16.05

 

Não temos razões para duvidar de Temer nem de Dilma. Seria decepcionante constatar o contrário.

Vandeck Santiago (texto)
Arte DP (imagem)

Presidente da República não precisa fazer voto de pobreza nem governar em condições desconfortáveis e sem assessores para tarefas básicas. Mas não precisa exagerar. Vou falar do suposto pagamento ao cabeleireiro de Dilma Rousseff e da suposta babá do filho do presidente Michel Temer, dois assuntos em evidência nos últimos dias, mas antes deixem-me rememorar outro fato, pertencente ao mesmo território.
Para quem não lembra, no finalzinho de dezembro do ano passado a imprensa denunciou uma compra milionária que seria feita pela Presidência da República, para serviço de alimentação nos aviões que servem o presidente. O edital incluía uma lista de produtos, como sorvetes da marca Haagen-Dazs e potes de Nutella. Até aí não há nada de mais – não é possível que um presidente de um país do porte do Brasil, oitava economia do mundo, não possa em suas viagens tomar um potinho de Haagen-Dazs e comer generosas porções de Nutella.
O problema, no entanto, não era este, e sim a quantidade dos itens e o preço que se estava pagando por eles. O potinho do sorvete, por exemplo, constava no edital com o valor de R$ 15,09, e previa-se a compra de 500 deles. Os repórteres foram aos supermercados em Brasília e encontraram o mesmo pote custando R$ 11,25. Já o pote de avelã da marca Nutella, de 350 gramas, iria ser comprado por R$ 39 segundo as contas do edital. Lá foram os repórteres novamente comparar: encontraram em supermercado e nas Lojas Americanas o mesmo pote, com as mesmas 350 gramas, pelo preço de R$ 20,87.
A lista seguia com diversas outras guloseimas, como chocolates, biscoitos, refrigerantes, barras de cereais, picolé de flocos com cobertura de chocolate branco… Quando se juntava tudo, o valor estimado do edital era de R$ 1,75 milhão. É aquela coisa: não precisa tomar um sorvete de quinta categoria, mas é preciso cuidar da quantidade de potes e do preço que está pagando por eles…
Em seguida a um tsunami de crítica nas redes sociais, no dia 27 de dezembro o presidente Michel Temer cancelou o edital e determinou a redução dos custos da compra prevista.
Voltemos aos dias presentes. Ontem a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação) distribuiu entrevista que o presidente deu a emissoras de rádio regionais na qual ele fala sobre a informação de que a babá do seu filho estaria lotada em cargo de confiança no Palácio do Planalto. A denúncia foi publicada no jornal O Globo, de domingo. Dizia a reportagem que Leandra Brito, a babá, fora contratada como assessora do Gabinete de Informação em Apoio à Decisão (Gaia). Este órgão ocupa importante papel na assessoria ao presidente.
Ao ser perguntado sobre essa questão, Temer disse que o questionamento era ofensivo e que o seu filho, de oito anos, não precisa mais de babá. “Segundo o Diário Oficial da União, Leandra Barbosa dos Santos Brito é lotada em um cargo de confiança no gabinete pessoal de Michel Temer. A edição do dia 16 de novembro de 2016 traz sua nomeação como assessora técnica no Gabinete-Adjunto de Informações em Apoio à Decisão do Gabinete Pessoal do Presidente da República”, informou ontem matéria do jornal Estado de S. Paulo. “De acordo com reportagem d’O Globo, Leandra disse que não é babá de Michelzinho [o filho do presidente], mas não teria exemplificado que trabalho desenvolve no Planalto”.
O outro caso vem do final da semana passada: em sua delação, gravada em vídeo, a marqueteira Mônica Moura, mulher do também marqueteiro João Santana, disse que a empresa do casal pagou via caixa 2 o cabeleireiro da presidente, Celso Kamura. O pagamento se fez dessa forma porque, conforme a delação de Mônica, assessores do Planalto lhe informaram que “não havia rubrica” para esse tipo de serviço — quer dizer, as despesas com maquiagem e cabeleireiro não estão previstas nos pagamentos oficiais a serem feitos pela Presidência da República. “Os serviços custaram no total cerca de R$ 90 mil e foram pagos entre 2010 e 2014, mesmo fora de períodos de campanha eleitoral, segundo afirma Mônica em sua delação”, diz matéria do UOL. Em nota oficial divulgada por sua assessoria de imprensa, a ex-presidente disse que Mônica e Santana “prestaram falso testemunho e faltaram com a verdade em seus depoimentos, provavelmente pressionados pelas ameaças dos investigadores”. Celso Kamura também divulgou nota, dizendo que todos os serviços que prestou a Dilma estão comprováveis em nota fiscal.
Não tenho razões para duvidar da palavra do presidente Temer nem da ex-presidente Dilma. Prefiro acreditar que ambos estão falando rigorosamente a verdade. Seria decepcionante para todos nós, brasileiros, constatar que as pessoas que ocuparam o posto mais alto da nação confundiram o público com as miudezas do privado.