A mobilidade que não praticamos

 

Por

Tãnia Passos

Coluna Mobilidade Urbana  (Diario de Pernambuco)

É bem verdade que acordamos tarde para a mobilidade. Sem planejamento, as cidades cresceram sem olhar para as necessidades de deslocamentos. Havia outras prioridades como educação, saúde e moradia. Demoramos a entender que mobilidade é também qualidade de vida. Hoje, com um trânsito cada vez pior, mudar a política de investimento do transporte privado para o público talvez seja a única unanimidade no discurso, mas ainda não na prática.

O Recife sediou um seminário internacional de mobilidade e trouxe para nós experiências de políticas públicas, que privilegiam o discurso na prática. E há alguns dados que são relevantes para mostrar o tamanho da distorção em que vivemos. A Espanha acordou para a mobilidade no final de década de 1990, com a criação de um pacto, e mostra hoje que metade da população se desloca a pé e em condições confortáveis. Aqui não temos sequer estudos atualizados de origem e destino.

O último, realizado em 1997, estimava que 35% da população da Região Metropolitana do Recife se deslocava a pé. Para se ter uma ideia da defasagem, neste mesmo ano, o número de automóveis em todo o estado era menor do que temos hoje só na capital. A diferença não é apenas em termos percentuais, mas, sobretudo, das condições nada confortáveis dos nossos passeios. Também houve uma opção pela centralização dos serviços, o que nos obriga a fazer deslocamentos maiores.

A cidade de Barcelona tem uma população de 1,6 milhão de pessoas e 100 quilômetros quadrados de área. Já o Recife, tem 1,5 milhão de habitantes e o dobro da área. Temos mais espaço e por isso mesmo as condições deveriam ser duas vezes melhores. Não é o caso. Também em Barcelona, 30% das pessoas se deslocam pelo transporte público, sendo 60% pelo sistema ferroviário e 40% de ônibus. Para o transporte privado sobram 20%. Aqui as estatísticas mais uma vez são defasadas.

No estudo feito em 1997, cerca de 42% da população da RMR se deslocava de ônibus e 23% no transporte individual. Esses números hoje são pura ficção. Saímos de uma frota de 489 mil veículos, em 1997,para 1 milhão, em 2012, na RMR. Além de toda essa distorção há outra questão que nós ainda não acordamos: o transporte público de qualidade precisa ser subsidiado. O nosso transporte sobrevive apenas da tarifa já nos países que apostam na qualidade do transporte público, o subsídio varia de 50 a 70%. Uma escolha que ainda não fizemos.

2 Replies to “A mobilidade que não praticamos”

  1. Se por aqui fosse dar algum subsídio, seria criando tributação diferenciada para baixar o valor da passagem ou manter em patamar acessível já que melhorias implicam em elevação de custos. Outra, há locais aqui onde o transporte coletivo usa combustível alternativo (etanol), além de alguns híbridos. Os custos desses veículos são maiores, porém emitem bem menos poluentes, mas só estão circulando por conta do município subsidiar nesses casos.
    Outra, investimento na área de transporte por aqui, diria, até um certo tempo, não era tratado prevendo uma situação futura (uma, duas décadas). Até a metade da década de 90, a situação econômica era instável, portanto prever crescimento sustentável, diminuição da classe pobre, novos fabricantes, etc, era algo que limitava atuações mais amplas. O problema é que décadas sem planejamento ou condições melhores para tal e crescimento desordenado resultam num verdadeiro entrave para fazer mudanças necessárias, só que tentando minimizar o impacto da execução.
    Vendo a calçada acima, cito dois péssimos exemplos onde não há ou é mínimo o espaço para circulação de pedestres: o Golf Club, na Caxangá, tem boa parte da calçada imprópria para circulação, inclusive alaga em alguns trechos, e há parada de ônibus próximo sofrendo reforma para receber o BRT; em Sítio dos Pintos, a calçada em alguns pontos é terra batida ou bastante estreita que mal dar para uma pessoa passar, logo transitam pela área por onde passam os veículos.
    Enquanto espera-se uma definição sobre a responsabilidade das calçadas, o pedestre que se vire.

  2. Boa tarde,

    acredito que a implantação de medidas para uma mobilidade verde e sustentável só será possível através de uma ação em conjunto do poder público, iniciativa privada, como bancos, e empresas de ponta, que possuem tecnologias para tanto.
    Muito interessante as soluções propostas pela empresa Siemens, na área de mobilidade verde. Vale a pena dar uma lida.
    http://www.siemens.com.br/desenvolvimento-sustentado-em-megacidades/mobilidade.html