Tudo começou no dia 4 de abril de 1972, quando o Diario de Pernambuco trouxe na página 10 do primeiro caderno, destinada aos municípios, uma matéria do correspondente de Caruaru, Antonio Miranda. Em plena ditadura militar, o título já anunciava a polêmica: “Padre organiza Congresso de Homossexuais”.

O padre respondia pelo nome de Henrique Monteiro, da Igreja Brasileira Ortodoxa Italiana, um paulista casado com uma pernambucana e com uma filha de, na época, quatro meses de vida. Estava disposto a conquistar fiéis entre os perseguidos pela sociedade.

A primeira ação seria celebrar uma missa para as prostitutas na Rua Almirante Barroso, local do meretrício. As “madamas”, como o padre tratava as mulheres de uma profissão citada na Bíblia, deveriam levar um maço de velas e poderiam exercer suas atividades. Anticristão seria apenas o sexo “usado imoderadamente”.

Sobre os homossexuais, a missão do padre seria de “conscientizar os viciados sexuais, a fim de que possam regenerar-se”. Henrique Monteiro ainda afirmaria que “pederastia é uma doença psíquica e o ato sexual entre os homens é coisa séria”.

A própria matéria é carregada de termos como “bonecas”, “deslumbradas” e trata o encontro inédito na Capital do Agreste, programado para 9 de julho, como “conclave”.

No dia seguinte, o jornal já trata o assunto como manchete da página de… Polícia. O delegado de Costumes, Genivaldo Fonseca, enviou ofício ao delegado de Caruaru solicitando informações a respeito do Congresso de Homossexuais. O padre também seria intimado a depor.

Para o delegado, o encontro “seria uma fórmula de escape para a frustração de uma dezena de invertidos que ainda não se habituaram a viver numa terra onde somente os machos têm vez”.

O assunto estava rendendo. No dia 6, o Diario desmentiu a informação de que o padre havia fugido. Ele teria viajado de ônibus para Natal. O deputado estadual José Liberato declarou ao jornal que não concordava com a realização de um congresso de “enxutos” em Caruaru, que possui uma juventude estudiosa.

No dia 7, o correspondente de Caruaru assina reportagem que apresenta o apoio das prostitutas da cidade ao congresso do padre Henrique Monteiro. O delegado da cidade, coronel Oziris Ferraz reforçou que não permitiria a reunião dos homossexuais. Já o monsenhor Isnaldo Fonseca, falando em nome da Arquidiocese do Recife, destacou que o padre Henrique Monteiro não pertencia à sua igreja. E sobre a polêmica? “Os homossexuais são pessoas humanas que devem resolver seus problemas dentro da faixa de cada problema humano, como outras pessoas”. O hoje artista plástico Cavani Rosas fez a ilustração da página.

No dia 8 de abril, o padre Henrique Monteiro apareceu na capa do Diario. Ao lado do personagem todo paramentado, a informação de que o juiz da 2ª Vara de Caruaru, Aluiz Tenório de Brito, condenou “energicamente” a realização do I Congresso de Homossexuais. Classificou como publicidade sensacionalista e sem motivação científica planejada.

No dia 11, o assunto voltou ao Diario com novidades. A missa das prostitutas foi marcada para outra data para não coincidir com um jogo do Santa Cruz na cidade. Além do aumento do trabalho das “Madalenas” com os torcedores, soldados ocuparam a rua.

No dia 12, a capa do Diario trazia o destaque de que o padre Henrique Monteiro iria convidar o figurinista Denner para o seu congresso.

Quase uma semana depois, o fim da história. Uma foto do padre abre a manchete da página de Polícia do dia 18 com a informação: “Preso idealizador do Congresso das Bonecas”. Henrique Monteiro havia sido detido no município de Vitória de Santo Antão, quando angariava fundos para Capela do Poderoso Menino Jesus de Praga. O morador Alberto Luis do Rego Barros o denunciou após ter dado Cr$ 5, supostamente quando suspeitou que o dinheiro ajudaria no tal congresso de homossexuais.

No Recife, o padre foi convencido pelas autoridades a desistir da ideia de organizar o evento. Seus antecedentes “morais e políticos” seriam levantados e não havia muita disposição das autoridades de permitisse que ele continuasse em Pernambuco, “terra de cabra macho”, segundo ressaltou o diretor da Delegacia de Polícia do Interior, Moacir Sales.