Em Foco 1111

Teatro de Santa Isabel é apontado como o melhor do país em eleição na qual superou quatro concorrentes, entre eles o Castro Alves, de Salvador.

Luce Pereira (texto)
Brenda Alcântara (foto)

A diferença entre os teatros de Santa Isabel e São Carlos – um dos maiores símbolos de Lisboa – não está no tamanho nem na arquitetura, muito menos na idade, pois o primeiro é mais novo do que o segundo apenas 57 anos. Está, sim, na medida do orgulho. Dia 19 de outubro, encontrava-me na cidade e fui assistir à estreia da ópera Madame Butterfly. Já no foyer, lotado, a conversa não era outra a não ser a beleza do edifício, erguido para homenagear uma princesa – Carlota Joaquina de Bourbon –, a exemplo do teatro pernambucano, que teve a construção dedicada a Isabel, filha do imperador Pedro II e bisneta da própria Carlota.
Era orgulho cristalino, que chegava às alturas quando, já na plateia, os frequentadores se desmanchavam em elogios à grandiosidade do ambiente e ao requinte dos detalhes. Sentada ao lado de uma portuguesa que encarnava a satisfação em pessoa, logo meu pensamento viajou para a Praça da República. Imaginei que nós, também, temos uma casa de espetáculos para europeu nenhum botar defeito, porém somos muito mais econômicos na hora dos elogios e do reconhecimento. Outra vez ele veio de fora, com o anúncio do vencedor da 15ª edição do Prêmio Cenym de Teatro Nacional 2015: passou na frente de teatros como o Castro Alves (BA), Bradesco (SP), Porto Seguro (BA) e Riachuelo (RN), depois de eleição realizada em Aracaju, na Academia de Artes no Teatro do Brasil. Até Joaquim Nabuco deve ter batido palmas.
Concluído em 18 de maio de 1850, o projeto de construção do grande teatro dos pernambucanos, pelo engenheiro francês Louis Léger Vauthier, consumiu dez longos anos de investimentos e expectativas, mas cumpriu seu destino e finalidade: de tornar-se o principal cenário da capital para eventos culturais e históricos. Não por acaso recebeu Castro Alves e abriu espaço para os brilhantes pronunciamentos de Joaquim Nabuco e José Mariano em favor dos escravos, o que prova uma placa na qual está gravada a célebre frase de Nabuco: “Aqui nós ganhamos a causa da Abolição”. Dividindo o palco com óperas e artistas famosos, a política continuou marcando presença na casa através das vozes de Martins Júnior e Silva Jardim em defesa da república, enquanto ninguém menos do que Rui Barbosa foi ouvido lá, em discurso pela campanha à Presidência da República.
Resistir, portanto, é um verbo que faz parte do “DNA” do Santa Isabel. Ressurgiu das cinzas depois de ser praticamente destruído por um incêndio, em 1869, enfrentou o descaso de governos indiferentes à cultura e à História e chegou a ficar cinco anos e meio fechado, até dezembro de 2000, a propósito de uma reforma amplamente criticada, sobretudo pela morosidade. Aqui, também, pareceu cumprir o destino das poucas casas de espetáculo da cidade, que não recebem cuidados sistemáticos e se veem obrigadas a encerrar as atividades por tempo indeterminado, caso do Teatro do Parque, que há mais de cinco anos despediu-se do público, não sem lamentos e protestos dos frequentadores.
Belo e imponente, o Santa Isabel arrancou da festejada coreógrafa alemã Pina Bausch, em visita meteórica ao Recife, no dia 2 de agosto de 2002, expressão difícil de ser esquecida por quem a acompanhava. Ao cansaço da agenda, extenuante para os 62 anos, sobrepôs-se a alegria de ver, longe da Europa, um teatro à altura daqueles nos quais eternizou sua arte. Parecia em casa.