O efeito borboleta de uma contratação no futebol

Efeito Borboleta

Na teoria do caos, o bater de asas de uma borboleta poderia ser suficiente para influenciar o curso natural, provocando até um tufão em outro canto do mundo.

Assim é visto na cultura popular o efeito borboleta. Em 1963, o matemático americano Edward Lorenz analisou isso friamente, como uma “dependência sensível às condições iniciais dentro da teoria do caos”, tentando comprovar a tese com gráficos e diagramas. Por sinal, as marcações do estudo têm o formato de uma borboleta.

Após o breve o relato, a contextualização com o futebol, mas não com um pênalti perdido, uma bola na trave no último minuto ou a expulsão de um craque antes de uma partida decisiva. Indo além, o fato revisto através das contratações, daquelas que por pouco não aconteceram. Eis alguns gênios atrelados ao efeito borboleta…

Messi no PSV, 2005
Acaba de ser revelado que Lionel Messi quase foi emprestado para o PSV da Holanda, aos 19 anos. A negociação seria para a temporada 2005/2006. No Barcelona, o argentino ganhou naquele ano a sua primeira Liga dos Campeões da Uefa, marcando um golzinho. Se no ano passado o craque marcou 91 vezes, em 2005/2006 foram apenas oito. Números ainda modestos. E se tivesse ido para a cidade Eindhoven? Na Holanda, o PSV foi campeão nacional em 2006. Seu principal atacante, Jefferson Farfán, marcou 21 gols, doze a menos que o artilheiro da liga, Huntelaar do Heerenveen.

Lá nos Países Baixos Messi poderia brilhar como Romário (1989/1991) e Ronaldo (1995). Contudo, tendo os dois como exemplo, o estrelato só viria depois, justamente no Barcelona, mais maduro. De volta ao Camp Nou, caso o contrato fosse de apenas um ano, Messi não teria mais “aura barcelonista” desde as categorias de base, como Xavi e Iniesta – e quanto mais tempo ficasse emprestado, pior para a sua imagem, considerando a atual. A liderança técnica poderia vir depois, entrosamento à parte. Mas isso poderia atrasar um pouco a conquista da Bola de Ouro da Fifa. Seriam quatro?

Pelé no Sport, 1957
Seria exagero dizer que o dia 5 de novembro de 1957 mudou para sempre a história do futebol mundial? Vejamos. Neste dia, o Sport cometeu o maior erro de sua história. Tão surreal que acabou virando um “causo”. Foi quando o diretor de futebol leonino José Rosemblit agradeceu ao telegrama enviado pelo Santos, que havia oferecido dois jovens ao Rubro-negro: Pelé e Ciro. O dirigente recusou o empréstimo. A transação seria por apenas quatro meses, para dar mais experiência o futuro Rei e a Ciro, que era mais conhecido na época. Na carreira, quase sempre no Peixe, o Rei marcou 1.281 gols.

Atuando contra Santo Amaro e Ferroviário no Recife, Pelé até poderia ter ultrapassado essa marca, mas dificilmente teria o mesmo reconhecimento internacional. Até porque nenhum jogador do Nordeste era convocado para a Copa do Mundo na época. Assim, Pelé não teria ido à Suécia no ano seguinte. Em seu lugar, Dida do Flamengo, que chegara como titular no Mundial – perdendo lá a vaga no time para o Rei. Vale lembrar que Pelé marcou o gol da vitória da Seleção nas quartas de final, três na semifinal e mais dois na final, com a primeira Taça Jules Rimet do país. Imagine então a falta que o gênio faria à história da Canarinha. Sem contar no próprio Rubro-negro pernambucano…

Di Stéfano no Barcelona, 1953
Di Stéfano já tinha 27 anos quando teve a chance de mudar o curso da história de uma das maiores rivalidades do futebol. O argentino já havia sido elevado ao status de gênio no River Plate, Huracán e Millonarios da Colômbia, com 150 gols em oito anos de carreira. Foi quando embarcou para a Europa. Na Espanha, Barcelona e Real Madrid tentavam a todo custo contratá-lo. O River Plate, dono do passe, negociava em 1953 com o Barça quando o Real atravessou a empreitada. Apesar dos três amistosos de Di Stéfano pelo Barcelona, estava criada uma disputa turbulenta que só acabaria quatro meses depois com a intervenção do ministro espanhol dos esportes, General Moscardo.

A solução imbróglio? Di Stéfano jogaria uma temporada em cada clube, mas começando em Madri, na casa da realeza. Os dirigentes do clube blaugrana, que já haviam tentado firmar o acordo anterior na Fifa, não aceitaram a proposta. Eis que Di Stéfano vestiria então a camisa merengue por onze longos anos, marcando 307 gols. Lendário, tornaria-se o maior jogador da história do clube, ganhando cinco Copa dos Campeões da Europa.  O mesmo clube que antes da chegada do argentino era apenas o quinto maior vencedor do país, bem atrás do Barcelona. Com uma máquina na época, com gente do quilate de Puskas e Gento, o Real até poderia alcançar a sequência, mas provavelmente o Barcelona teria sido um rival à altura, destruindo a era do ouro do agora superrival.

Puskas no Manchester United, em 1958
Um turbilhão de detalhes em 1958. O Major Galopante, como o húngaro Puskas era conhecido, assinou com o Real Madrid aos 31 anos. Antes, só havia jogado no Kispest e Honved, em sua terra natal. Já era campeão olímpico, vice mundial e tinha 85 gols em 84 jogos pela seleção. Mas o canhoto gordinho quase tomou outro rumo. O Manchester United tentou contratá-lo. Isso porque oito jogadores ingleses morreram em um acidente aéreo naquele ano, em Munique. O United voltava de uma viagem de Belgrado, onde enfrentara o Estrela Vermelha pelas quartas de final da Copa dos Campeões. A parada na Alemanha seria para reabastecimento. Após problemas na decolagem, o voo atrasou. Na terceira tentativa, começou a nevar e o piloto perdeu o controle no fim da pista.

Com a tragédia, o Manchester passou por uma profunda transformação. Para voltar a ter ícone, o foco foi direcionado em Ferenc Puskas. Eis o entrave surreal que evitou a assinatura. Com um regulamento rígido, a Football Association, que comanda o futebol britânico, exigia de estrangeiros o domínio da língua inglesa. O que não era o caso de Puskas, desde os 16 anos no mundo da bola e com pouco estudo. Na Espanha, campo livre para voltar a jogar profissionalmente após um ano parado. Chegou no Real com dezoito quilos a mais. O então presidente Santiago Bernabéu falou de forma dura sobre o peso do reforço. “”Este não é problema meu, é seu”. Puskas controlou a balança, ganhou cinco ligas espanholas, três copas europeias e marcou 156 gols. Enquanto isso, o United só voltaria a ser campeão em 1965. Thank you, dizem os madridistas.

Maradona na Juventus, 1984
Antes mesmo de 1986, Maradona já era idolatrado pelos hermanos. O craque argentino mostrava a genialidade com a bola no pé esquerdo desde os 15 anos no campeonato nacional. Numa breve passagem pelo Barcelona, no início dos anos oitenta, acabou não vivendo a sua melhor fase, apesar da enorme expectativa. Apressado, o clube catalão resolveu se desfazer o grande investimento. Procurando interessados, viu no mercado italiano o destino certo. No país do calcio El Diez se consagraria com a camisa do Nápoli, transformando em potência um time que em 60 anos de história não havia conquistado um campeonato italiano. Ganhou dois scudettos. Mas poderia ter vencido ainda mais…

Em 1984, a Juventus, clube mais popular da Itália, iniciou a negociação com direção do Barça. Segundo lendas italianas, o presidente do Nápoli, Corrado Ferlaini, entregou um contrato à federação italiana para registrar o jogador. Porém, o envelope estaria vazio. Foi uma manobra para ganhar tempo e levantar fundos para a compra do passe. Ousadia pura, pois a transação de 5 milhões de libras esterlinas seria a maior até então. Na Velha Sinhora, Maradona poderia ter vencido a Copa dos Campeões e o Mundial Interclubes de 1985 ao lado do francês Platini – que dupla. Talvez pudesse ter evitado o jejum da Juve, que depois disso só voltaria a ser campeã em 1995. O efeito borboleta teria representado algo no México em 1986, na Copa do Mundo? Difícil mensurar.

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