O requinte e a mobilidade

Por

Tânia Passos

As coisas boas e bonitas são atraentes. Na mobilidade não é diferente. Ruas e calçadas bem cuidadas e arborizadas tornam a caminhada mais fácil e possível. O cuidado com a qualidade das intervenções para tornar os ambientes atraentes para os deslocamentos não motorizados, em especial, o pedestre, é um detalhe que precisa ser levado muito a sério. E chamo atenção aqui para dois exemplos emblemáticos na cidade do Recife: as calçadas no desenho das pedras portuguesas e as passarelas.

Em relação às calçadas em pedra, uma característica arquitetônica que herdamos dos portugueses, não foram incorporadas aqui com os cuidados necessários para garantir uma boa acessibilidade. Os nossos granitos “portugueses” são inviáveis do ponto de vista da acessibilidade. E há uma razão para isso. Nunca houve o cuidado e o requinte que o passeio exige.

Quem dera, essa herança portuguesa fosse hoje um dos nosso orgulhos não apenas pela beleza, mas pela eficiência. Polir pedra por pedra para nivelar a superfície é um cuidado que há lá fora, mas não aqui. Nos contentamos, até então, com a beleza dos desenhos e deixamos o nosso conforto e segurança em último plano. Ousamos reclamar apenas dos buracos provocados pela ausência de manutenção. Um degrau muito abaixo do que se poderia supor requinte. Afinal para que tanto trabalho e dedicação com um simples pedestre?

Já o uso da passarela é um desafio para os planejadores urbanos. A presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-PE), Vitória Andrade, resumiu bem a razão dessa dificuldade. Segundo ela, o pedestre, na maioria das vezes, prefere se arriscar pela passagem em nível. Além de encurtar distância ele não se sente atraído em fazer a travessia pela passarela.

A arquiteta compara as passarelas de Londres, verdadeiras obras de arte, que são pontos de confluência e não apenas de passagem, com as nossas, muitas vezes inseguras e desconfortáveis. É verdade que ainda estamos muito longe desse nível, mas as nossas pedras que ainda resistem podem e devem ter um melhor tratamento. Mobilidade também é requinte.

9 Replies to “O requinte e a mobilidade”

  1. Tânia, diria até mais no quesito passarela. A questão é cultural em Recife.

    Morei muitos anos em Salvador e desde o início da década de noventa passarela em Salvador é sinônimo de segurança. Claro que sempre existiu aqueles que se arriscavam por entre os carros. Mas era natural TER uma passarela.

    O que me parece, a anos morando em Recife, que passarela aqui é ANORMAL. Nem sequer se cogita a existência delas em projetos. Nem mesmo a população reclama a favor de sua instalação. Usar então, nem pensar! Não quero entrar nem no mérito paisagístico, pois essa cultura da indiferença (pra não falar da negação) à passarela não é de agora.

    Vamo vê se agora com essa “onda” de mobilidade e sustentabilidade, com preocupação urbanística sobretudo, a coisa muda.

    []’s
    mauro
    maurosilva.wordpress.com
    @maurojcs

    • Mauro,

      Conheci as passarelas de Salvador e, de fato, elas estão integradas. Foi algo que me chamou muito atenção. Fiz até matéria na época comparando com Recife. Na verdade não precisamos ir para Londres pegar exemplos positivos…

  2. Por falar em requinte e mobilidade nas calçadas, a requalificação do Leste-Oeste que prever área para circulação de bikes, paisagismo, vai ser o que na prática?
    No forum que participo, mudanças como a de Bogotá colocando a fiação aérea para substerrânea seria muito bem vinda levantada pelos participantes e até publicado aqui também em matéria do gênero. Padronizar toda a calçada do corredor é outra, mas pelo que vi, pessoas medidando as calçadas apenas perto das estações, mudança mesmo só perto destas pela grande possibilidade de encurtamento delas para alargar a via perto das estações, pois a mesma não suporta quatro veículos por sentido e é previsto ultrapassagem dos ônibus nas estações conjugadas. O tempo vai passando e reforma ideal demandaria bastante tempo no Leste-Oeste, então fica cada vez mais especulativo dizer que a promessa do governo é limitada e não ampla.
    Até a ciclo faixa já existia, sentido centro do viaduto da BR 101 até entrocamento com a da Av. do Forte, mas por falta de manutenção, para variar, ficou apagada em grande parte do trecho.

    Tânia,
    fica aí um assunto para você, se quiser, aprofundar.

      • Na verdade é um thread do grande forum Skyscrapercity.com. Ele é dividido por regiões do mundo e por aí vai subdividindo em tópicos específicos. Participo de vários, mas foco no” PE | Transporte na Região Metropolitana do Recife”. O que temos de novidade, questionamentos, dúvidas, etc, são expostas nele e alguns que visitam percebem boas soluções e enviam para quem pode tornar realidade. Esse thread é visível para leitura, logo não precisa se cadastrar para participar. Outros só cadastrado para ter acesso ao conteúdo, este vindo da mídia também, logo serve como um agregador de conteúdo.

        • Uma correção ao dito acima. O thread é visível para leitura procurando pelo Google, por exemplo. Contudo, para participar (fazer pergunta, comentário, postar algo que tem, etc), só cadastrado. Há um código de ética para publicações acessível na página principal quando se tenta cadastrar tipo não falar palavrão, colocar a fonte de assuntos e imagens, e pode-se, também, criar threads.

  3. Tania, calçada portuguesa exige um profissional raro no Brasil e ausente em Recife, o mestre calceteiro. Sem estes profissionais as calçadas já nascem mal feitas. Piora o fato deste tipo de calçada não ser adequado para que haja arrasto sobre ela, o que é muito comum aqui.