13.05

 

Mas é difícil entender proibições, cobranças e caras grossas como parte de um aprendizado conjunto.

Luce Pereira (texto)
Greg (arte)

Não se engane, mãe é uma só. Aqui e na China. O que muda são as gradações do cuidado em função da cultura na qual a cria é educada e o entendimento sobre a aplicação dos limites, algo tão importante que só é possível compreendê-los na maturidade. Dá-los em que dose e até quando? Desculpar-se pelos excessos ou fingir-se de durona? Coitadas das mães, obrigadas a virar bichos insones desde sempre e para sempre, porque esse cuidar não tem fim, atravessa madrugadas, acorda junto, caminha com elas o dia inteiro, mesmo quando são chefes de estado, ministras, executivas enfiadas em mil tarefas complexas demais. Nesta semana, a foto de uma parlamentar amamentando a filha de onze meses enquanto debatia sobre maternidade, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, causou polêmica, furor. Entre o deve-não-deve que fez incêndio no mundo virtual, sobrou a mais terna das conclusões: mãe é assim mesmo. Ainda mais as modernas, descoladas, conscientes de seu espaço no mundo. Nenhuma é melhor do que outra, apenas há aquelas que aprenderam a questionar e, tornadas íntimas do verbo dizer, não levam desaforo para casa, muito menos se ele vier contaminado por machismo. Ah, palavra indigesta!
Mas, também, são “assim mesmo” as mães do interior que querem seguir como as próprias mães – sem desgrudar os olhos dos rebentos, mesmo quando já viraram moças feitas e marmanjos barbados, a ponto de casar. Sobretudo essas desejam continuar à margem de certos costumes modernos como abolir a bênção. Nunca. Sentem que sem isso os filhos como que sairão de casa com metade da proteção necessária. Assim,“bênção, mãe”, “bênção, pai”, seguem dizendo os “galalaus” quando vão colocar os pés fora dos domínios maternos ou a eles retornam vindos sabe-se Deus de onde. E chega a ser comovente constatar quão mal à vontade muitos deles ainda ficam quando decidem praticar, na presença delas, hábitos tão comuns à rotina que vivem longe. Fumar, beber, contar piadas “meio picantes”, apropriadas apenas para ouvidos de amigos transformados em cúmplices, com o tempo. Agora é a vez de se perguntarem: seria excesso de respeito, de zelo, de vergonha? Sentimento de profanação? Nenhuma resposta pode ser mais importante do que a certeza de que as dúvidas, de ambos os lados, existem por amor. As duas partes só desejam acertar na forma de deixar, num canto iluminado dos sentimentos, a relação mais importante e necessária entre todas.
Um dia, quando tempo e circunstâncias se encarregarem de romper o laço, o que mães e filhos desejam é apenas a certeza de que fizeram o melhor pela relação, ainda que nenhuma sobre a Terra seja perfeita – afinal, o mundo dos sentimentos se mostra sempre cheio de armadilhas. Difícil entender proibições, cobranças, palavras atravessadas, caras grossas e sorrisos contidos como parte de um aprendizado conjunto. Mas mães não são seres divinos – ao menos no que tange à capacidade de fazer milagres – e filhos não são uma incógnita, embora venham ao mundo sem a garantia de que será possível tê-los como aliados eternos. Eis um desafio a que a maioria das mães se lança, não porque desejem vencê-lo, mas porque resiste nelas uma força que naturalmente as impele a amar incondicionalmente. Este sim, um amor divino.
Não lembro de ter falado ao telefone ou me despedido pessoalmente de minha mãe sem sair da conversa coberta por bênçãos repetidas muitas vezes. Superamos nossas pequenas diferenças neste ir e vir, sem esforços desmedidos, sem prometer além do que poderíamos nos dar, e hoje esse encontro é tão cristalino quanto nossa consciência do amor compartilhado – que não precisa ser o maior do mundo, apenas recíproco. Entendi, por fim, que “mãe é assim mesmo”. Assim mesmo, como? Um anjo que também erra, tentando se perfeito na dose de ternura.