A calçada, você e o outro

Calçadão Boa Viagem Foto - Tersa Maia DP/D.A.Press

Por

Mara Gabrilli

Você já parou para pensar em como as calçadas têm ligação com as nossas vidas? Não só por nos ligar aos serviços e lugares que fazem parte de nossas histórias, mas por serem em sua essência um elo de concreto, que sob nossos pés, nos permite chegar ao outro.

Na Avenida Paulista, cartão postal da capital paulista, entre empresas, bares, cinemas e tantos outros estabelecimentos, circulam mais de 450 mil pedestres por dias. Em cada pedaço do lugar é possível encontrar um mundo diferente de serviços e pessoas, coexistindo sobre o passeio universal da avenida.

Segundo o IBGE, 30% das viagens diárias realizadas em todo o País são feitas a pé. Por conta do alto custo do transporte público, andar não é apenas uma alternativa saudável, é também o meio mais econômico de se locomover e interagir com a cidade e quem faz parte dela.

Pense, quantas pessoas você cruza apenas quando faz o seu caminho de casa ao trabalho? Mesmo que o seu trajeto seja realizado por transporte público ou próprio, por algum momento você precisou da calçada. E por um instante ela o conduziu a alguém.

Longe dos centros urbanos, as calçadas também cumprem seu papel de promotora de encontros. Ao entardecer, é muito comum que as pessoas coloquem suas cadeiras nas calçadas para conversar, ver as crianças brincarem na rua.

O morador precisa da calçada do vizinho para chegar até ele, seja para lhe fazer uma visita, pedir um favor, prestar socorro, jogar conversa fora, oferecer um carinho… Ainda há bairros onde as pessoas se reúnem durante a Copa para pintar as calçadas com as cores do país. Há demonstração mais prática de que a calçada solidifica a união entre pessoas?

Dias desses, aproveitei o calor para fazer algo que adoro: fui jantar a pé em uma padaria próxima a minha casa.  No caminho, encontrei crianças, adultos, jovens, idosos, atletas… Uma diversidade de pessoas, cada uma a sua maneira, utilizando o espaço mais democrático que se pode existir em uma cidade.

Agora, imagine a situação oposta, quando por falta de cuidados, a calçada perde seu papel benevolente de conectar pessoas. Você não encontrará um cadeirante ou um cego, por exemplo, transitando livremente pelo mesmo trecho que um pedestre sem deficiência, se neste local não existir um mínimo de condições de acessibilidade.

Para muita gente, a calçada mal conservada representa um obstáculo, mas para outras pessoas ela simboliza uma barreira intransponível que lhes subtraem o direito de simplesmente fazer parte.

No final de abril de 2012, o Mobilize publicou a campanha Calçadas do Brasil (http://www.mobilize.org.br/campanhas/calcadas-do-brasil/sobre), mostrando o resultado da avaliação de calçadas em 12 cidades brasileiras.

Entre abril e julho do mesmo ano, com o apoio de voluntários, o estudo foi ampliado para a avaliação de 228 ruas em 39 cidades do país. O resultado ficou abaixo das expectativas e trouxe a nota média de 3,40, numa escala de zero a dez.

Também no ano passado, os Guardiões das Calçadas  (http://www.maragabrilli.com.br/guardioesdascalcadas/) vistoriaram cerca de 200 km de calçadas em São Paulo. Nas mais de 40 vistorias realizadas o que se viu foram muitos problemas e pouca participação dos órgãos responsáveis.

Para este ano, o grupo formado por minha equipe de trabalho e alguns voluntários, farão as vistorias concentradas nas vias constantes do Decreto Municipal nº 49.544/08, que define as rotas emergenciais abrangidas pelo Plano Emergencial de Calçadas – PEC.

Instituído pela Lei nº 14.675/08, o PEC é uma Lei de minha autoria enquanto vereadora de São Paulo. Hoje, dos 30 mil km de passeio, cerca de apenas 500 km foram reformados respeitando a legislação.

É importante lembrar que essa lei prevê que a Prefeitura seja responsável pela reforma das calçadas em todas as vias constantes do Decreto. São ruas que priorizam os focos geradores de maior circulação de pedestres, incluindo locais de prestação de serviços públicos e privados em todas as regiões da cidade de São Paulo, em sinergia com paradas ou estações para embarque e desembarque de passageiros em ônibus e metrô.

Ainda vale dizer que ao melhorar 10% dos acessos nesses pontos estratégicos, estamos melhorando 80% da mobilidade urbana de toda a cidade. O resultado dessa simples conta é menos trânsito, filas, acidentes, estresse e também solidão. Afinal, quando facilitamos acessos, chegar ao outro se torna mais fácil e natural.

Iniciativas como a do Mobilize Brasil e dos Guardiões das Calçadas mostram que tanto as cidades quanto as pessoas demandam cuidados, pois a condição do passeio público reflete diretamente no bem estar da população.

Não é por acaso que muitos especialistas afirmam que a qualidade das calçadas é o melhor indicador de desenvolvimento humano, além de funcionar como um sensor para medir o nível de civilidade de um povo. Cuidar da própria calçada e cobrar por sua manutenção e reforma é um ato de cidadania que deflagra seu amor pela cidade e as pessoas – um encontro que você pode ajudar a promover todos os dias.

Fonte: Portal Mobilize

Skate, segregação do espaço público

Uma das belezas da arquitetura é justamente a incerteza do seu uso. Espaços públicos de qualidade contém sempre o imprevisto, o erro, a arte que não antecipada e que só se faz pelo uso.

Há, no entanto, uma certa tendência a desumanizar os espaços para restringir usos e “ordenar” fluxos e comportamentos, nada mais empobrecedor. Em São Paulo andar de skate já chegou até a ser proibido, afinal ia contra a ordem estabelecida. Mas a proibição deu brecha para o debate e acabou por fim contribuindo para a profissionalização do skate como esporte.

Mas permanece a pergunta sobre o que é mais valioso para uma cidade, espaços públicos herméticos e que aos poucos acabam tomados pelos “indesejados”, ou espaços públicos de qualidade com vidas que circulam, brincam e usufruem da cidade.

A resposta parece bastante clara, mas o vídeo que inspirou esse post traz mais elementos para se refletir sobre a idéia de “arquitetura vs. skate”. Em Auckland, cidade mais importante da Nova Zelândia, o embate está definido entre a vontade e necessidade do poder público de conter o ímpeto dos skatistas e tendência dos skatistas de subverter os usos do mobiliário urbano.

Ao mesmo tempo em que faz adaptações anti-skate nos locais perfeitos para um grind, a administração municipal de Auckland investe na construção de “skate parks”, infraestrutura segregada planejada para a prática do skate. O que a princípio soa interessante, é na verdade uma miopia em relação aos desejos reais da comunidade das rodinhas.

O skatista está sempre em busca de novos locais para realizar manobras em busca de desafios. Ter um parque é bom para novos adeptos, mas é na dificuldade de pular uma nova escadaria ou em voar por um corrimão inexplorado que reside o desafio.

Manobras radicais em grandes obras arquitetônicas podem parecer uma grande heresia, contribuindo para o desgaste prematuro da infraestrutura. Mas a realidade é que uma cidade precisa ser adequada para o uso democrático do espaço. Pensar em maneiras de integrar diversos usos é sempre mais eficiente do que segregar cada grupo social, ou tribo, em sua caixinha.

Do Blog Transporte Ativo

A briga pelos espaços públicos

 

Nada mais emblemático na disputa pelo espaço público do que a briga de dois flanelinhas na defesa dos seus “territórios”. As vias públicas estão todas loteadas e há regras entre os loteadores. Ontem, dois flanelinhas se desentenderam quando um invadiu o “espaço” do outro.

A disputa que terminou com briga de canivete e um pedaço de madeira, ocorreu no cruzamento das ruas do Navegantes com a Bruno Veloso, em Boa Viagem. Na avenida beira-mar, essa divisão já foi definida. Os oito quilômetros da avenida foram divididos entre eles da seguinte forma: cada um fica responsável por um quarteirão e valem os dois lados da via.

Há 10 anos trabalhando na Avenida Boa Viagem, o flanelinha Aluísio Xavier do Nascimento, 30 anos, toma conta de um trecho onde cabem 20 carros estacionados dos dois lados. “Eu trabalho aqui a semana toda. Mas o sábado e o domingo são os dias de melhor movimento. Por mês, eu consigo tirar um salário para sustentar a família”, revelou.

Aluísio disse que nunca houve problema na divisão do espaço. “Cada um cuida do seu espaço. E todos nós fomos cadastrados no Instituto Tavares Buril há um mês”, afirmou. A iniciativa da polícia em fazer o cadastramento foi logo após um flanelinha ter sido acusado de extorsão.

Fabrício Barros de Souza, 21, que trabalha na Rua da Moeda, no Bairro do Recife, chegou a passar três dias no Centro de Observação e Triagem (Cotel), em Abreu e Lima,  depois que um policial denunciou ter sofrido extorsão. Fabrício foi liberado, após a prisão ter sido relaxada.

Ontem, a disputa por espaço na via pública acabou na delegacia. O flanelinha que se armou com o canivete, Willis Oliveira da Silva, 19 anos, foi ferido na cabeça com o pedaço de madeira e levado para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Imbiribeira. Depois, ele foi encaminhado para a Delegacia de Boa Viagem junto com o outro flanelinha Wagner da Silva dos Santos, 19 anos, que depois de liberado voltou para o “seu” ponto.

“Ele queria pegar os meus clientes. Eu já tinha colococado papelão no vidro de todos os carros da rua e ele chegou com o canivete para me agredir. Eu peguei o pedaço de madeira e me defendi”, revelou Wagner. Entender a divisão do espaço público é outra questão. Não é apenas a antiguidade no lugar que é levada em conta, mas principalmente quem consegue se impor. Segundo o próprio Wagner, Willis, está no local há mais tempo que ele, mas houve um acordo para dividir os dias. O domingo seria dele.

Wagner dos Santos contou que chegou no endereço por volta das 6h30. “No domingo, o movimento começa cedo. Tenho clientes antigos. Estava lavando um carro, quando me distrai e ele chegou querendo pegar as vagas para ele”, disse. Em média, num dia de domingo, Wagner disse que fatura até R$ 50 cuidando dos carros nas ruas de Boa Viagem. Na delegacia, Willis não quis dar entrevista, mas admitiu que tinha puxado o canivete.

Os dois flanelinhas envolvidos na briga foram liberados depois de terem sido ouvidos. Segundo o delegado de Boa Viagem, Erivaldo Guerra, eles irão responder a um Termo Circustânciado de Ocorrência (TCO). “Eles serão investigados por crime de lesão corporal leve. Vão ser ouvidos no juizado especial criminal”, explicou.

Loteamento das ruas do Recife com direito a mensalista

A cobrança para estacionar em vias públicas ganhou as manchentes dos jornais quando um flanelinha foi acusado de extorsão. Não era para tanto e ele foi solto, mas o problema do loteamento dos espaços públicos continua e corre o risco de cair no esquecimento, sem que providências práticas sejam tomadas.

Os exemplos podem ser encontrados nas ruas do centro e principalmente no entorno de estabelecimentos que funcionam sem oferecer nenhuma opção de estacionamento para os usuários. O resultado é a ocupação das vias e redução da capacidade de circulação do tráfego.

Na Faculdade de Ciências da Administração (Fcap/UPE), localizada na Avenida Sport Club do Recife, 252, na Madalena, a instituição só oferece estacionamento para funcionários e professores. Ou seja, os alunos, os principais clientes, são obrigados a estacionar na rua. E precisam pagar por isso.

A cobrança no local é dividida em duas categórias: os mensalistas e os diaristas. Quem optar em pagar por mês, pelo uso do espaço público, tem desconto e o valor mensal sai por R$ 30,00. Quem preferir pagar no dia, os valores variam de R$ 2,00 a R$ 3,00.

Os alunos não recebem nenhum tipo de apoio da instituição, que pela lei de uso e ocupação do solo, deveria oferecer vagas, de acordo com a demanda esperada. Ninguém faz nada. E o aluno paga para não correr o risco de ter o carro riscado. Bom, se isso não é crime, não sei o que é.