport Club. O governo do estado fechou as portas para a multiplicação de saberes naquele prédio. Há quem fale em sonhos interrompidos. A escola funcionava há mais de trinta anos. Já era patrimônio da Rua Betinha, n°94.
Uma moradora do lugar conta ter educado os filhos e netos na São José. Graças ao espaço, conta ela, os filhos chegaram à universidade. Uma professora de reforço também lamentou o fechamento da escola. Para ela, os alunos precisarão se locomover para espaços mais distantes de seus responsáveis. Um homem que passava na hora em que o fotógrafo Peu Ricardo fazia uma imagem da unidade, disse que o governo deveria ter colocado um segurança no lugar para impedir os frequentes arrombamentos. Em um deles, considerado o mais grave pela equipe de professores e funcionários, levaram “tudo”. Aconteceu em janeiro. Desde então, feriado era sinônimo de invasão. Nas salas já não há mais ventiladores. Os sinais da ação criminosa estão espalhados pelo prédio. A escola nunca teve vigilantes.
O governo não confirma, mas os arrombamentos teriam apressado a decisão de fechar a escola no meio do ano. Agora os estudantes precisam caminhar cerca de vinte minutos até a escola mais próxima e com vagas, a Rotary, no mesmo bairro. Nem todos foram matriculados ainda. Uma moradora desabafa: “Acho que foi abandono por parte dos governantes. Você ver a escola se acabando aos poucos, do começo do ano para cá, e ninguém aparecer para reerguer. Por aqui já passaram tantos estudantes com futuro na vida. E esse ambiente aqui vai virar o que? Vão fazer o que der na cabeça. É pena e tristeza o que eu sinto. Até para os moradores vai ser ruim”. Os funcionários evitam falar sobre o assunto.
A escola funcionava em um prédio alugado e nela estavam matriculadas este ano 125 pessoas no 7°, 8° e 9° anos. Houve época com até 250. Seu Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de Pernambuco 2015 (Idepe) é de 3.18, ou seja, perto da média do estado, de 3.8. Quando avisadas pelo governo da proposta de fechamento, as famílias chegaram a reclamar, ameaçaram denunciar na imprensa, mas a mobilização durou pouco. O clamor social não foi o mesmo ocorrido em fechamentos de escolas particulares tradicionais. O silêncio predominou. E a escola se foi.
“Fechar uma escola é sempre ruim. Temos acompanhado com preocupação essas situações. Existem casos que justificam, mas são raros. Em algumas comunidadades, conseguimos reverter fechamentos ao longo dos anos, tanto de escolas, quanto de turnos, como de turmas. No entanto, não sabemos quantas foram fechadas porque nem toda comunidade se mobiliza para denunciar”, avalia Fernando Melo, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Pernambuco (Sintepe). Se uma escola tem quantidade razoável de estudantes, turmas compactadas, procura de vagas e, além disso, do ponto de vista da estrutra, se mantém com condições de atender, não está no perfil de fechamento, defende o sindicato.
Uma nota da Secretaria Estadual de Educação justifica o fechamento. “O caso da escola está relacionado à reestruturação da rede escolar. Apesar das intervenções de manutenção realizadas, a unidade de ensino continuou apresentando infraestrutura deficiente”. A secretaria informou que a reestruturação se dá em prédios alugados, pois não foram pensados para abrigarem escolas. Para o movimento sindical, os motivos do encerramento das atividades são explícitos: economia com custos na educação e encaminhamento de alunos para a rede municipal, já que, por lei, o estado somente é obrigado a ofertar o ensino médio. Enquanto isso, os ex-alunos da São José têm caminhado mais sob o sol. Buscam abrir portas para um futuro mais promissor. É que um dia lhes disseram que o caminho era a escola.