Deitada na calçada do Hospital da Missão em Dombe, M.D. de 28 anos, espera por atendimento. Vítima de malária pela quarta vez este ano, ela é portadora do vírus HIV. Buscava por socorro. Visivelmente abatida. Magra, tinha a pele engilhada e parecia desidratada. Acompanhada do marido, M.S., 39, também portador do vírus da Aids, a mulher estava há quase dois meses sem tomar o coquetel contra a doença, medicação que é fornecida no posto de saúde da província, em Manica. Dos seis filhos do casal, e os dois caçulas, de quatro e seis anos, também já foram diagnosticados com o HIV.
No hospital da missão, não havia o coquetel. As missionárias da Obra de Maria se desdobraram para orientar o homem a buscar o remédio com frequência. Explicam que a família não pode interromper o tratamento. Senão pioram. O homem prestou atenção às orientações, no entanto, questionou novamente. Desta vez, sobre as crianças. Queria saber se elas também têm que tomar o coquetel. Pois alegou que os meninos não sentiam nada. “Eles estão bem”, resumiu, mostrando desconhecimento a respeito da enfermidade.
Em Moçambique, há cerca de 1,5 milhões de pessoas contaminadas com o vírus da Aids, das quais 830 mil são mulheres acima de 15 anos. Os dados são do levantamento é do Programa Conjunto das Nações Unidas sonbre HIV/Aids . Um total de 54% das pessoas portadoras do vírus estão em tratamento e 61% dos infectados têm conhecimento do seu estado, segundo o mesmo relatório, divulgado em julho passado. O documento diz ainda que o país está entre os sete da África oriental e Austral que concentram 50% das novas infecções que ocorreram entre 2010 e 2016, atingindo 790 mil pessoas neste período. Entre 2009 e 2015, a prevalência do vírus HIV/Aids em Moçambique subiu de 11,5% para 13,2%, de acordo com os dados do Inquérito de Indicadores de Imunização, Malária e HIV/Aids, publicados este ano.
O técnico em Medicina que trabalha no Hospital de Dombe, Manoel Domingues, informou que por mês atende cerca de 30 pacientes com HIV, a maioria mulheres. “Elas chegam aqui, geralmente com muita febre, baixa imunidade e vítimas de doenças sexualmente transmissíveis. Procuram atendimento por conta da contaminação com malária e também por adoecerem com tuberculose, já em consequência do HIV”, comentou.
Domingos acredita que o alto índice de HIV/Aids das mulheres moçambicanas é reflexo da falta de política de saúde pública até poucos anos inexistentes no local. Questões socioculturais e biológicas são algumas causas. A dependência econômica da mulher em relação ao homem implica no medo de exigir o uso do preservativo, principal risco, segundo o especialista.
“As mulheres estão mais suscetíveis à contaminação. Outro fator que dessemina a doença é também a poligamia. A mulher tem um homem só, mas este pode ter mais de quatro companheiras”, completou Domingos, ressaltando ainda que a dificuldade das pessoas em usar o preservativo também está relacionada à falta de acesso a esse tipo de proteção, uma vez que o governo de Moçambique não distribui camisinhas com frequência como acontece no Brasil.
Os casos de Aids e mortalidade provocados pela epidemia tiveram uma redução no Brasil.
Segundo Boletim Epidemiológico de HIV/Aids, divulgado pelo Ministério da Saúde, em 2016, a taxa de detecção da doença foi de 18, 5 casos por 100 mil habitantes, uma redução de 5,2% em relação a 2015, quando era registrado 19,5 casos. Já a mortalidade, também observou-se uma queda de 7,2%, a partir de 2014, quando o tratamento foi ampliado em todo o país. Passando de 5,7 óbitos para 5,2 mortes por 100 mil habitantes, em 2016. Já o número de mulheres infectadas nos últimos dez anos, caiu em relação aos homens. Em 2016, foram 22 casos de aids em homens para cada 10 casos em mulheres.