Em Foco 1611

Segurança já era uma das questões mais delicadas para os países receberem os migrantes. Depois dos atentados em Paris tornou-se o principal obstáculo.

Vandeck Santiago (texto)
Dominique Faget (foto)

Um passaporte encontrado entre os mortos tornou-se uma das grandes incógnitas da série de atentados em Paris. O documento pertenceria a um dos terroristas. Trata-se de um cidadão sírio. Se a história acabasse aí, não despertaria maior atenção. O problema é que o passaporte revelou que o seu dono atravessou o território grego com um grupo de refugiados, em direção à Europa. Vejam só o teor explosivo dessa história: um dos refugiados, aquelas pessoas que a gente vê diariamente sofrendo horrores para escapar de guerra e fome, teria se aproveitado do fluxo em direção à Europa para entrar lá e cometer um ato terrorista.
A autenticidade do passaporte foi reconhecida pela França, e os registros de passagem confirmados por autoridades gregas e sérvias, por onde o cidadão passou. Falta confirmar se ele seria mesmo um dos terroristas. Caso isso se confirme, dá para imaginar o impacto que terá sobre a crise dos refugiados. Será o argumento mais forte das forças políticas dos países europeus para restringir a entrada daquelas pessoas em seu território.
A segurança já era uma das questões delicadas que os líderes europeus precisavam enfrentar para acolher os refugiados. Após os atentados em Paris, tornou-se o ponto principal. No noticiário de ontem já apareciam ostensivos sinais da nova situação. “Vamos aceitar refugiados somente se tivermos garantias de segurança”, disse à BBC o ministro para Assuntos Europeus da Polônia, Konrad Szymanski, cujo país aceitara receber 4,5 mil migrantes. Na mesma matéria vem outra declaração seguindo trilha semelhante, do diretor da agência de inteligência doméstica alemã, Hans-Georg Maassen: “Temos verificado que os extremistas estão abordando refugiados em centros de acolhimentos. Temos conhecimento de pelo menos 100 casos”. A Alemanha foi o país que mais recebeu migrantes sírios nos últimos quatro anos.
O êxodo de caravanas humanas que rumam em direção à Europa (grande parte dos seus integrantes fugindo da Síria, que está em guerra civil desde 2011), tornou-se a maior crise humanitária do mundo, desde a Segunda Guerra Mundial. Mas em nenhum lugar a situação é vista apenas sob este ângulo (nem poderia, a menos que vivêssemos em um “mundo ideal”) – em cada país a decisão dos governos terá impacto interno, nas eleições sobretudo. Ontem, por exemplo, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy (da direita) defendia que “pulseiras eletrônicas” fossem colocadas em todas as pessoas fichadas por terrorismo na França, enquanto o ministro do Interior francês Bernard Cazeneuve, do governo socialista de François Hollande, anunciou que o país começará “a dissolver mesquitas onde o ódio é pregado”.
A carnificina dos terroristas na França matou mais de uma centena de inocentes. Como se isso não bastasse, estendeu as consequências de sua barbárie para os milhares de homens, mulheres, jovens e crianças que hoje sofrem em campos de refugiados e que, em muitos casos, foram parar ali exatamente porque decidiram fugir do terrorismo que os ameaçava em seus países.