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Dentre os assuntos previdenciários que aguardam julgamento pelo STF, existe um processo que pode afetar a vida de milhares de pessoas. Está naquela corte um problema (processo ARE 664335) para ser resolvido que pode dificultar a pretensão de quem sonha com aposentadoria especial. Ou ainda de quem tenta ganhar acréscimo de 40% (no caso dos homens) ou 20% (mulher) na contagem do tempo da aposentadoria por tempo de contribuição. A Corte vai ter que enfrentar a seguinte pergunta: o fato de o trabalhador utilizar equipamento de proteção individual (EPI) eficaz é suficiente para descaracterizar ou neutralizar a nocividade da insalubridade, principalmente se o trabalho for permeado de ruído?

Quando todos pensavam que esse assunto já era bem resolvido nos tribunais e no próprio INSS, eis que a autarquia consegue convencer os ministros de que a matéria tem contorno constitucional. E, portanto, a última palavra deve ser dada agora pelo Supremo, o que pode desconstruir tudo que já era pacífico sobre a questão.

De fato, o assunto já era bem resolvido em outros tribunais e no próprio INSS. Desde 1999, a Previdência Social aceita que o fato de a pessoa usar o EPI não afasta a nocividade do labor. É o que trata o Enunciado 21 do CRPS: “O simples fornecimento de equipamento de proteção individual de trabalho pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde, devendo ser considerado todo o ambiente de trabalho”.

Já a Turma Nacional de Uniformização, que define orientações em todos os juizados federais no Brasil, já tinha confeccionado a Súmula 9 sobre o tema: “O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado”.

A apreensão é grande sobre o que o STF vai julgar sobre o caso. Cabe salientar que a matéria discutida no STF trata exclusivamente sobre “ruído”, mas o entendimento da Corte pode influenciar situações de pessoas que trabalham expostas a outros agentes insalutíferos, como poeira, fungos, calor, frio, radiação ionizante, eletricidade, químicos , combustível, entre outros.

Para quem trabalha com insalubridade, a empresa fornece um formulário técnico (atualmente chamado Perfil Profissiográfico do Trabalhador) apontando se existe ou não insalubridade no ambiente de trabalho, bem como consta no referido formulário (campo 15.7) a pergunta se o EPI é eficaz ou não. Se a perguntinha for respondida pelo empregador como “sim”, isso poderá derrubar a possibilidade de reconhecer o tempo especial, caso o Supremo venha a entender realmente que o equipamento de proteção seja suficiente e eficaz para neutralizar a insalubridade.

Outro motivo de preocupação é porque o preenchimentro do formulário técnico é feito, por muitas empresas, de qualquer jeito e sem pessoas qualificadas. Na prática, muitos patrões preenchem o PPT ao seu alvedrio. Praticamente inexiste fiscalização do INSS acerca da exatidão das informações prestadas no formulário. Na Justiça do Trabalho é possível retificar as informações distorcidas do formulário, mas a falta de familiaridade dos juízes com esse tema previdenciário termina sendo uma luta difícil.

O atual modelo do PPP (fixado no Anexo XV, da Instrução Normativa nº 45/2010) comete injustiças, por exemplo, para quem trabalha com ruído. Não há no formulário informações detalhadas sobre a jornada de trabalho do segurado, nem considerando os limites de tolerâncias fixados pelo Ministério do Trabalho (Anexo 1 da Norma Regulamentar n.º 15). E, para efeito de ruído, esse detalhe pode fazer diferença, já que muitos trabalhando fazendo hora extra com ruído elevado. O EPI pode ser eficaz (desde que dentro da validade, trocado periodicamente) para quem trabalha por 8h exposto ao ruído contínuo de 85 decibéis. Mas, se esse mesmo ruído contínuo for de 100 decibéis, ele só deve trabalhar 1h por dia. Mesmo com o EPI, nem sempre o patrão obedece esses limites. E, com efeito, o trabalhador termina adoecendo com uma perda auditiva, além de ter prejuízo na hora de se aposentar. Até a próxima.