Em Foco 1811

Ameaça de bomba em estádio da cidadde alemã de Hannover faz população da Europa se sentir mais vulnerável ao ataque de terroristas.

Luce Pereira (texto)
Greg (arte)

Talvez este seja um dos natais mais tristes dos últimos vinte anos, no continente – escreveu, sábado, uma amiga que mora em Bremen (Alemanha), impactada com a carnificina de Paris e a crescente ameaça de tempos ainda mais sombrios na Europa. Ontem, após a notícia sobre o adiamento do amistoso entre Alemanha e Holanda, porque o estádio HDI Arena, em Hannover, poderia estar sob ameaça de bomba, ela não deve ter mais qualquer dúvida, inclusive de que o terror passará longo período se dedicando à tarefa de enfraquecer a liberdade, algo caríssimo para os europeus. Imaginá-los com medo de ir ao supermercado, ao parque; de apanhar o metrô ou perder horas nas cadeiras de um café nos faz mais próximos na aflição de sentir que a violência torna a vida por um fio.
Estivemos rapidamente em Hannover, no outono em 2013, e me vem à memória que enquanto seguíamos por ruas charmosas e movimentadas eu ouvia dela elogios à organização reinante na Alemanha, edificada sobre um alicerce “praticamente impossível” de ser balançado, porque o país, depois do Holocausto, havia aprendido a fortalecer a cultura da paz como se fosse um dever de casa diário. Era o olhar esperançoso de uma brasileira que estava longe da terra natal havia mais de 20 anos e, por isso, já se considerando parte do país no qual deu à luz a filha. Era, também, a grata sensação do triunfo da segurança sobre o medo, afinal, nunca experimentada nos tempos vividos abaixo da Linha do Equador.
Mas a vida consegue ser “real e de viés” (Caetano Veloso/ O quereres) mesmo em ilhas de prosperidade onde o progresso humano alavanca o econômico e as duras lições da História são usadas para alargar os caminhos do futuro. O terror vem trabalhando exaustivamente para interromper esta caminhada e por enquanto, como resposta, recebe apenas promessa de ser combatido com rigor proporcional às tragédias que provoca. Falta a tão defendida reação em conjunto, que esbarra nos interesses políticos das maiores potências mundiais. Elas têm marchado em bloco contra os extremistas assassinos mas só na foto, como se viu depois do ataque à redação do jornal francês Charlie Hebdo, há apenas dez meses. De braços dados, líderes caminharam pelo centro de uma Paris em estado de choque, o que sugeria, a partir dali, combate de todos, feroz e incansável, aos que seguem ameaçando a paz no mundo.
Mas foi só pose mesmo, os terroristas provaram com a ida ao Bataclan, na última sexta-feira. A descrença nos governos e em seus esquemas de defesa atingiu as alturas, o medo se agigantou diante da suspeita de que a Europa está condenada ao desassossego; malas começaram a voltar para os armários quando deveriam estar às vésperas de girar na esteira do check-in – nada, afinal parece pesar mais na opção por um destino no exterior do que segurança, sobretudo para quem já sofre tanto com a falta dela no dia a dia. Então, turismo em queda, mercados ressentidos, desconfiança e ódio substituindo a fé no homem e no que ele pode fazer pela sobrevivência da própria espécie.
Depois dos últimos temores, aguardo com certa ansiedade nova ligação de minha amiga, nos falamos com alguma frequência. Ela vai dizer que agora tem mais um motivo para crer em quão comprometida estará a alegria, no próximo Natal. E eu perguntarei se considera, ainda que minimamente, a possibilidade de um dia voltar ao Brasil.