25.06

“Não desistir nunca” e “trabalhar duro” são objetivos que valem a pena ser mantidos para a vida toda.

Vandeck Santiago (texto)
Ricardo Bufolin (foto)

Desculpem-me falar de trabalho árduo em um pós-feriado, mas a importância do tema se impõe à data. Um livro que acaba de ser lançado nos EUA defende a tese de que a combinação de persistência e paixão é mais importante que o talento. Na opinião da autora, a psicóloga Angela Duckworth, da Universidade da Pennsylvania (EUA), a força do talento é “superestimada” em nossas sociedades. “Talento conta, [mas] o esforço conta duas vezes”, diz ela, segundo matéria da The Economist (uma das muitas que têm saído na imprensa sobre o trabalho). Seu livro, Grit: the power of passion and perseverance (O poder da paixão e da persistência, numa tradução livre), entroniza o princípio de que “não desistir nunca” é um objetivo que vale a pena manter para a vida toda.
Angela Duckworth teve a atenção despertada para o tema quando era professora de matemática e percebeu algo que a deixou intrigada: a maioria dos alunos mais bem-sucedidos não era daqueles que mostravam uma aptidão natural para a matéria, e sim dos que se esforçavam mais. Como aluna de psicologia na mesma universidade onde hoje ensina, ela começou a estudar o tema e criou o termo com o qual abre o título do seu livro: “Grit”, que ela define como uma combinação de paixão e persistência. Em 2013 a professora fez parte da tradicional lista de “Gênios do Ano”que a Fundação MacArthur (EUA) elabora anualmente, contemplando pessoas de profissões diversas. “O foco exclusivo no talento desvia nossa atenção de algo que no mínimo tem a mesma importância: o esforço”, diz ela.
Não se trata da voz isolada de uma professora obcecada pelo tema dos seus estudos – nas últimas duas décadas estudos diversos têm dado embasamento à tendência de considerar o esforço (outra forma de definirmos “persistência + paixão”) como determinante para chegar ao topo das carreiras. Mais até do que um talento inato.
Claro que “trabalhar duro”, em qualquer atividade, não é o único fator do sucesso. Em sociedades de grande desigualdade, como a nossa, há inúmeros outros obstáculos à frente dos que nascem nas parcelas menos favorecidas da população. Também não é capaz de operar milagres – se fosse, bastaria o leitor ou leitora largar este artigo, comprar uma raquete de tênis, treinar arduamente durante umas 10 mil horas e ao fim teríamos mais uma Venus Williams ou Novak Djokovic fazendo sucesso pelas quadras do mundo inteiro.
Menciono o prazo de “10 mil horas” não por acaso; livro lançado no Brasil em 2010, Outliers – Fora de Série (Editora Sextante), do jornalista Malcolm Gladwell, popularizou entre nós a chamada “regra das 10 mil horas”. Este seria o total necessário para se atingir a maestria na área de interesse de cada um, segundo Gladwell, citando pesquisa sobre o assunto do professor Anders Ericsson, da Universidade da Flórida (EUA). A informação gerou polêmica; o professor Ericsson se pronunciou ressaltando que a regra das 10 mil horas não era para todos, e sim para os que tivessem uma performance já destacada em sua área. Não somos especialistas na área, nem pretendemos neste artigo aprofundar a discussão sobre este ponto específico, mas podemos supor que ao fim de 10 mil horas de prática constante qualquer pessoa estará com sua performance melhor do que antes – e, além disso, terá posto em prática algo sobre cuja eficácia todos (Duckworth, Ericsson, Gladwell…) concordam como fator de sucesso: a persistência.
Ano passado chamou-me atenção notícia (que arquivei) sobre palestra dada na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Navarra (Espanha) por um dos mais conceituados chefs do mundo, o catalão Ferran Adrià. Pois bem, do que falou Adrià? De receitas extraordinárias ou da melhor forma de gerir um restaurante? Não, falou do esforço. “Se você quer ser excepcional, sobretudo no mundo de hoje onde há talentos incríveis, tem que levar em conta que o esforço normal não vale”, disse ele. “A grande diferença entre os bons e os muito bons é o esforço. Se eu e você somos iguais em nossa capacidade, e você trabalha (se esforça) 8 horas, e eu 14, eu ganharei”.
Independentemente de qual seja sua área de atuação, do seu talento ou da falta dele, os estudos científicos e o senso comum parecem convergir cada vez mais para a convicção de que o esforço é indispensável. Como país e como cidadãos, deveríamos ter isso sempre em mente.