Condutoras acima de qualquer piada

Diario de Pernambuco

Por Laís Capristano

 

Se você é daquelas motoristas que mal sabem onde fica o motor do carro e acham que fazer “manutenção” significa botar gasolina e encher os pneus de vez em quando, talvez seja hora de conhecer um pouco mais sobre automóveis. Pensando nesse perfil de condutoras que querem ficar bem longe do estereótipo machista da “barbeira”, o Detran-PE abre, nesta segunda-feira, as inscrições para um curso gratuito de mecânica básica para mulheres. O órgão também vai dar capacitações de direção e pilotagem defensivas, essas abertas também aos homens.

Os cursos serão oferecidos durante todo o ano, na sede do Detran, na Estrada do Barbalho, Iputinga. As inscrições para as 2.920 vagas podem ser feitas no site www.detran.pe.gov.br. Os alunos têm que ser maior de 18 anos e devidamente habilitados.

Bastante procurado, o curso de mecânica para mulheres atende a uma parcela de motoristas carentes por mais conhecimento ao volante, inclusive para não serem enganadas em oficinas mal intencionadas. “As participantes começam a ter noções básicas sobre o funcionamento dos veículos de passeio e podem identificar problemas mecânicos”, descreve a gestora da Escola Pública de Trânsito (EPT), Joelma Sena. Quem já concluiu o curso garante que vale a pena. “Hoje eu sei trocar o óleo e o pneu e consigo reconhecer alguns problemas no carro”, disse a cuidadora Alcione Nascimento. Antes de frequentar as aulas, ela tinha medo de enfrentar uma oficina mecânica. “Agora posso resolver sozinha qualquer contratempo do meu carro, sem medo de ser enrolada nas oficinas”.
Nos cursos de pilotagem defensiva e direção defensiva, os alunos, em sua maioria homens entre 18 e 30 anos, buscam instruções para evitar acidentes. Foi o caso do policial militar Adriano Ramos, 32 anos. “Trabalho de moto quase todos os dias e senti que precisava dessa capacitação para minha profissão e minha vida pessoal”, ressaltou.

As instruções sobre legislação de trânsito, noções de cidadania e técnicas para evitar acidentes serão repassadas aos alunos durante cursos semanais. As lições vão trazer dicas sobre condução em situações adversas, frenagem com desvio seguro, curvas e direção eficiente. Ao final do ciclo de explanações e exercícios práticos, os concluintes receberão um certificado. “Para muitas pessoas, este é um diferencial na hora de concorrer a uma vaga no mercado de trabalho. Uma especialização em condução segura dá mais credibilidade ao profissional”, acrescentou a gestora Joelma Sena. A Escola Pública de Trânsito funciona das 8h às 12h, de segunda à sexta, de acordo com o calendário letivo da instituição.

Saiba mais

Cursos e vagas

Mecânica básica  para mulheres

Inscrições: 26/03
Vagas: 30 pessoas
Início das aulas: 02/04

Praticando direção defensiva

Inscrições: 02/04
Vagas: 35 pessoas
Início das aulas: 09/04

Pilotagem defensiva

Inscrições: 02/04
Vagas: 35 pessoas
Início das aulas: 09/04

 

 

 

Agente de trânsito, profissão de risco

 

Diario de Pernambuco

Por Tânia Passos

 

Definitivamente não é fácil ser agente de trânsito. Multiplique o grau de dificuldade adicionando o calor infernal de todos os dias e um trânsito que só piora. Em 2003, quando o trânsito do Recife foi municipalizado, a frota da capital era de 374 mil veículos e hoje é de 577 mil, o que dá uma média de 1.442 carros por agente, sem falar na frota circulante. Para descobrir como é o dia a dia do agente de trânsito, o Diario acompanhou um turno de uma dupla de agentes, no cruzamento da Avenida Agamenon Magalhães com a Bandeira Filho e descobriu que o maior inimigo desses profissionais não é o sol, a chuva ou o próprio trânsito, mas sim as ameaças que eles sofrem diariamente dos motoristas. Não por acaso, a direção da CTTU defende que os agentes trabalhem armados e tenta firmar convênio com a Polícia Federal.

Desde a municipalização, há nove anos, quatro agentes foram baleados em serviço, um não resistiu aos ferimentos. A estatística da CTTU não contabiliza, no entanto, as ameaças. Durante seis horas, das 7h às 13h, do último dia 14, acompanhamos o trabalho dos agentes Josenílson Gomes da Silva, 46 anos, e Edmílson Cruz, 51 anos, e conseguimos flagrar uma das ameaças sofridas por eles. Eram 8h32, quando um pálio prata parou na faixa de pedestre e o motorista, do sexo masculino, aparentando cerca de 40 anos, conversou com os dois agentes que estavam na esquina da calçada do pontilhão, sentido Boa Viagem. O motorista reclamava da notificação feita por um dos agentes, quando ele fez uma conversão não permitida. “Ele veio falar com a gente com uma arma entre as pernas, de forma que a gente pudesse ver. Ele disse que o carro era do governo, mas não precisava mostrar a arma. Para mim é uma forma de intimidação e nós temos que ter jogo de cintura para lidar com situações como essa”, esclareceu o agente Josenílson Gomes. Segundo ele, o carro foi notificado, mas não quis fornecer a placa.

Convênio

De acordo com a presidente da CTTU, Maria de Pompéia, as ameaças aos agentes de trânsito são uma das preocupações do órgão e ela defende o armamento. “Aguardamos a realização de um convênio entre a Prefeitura do Recife e a Polícia Federal para que os nossos agentes possam trabalhar armados. É uma profissão de risco. Já tivemos um agente assassinado e três baleados”, ressaltou Maria de Pompéia. Chefe da delegacia de controle de armas e produtos químicos da PF, o delegado Eduardo Passos explicou que a Polícia Federal já enviou a minuta do convênio, mas é necessário que o prefeito e o superintende da PF formalizem a assinatura. “A partir da assinatura, o município terá que cumprir algumas exigências para liberação do porte de arma”, explicou. Ainda segundo o delegado, o porte de arma é fornecido apenas para a guarda municipal. No caso do Recife, os agentes também são guardas. “O guarda municipal é integrante da segurança pública. Ele pode auxiliar com o uso correto da arma de fogo”, afirmou. Segundo o delegado, os municípios que não cumprirem as normas, terão o convênio cassado.

Entrevista >> Agente de trânsito, Carlos Roberto da Rocha

“Ficamos muito expostos”

O agente de trânsito Carlos Roberto da Rocha, 42 anos, escapou da morte por muito pouco. Ele levou três tiros à queima roupa, no exercício da profissão, no cruzamento da Avenida Agamenon Magalhães com a Paissandu. O crime foi em 2007. O agressor, um policial militar, foi condenado e expulso da corporação. Cinco anos após o episódio, o agente ainda sofre os efeitos da violência. Nesta entrevista, ele conta os momentos difíceis e a superação.

Como foi que aconteceu?
Havia um carro parado no cruzamento e já estava atrapalhando o trânsito. Fui até lá e falei com o condutor para retirar o veículo. Ele disse que não ia tirar. Argumentei, mas ele ficou alterado. Resolvi ir embora e quando já estava me retirando, percebi que ele havia descido do carro e por trás de um poste ele efetuou os disparos. O primeiro tiro bateu no meu ombro esquerdo e eu caí. Vieram então os outros disparos. Recebi mais um tiro na altura da cintura, no lado esquerdo, que atingiu a veia femural e outro tiro nas costas bem próximo à coluna.

Nesse momento, o senhor achou que ia morrer?
Quando estava deitado no chão tentanto me locomover e pedir ajuda, pensei que iria morrer. Uma ambulância do Corpo do Bombeiros que estava vindo no outro lado da via fez o socorro. A viatura chegou logo ao local. A sorte é que o Hospital da Restauração fica próximo, do contrário, teria morrido.

Quanto tempo o senhor ficou  se recuperando?
Eu fique dois anos e quatro meses em tratamento. E o médico que me acompanhou disse que pela gravidade dos ferimentos, o tempo foi até razoável.

E  a volta ao trabalho?
Fui muito bem recebido pelos colegas. Senti que foi uma vitória. Era como se tivesse começando tudo pela primeira vez.

O senhor não quis voltar para as ruas?
A empresa me deu a opção de escolher e preferi ficar interno.
Na rua é inseguro. Ficamos muito expostos. A gente nunca sabe com quem está lidando. E, apesar de tudo o que aconteceu, nada mudou. Os agentes continuam trabalhando desarmados e sem colete à prova de bala.

 

O saldo da insensatez

Foi em 2006, três anos após a municipalização do trânsito no Recife, que o agente Emanuel Messias, 35 anos, morreu após ser baleado por um motociclista na Avenida do Forte, após uma abordagem. Sem chance de defesa e socorro. No ano seguinte, o agente de trânsito Hélio Costa, 45, trabalhava na Rua Amélia quando dois homens, em uma moto, que fugiam após um assalto, entraram na contramão. “Ia seguí-los na moto, mas um taxista avisou ques estavam armados. Pare. Mas eles atiraram e uma das balas bateu no meu pé e atingiu a veia femural”, contou. Foram quatro meses de recuperação. “Voltei para as ruas. É preciso seguir em frente”, disse. Também em 2007, o agente de trânsito Carlos Rocha, 38, foi vítima da violência (leia entrevista acima). Levou três tiros quando trabalhava no cruzamento da Avenida Agamenon Magalhães com a Paissandu. No ano passado, o agente de trânsito Wellington dos Santos, 42, foi baleado na perna enquanto trabalhava na Avenida Beberibe. O delegado que presidiu o inquérito não configurou o caso como tentativa de homicídio. O agente também retomou as atividades na rua.