11.10

Recifense que propaga ritmo do frevo pela Europa lança campanha para reconstituição das mamas.

Patrícia Fonseca (texto)
Arquivo pessoal (foto)

Se na Europa o recifense tem fama de extrovertido e se o frevo inebria os olhos dos gringos, deve-se em parte ao formidável trabalho de profissionais da arte como Janine Henriques, de 36 anos. Quase nascida entre a passagem do Bloco da Saudade e do Bloco Madeira do Rosarinho, a vida dela foi dedicada à memória cultural de Pernambuco desde miúda. Criança, fez Balé Popular no Clube Português e o que era brincadeira virou profissão. Adulta, aprimorou a dança contemporânea. Saiu do Recife, de Pernambuco, determinada a levar o frevo e a nossa música para a Irlanda. Mas a vida, sempre ela, dá solavancos que nem sempre é canção aos ouvidos e, por vezes, faz com que o batuque seja desacelerado.
Janine foi surpreendida por um nódulo no seio direito que deveria ser revisado a cada seis meses. “Cheguei na Irlanda, tudo era novo, lindo e acabei esquecendo da minha revisão semestral”, conta ela. Diagnosticada com câncer, foi o amor ao frevo o que lhe deu ânimo nos momentos mais difíceis em terras alheias. “A música de Flaira Ferro, que veio aqui na Irlanda, me salvou nas sessões de radio e quimioterapia. Nossa! O frevo me salva de mim o tempo todo”, reflete a recifense do bairro do Rosarinho, numa análise apaixonada que traduz a relação dela com o ritmo local.
Era mas ainda é o frevo quem a ergue nos momentos difíceis de depressão. “Parei pelo câncer, mas quero voltar a levar o frevo para o mundo, assim que me curar”. Janine Henriques, recifense que trabalha espalhando a cultura da cidade pela Europa e mãe de três filhos, quer voltar ao Recife. Precisa do abraço da família, do amor de quem lhe quer bem, do astral de onde nasceu. De tratamento e especialistas certos que lhe deixem confortável com seu próprio corpo. Para isso, familiares e amigos de Janine lançaram campanha para arrecadar fundos para realização da cirurgia de retirada e reconstituição da mama, para o restante do tratamento, terapia e para a vinda da família da Irlanda para o Recife que tanto lhe inspira.
Formada em Jornalismo pela Unicap e Teatro em São Paulo, Janine Henriques mudou-se para a Irlanda há quase três anos com o marido, Fernando, e os três filhos: Tales, de 19 anos, Sofia de 11 e Ravih, de quatro anos de idade. No ano passado, começou a notar algo estranho na mama e foi ao médico de família, que indicou a realização de exames. A mamografia apontou a necessidade de realização de ultrassonografia, onde foram identificadas três imagens: um nódulo antigo e inalterado e dois novos que precisavam de biópsia imediata. Poucos dias depois, a notícia e duas possibilidades: cirurgia para a retirada dos tumores e radioterapia ou mastectomia. Janine ficou com a primeira opção.
“O sistema de saúde daqui da Irlanda é totalmente diferente do que temos no Brasil. Você não tem tanto acesso. Caso o tratamento seja público, a demora chega a ser de seis a oito meses para um exame. Optamos pelo tratamento particular, mas a fila demora e eu estava com muito medo. Daí começou a correria para fazer empréstimo, pedir adiantamento de salário e seguir o plano: cirurgia e sessões de radio”, lembra.
A primeira fase do tratamento em 2016, que durou cinco meses, ocorreu de forma tranquila. A radioterapia não trouxe tantos efeitos colaterais e ela se sentia feliz, curada. Infelizmente, neste mesmo ano, os exames de rotina reencontraram os nódulos no mesmo seio e, desta vez, a sugestão foi quimioterapia e retirada de mama, já que era caso reincidente. “Foi um choque. Optei por me tratar no Brasil por conta da família, do apoio. Apesar de serem bem atenciosos aqui, mesmo no tratamento particular, não tenho opção de escolher meu médico para a questão da reconstrução, da mastectomia. Eu quero ter essa opção. Muita gente acha que é estética, mas não é. Tem a ver com se sentir mutilada e reconstruir uma parte do seu corpo”.
Criada dia 1º de outubro, a campanha em favor de Janine, disponível no site https://www.vakinha.com.br/vaquinha/janine, arrecadou R$ 9.580 dos R$ 80 mil necessários. Precisa de muito mais doações, portanto. As doações também podem ser feitas na conta corrente de Maria do Socorro da Mata Trindade Henriques, de número 00026263-0, agência 4976 da Caixa Econômica Federal (CEF), sob o CPF 145 598 114 15.
“Relutei um pouco. Não queria expor minhas limitações, minha doença, mas deixei o coração falar”, diz Janine. Feita de paixão pelo Recife, é hora dos conterrâneos retribuírem, agradecendo a dedicação de Janine Henriques ao patrimônio do estado. Até porque as notas da Vassourinhas continuam, frenéticas, à espera dela.