A “máfia” das carteiras

Diario de Pernambuco

Por Wagenr Oliveira

Passageiros com deficiências mental ou física e idosos têm direito assegurado pela Lei 11.897/2000 a andar de graça nos ônibus que circulam na Região Metropolitana do Recife. A falta de fiscalização por parte do Grande Recife Consórcio de Transportes, antiga EMTU, está abrindo espaço, porém, para que o esquema de venda ilegal de carteiras falsificadas cresça e se espalhe por vários endereços, inclusive nas avenidas Dantas Barreto e Guararapes, no Centro do Recife. Do início do ano até a primeira quinzena deste mês, 184 carteiras de livre acesso falsificadas já foram apreendidas pelos fiscais. No ano passado, 980 documentos falsos foram recolhidos. De 2007 até agora, o número sobre para 3.940. Documentos apreendidos das mãos de pessoas que “compraram” o passaporte para fraudar o sistema de transporte público. Segundo o Diario apurou, uma carteira falsa pode ser “vendida” entre R$ 30 e R$ 50. E a falsificação é tão grosseira que, em alguns casos, são xerox coloridas.

O Diario percorreu durante três dias as linhas Campina do Barreto e Linha do Tiro, ambas da Zona Norte, apontadas pelos cobradores como “campeãs” de uso irregular do livre acesso. Ficou claro a explicação de tantas pessoas que, aparentemente, não são deficientes físicas, nem têm problemas mentais, muito menos idosas, consigam entrar pela porta traseira, sem passar pela catraca. “Mais de 50% das pessoas que mostram essas carteiras não podiam tirá-la. Mas não temos poder de fiscalizar nem de apreender os documentos. Apenas os fiscais do Grande Recife fazem isso”, destacou o cabrador de um ônibus da empresa São Paulo. Os motoristas também se dizem reféns. “Quando o ônibus para, eles mostram de longe o documento. Não tem como a gente olhar pessoa por pessoa. Mas a gente sabe que a maioria não tem direito a andar de graça. Sobra para quem paga”, explicou um motorista.

E ele tem razão. Além de ser crime falsificar ou alterar documento público, cuja pena prevista em lei é de dois a seis anos de prisão, a utilização das carteiras falsas acaba aumentando a evasão no sistema, cujo rombo é repassado na composição do preço da tarifa de ônibus, paga por todos. Segundo o consultor do Sindicato das Empresas de Transportes (Urbana-PE), João Braga, o sistema arrecada por mês R$ 80 milhões. “Se não houvesse tantas fraudes, essa arrecadação seria acrescida em 2%, segundo estudos de outros estados, que já conseguiram diminuir a evasão. Isso significaria mais R$ 1,6 milhão por mês”.

Algumas pessoas estão reproduzindo carteiras a partir de documentos já falsificados. “O meu marido tirou uma carteira dessas com uma mulher lá de Itapissuma, onde a gente mora. Ele pagou R$ 50. Uma amiga minha disse que vai tirar uma cópia da carteira falsa da prima dela”, disse uma jovem que trabalha no Centro do Recife. “Um rapaz que mora perto da minha casa, em Olinda, pegou os números dos meus documentos, além de uma foto, e fez uma carteira para mim. Paguei R$ 30. Isso já faz mais de um ano”, relatou um homem de 29 anos. Ele disse ainda que conhece muitas pessoas que também tiraram a carteira falsa. “Rapaz, isso tá em todo lugar”, alertou.