Em Foco 1711

Em toda tragédia há aqueles que veem no sofrimento dos outros uma oportunidade para lucro fácil. É o que está acontecendo após a enxurrada de lama em Mariana (MG).

 

Vandeck Santiago (texto)
Douglas Magno/AFP (foto)

 

Tragédias fazem aflorar grandezas e pequenezas. Surgem exemplos de pessoas que se arriscam pelo outro, que praticam gestos de heroísmo para aliviar sofrimento de desconhecidos, que agem como parte de uma anônima corrente de solidariedade. Enquanto isso, porém, há os que veem os acontecimentos como uma forma de tirar algum proveito.
Vejamos o caso da enxurrada de lama em Mariana (MG), provocada pelo rompimento no último dia 5 de barragem da mineradora Samarco, pertencente às empresas Vale e BHP. Notícias vindas de Minas Gerais e do Espírito Santo informam que diante da escassez de água potável nos municípios atingidos comerciantes aumentaram abusivamente o preço do galão de água mineral. Custavam R$ 8; passaram para R$ 20.
Em MG o caso foi denunciado no município de Governadores Valadares, e as polícias militar e civil começaram a fazer rondas para coibir o abuso; no ES, onde a lama também deve chegar proximamente, as denúncias são nos municípios de Baixo Guandu, Colatina e Linhares. Quem for pego cometendo a exploração pode ser preso, informou o Ministério Público Estadual de lá.
O desastre ambiental matou gente, destruiu propriedades, causou danos irreversíveis – e lá na ponta da tragédia tem gente buscando tirar vantagem da situação, aumentando o preço de um bem necessitado pela população. Impressionante.
O pior é que esse tipo de comportamento não é algo inusitado, ao contrário. Em janeiro de 2013 o distrito Xerém, de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, foi devastado por uma forte chuva. Mais de 1.200 desabrigados, gente morta, sofrimento geral. Sabem o que aconteceu nos dias seguintes? Supermercados da região passaram a cobrar preços abusivos de galões de água e até de panos de chão. Do dia para a noite houve produto que teve preço duplicado.
Em junho de 2010 uma enchente causou mortes e destruição em Pernambuco, que teve 12 municípios em estado de calamidade pública. Os dois mais atingidos foram Palmares e Barreiros. O que aconteceu nos dias seguintes? Aumento exorbitante nos preços de água mineral, gás de cozinha e alimentos. Uma equipe de Diario flagrou pessoas vendendo galões de água a R$ 20, quando o preço (na época) era de R$ 3,50. Alimentos retirados da lama foram apreendidos sendo vendidos no entorno do Mercado Público de Cavaleiro (Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife). Em Palmares o transporte de mototáxi passou de R$ 2 (antes da enchente) para R$ 5 (depois). É a lei da oferta e da procura distorcida no grau máximo.
Em qualquer desastre como os que listamos aqui, encontraremos práticas semelhantes. É surpreendente, mas o que estes exemplos mostram é que entre nós há pessoas que não se sensibilizam nem com tragédias. Pior do que isso: pessoas que veem no sofrimento alheio uma oportunidade de ganhar dinheiro fácil. São os usurários da desgraça.

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