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Alberto Cardozo, Ylla Brito e Danielle Gondim participaram do projeto da escola Zequinha Barreto, de Piedade. Foto: Igo Bione/DP

Alberto Cardozo, Ylla Brito e Danielle Gondim participaram do projeto da escola Zequinha Barreto, de Piedade. Foto: Igo Bione/DP

A África somos todos nós

Projeto apresenta a realidade da sociedade brasileira a partir do cotidiano dos personagens do entorno de escola

A vendedora de tapioca sempre esteve por ali. Preparava os quitutes todos os dias para os moradores do Conjunto Dom Helder Camara, em Piedade. Apesar de bater ponto no mesmo lugar há anos, não era vista pelos alunos da Escola Estadual Zequinha Barreto, localizada a poucos metros de onde ela trabalha.

O olhar dos estudantes para os trabalhadores do bairro de Jaboatão dos Guararapes só mudou quando foram apresentados ao projeto A África aparece: linguagens, ensino e debate sobre a cultura afro-brasileira. Por meio de oficinas, cursos e exibições de filmes, um grupo de historiadores buscou fazer os adolescentes enxergarem as expressões culturais e gastronômicas que passavam despercebidas no dia a dia.

Oficina de fotografia mudou o olhar de Ylla Brito. Foto: Igo Bione/DP

Oficina de fotografia mudou o olhar de Ylla Brito. Foto: Igo Bione/DP

Para a carioca Ylla Brito, de 19 anos, a experiência foi fundamental para conhecer melhor a cultura pernambucana. Foi por meio da oficina de fotografia do projeto que ela começou a considerar a vendedora de tapiocas como uma importante figura no cotidiano da comunidade. “Fotografei esta mulher e um vendedor de macaxeira. Eles faziam parte da minha rotina, mas eu nunca tinha parado para observar como é importante e rico culturalmente o que eles fazem”, conta.

O estudante Alberto Cardoso, 17, percebeu uma mudança não só no olhar, mas na postura diante da comunidade. “Conseguimos entender que o que estudamos em história em relação à questão racial no Brasil não está muito distante no nosso presente. É preciso muita luta ainda para chegar a uma situação ideal”, afirma. “Um dos grandes méritos do projeto foi trazer essa requalificação do olhar. Isso empodera esses adolescentes para buscar seus direitos”, ressalta um dos organizadores do A África aparece, o historiador Denizá Rodrigues.

Denizá Rodrigues coordenou projeto para os alunos. Foto Igo Bione/DP

Denizá Rodrigues coordenou projeto para os alunos. Foto Igo Bione/DP

O projeto foi idealizado e desenvolvido pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), da Universidade Federal de Pernambuco, sob coordenação do historiador Bruno Véras.

A ação, realizada com verbas do programa Mais Cultura nas Escolas, tinha quatro eixos: criação, circulação e difusão de produção artística; educação patrimonial – patrimônio material, imaterial, memória, identidade e comunicação; cultura digital e comunicação; e cultura afrobrasileira.

Durante a iniciativa, foram realizados cursos de formação de professores; oficina de fotografia; oficina de artes; cineclube; curso de patrimônio e educação em história e cultura afro-brasileira e indígena e criação de um blog. O próximo passo será a confecção de um e-book com planos de aula para ser baixado por professores de todo o país que quiserem trabalhar o tema. O livro digital deve ser disponibilizado no blog do projeto (www.africaaparece.blogspot.com.br) ainda este ano.

Igualdade na diferença

O projeto A África aparece foi uma das iniciativas reconhecidas pelo Prêmio Antonieta de Barros para Jovens Comunicadores Negros e Negras, realizado pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, ligada ao Ministério da Justiça e Cidadania.

O resultado da premiação foi divulgado em outubro de 2016. Na relação de 56 projetos premiados pelo órgão federal, a ação realizada na Escola Estadual Zequinha Barreto apareceu na 32ª posição nacional.

De acordo com a organização do Prêmio Antonieta de Barros, o objetivo da reconhecimento é estimular o protagonismo juvenil, promover a imagem positiva de jovens negros e negras, além de mobilizar, articular e fortalecer o movimento jovem negro envolvido com a promoção da igualdade racial e o enfrentamento ao racismo.

De acordo com o edital, foram premiadas cinquenta ações de todo o país. Cada autor recebeu a importância de R$ 20 mil.

Além do projeto da Escola Zequinha Barreto, outras duas iniciativas realizadas por pernambucanos se destacaram nacionalmente.

O projeto Comunica Oju Oya, iniciativa de um grupo de jovens negros recifenses que criou uma ferramenta de comunicação alternativa para divulgar notícias relacionadas à tradição do candomblé e empoderamento, também foi premiado.

A ex-aluna da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Jaqueline Fraga também recebeu o prêmio com a série de perfis Negra sou, fruto do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) em jornalismo.

[Imagem e som

Filmes para discutir a questão racial em sala de aula:

 
Quanto vale ou é por quilo? (2005)
Uma analogia entre o antigo comércio de escravos e a atual exploração da miséria pelo marketing social, que forma uma solidariedade de fachada.

Pierre Verger: Mensageiro entre dois mundos (1999)
Um documentário sobre a vida e a obra do fotógrafo e etnógrafo francês Pierre Verger, narrado e apresentado por Gilberto Gil.

Vista Minha Pele (2003)

Curta-metragem de Joel Zito Araújo, faz uma inversão da história brasileira, onde os negros são a classe dominante e os brancos, escravos.

Atlântico Negro – nas rotas dos orixás (1998)

Apresenta a grande influência africana na religiosidade brasileira. Mostra a origem de as raízes da cultura jêje-nagô em terreiros de Salvador e do Maranhão.

Quilombo (1984)

História de um grupo de escravos que se rebela no Engenho Santa Rita, na Capitania de Pernambuco. Vitoriosos, criam o Quilombo dos Palmares.

Viajando pela África com Ibn Battuta (2010)
O documentário foi elaborado a partir da articulação de sucessivas formas narrativas sobre os povos antigos do continente africano.

Fonte: Cineclube África Aparece