Desafio do transporte público:atrair classe média

 

Fernando Bandeira, presidente da Urbana-PE

 

Apesar do Sistema Estrutural Integrado (SEI), que integra os ônibus de toda a Região Metropolitana do Recife, ser um exemplo de modelo para o resto do país, a qualidade do serviço ainda deixa muito a desejar. Nesta entrevista, o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros em Pernambuco (Urbana-PE), Fernando Bandeira, diz que ainda é possível atrair o público que foge para o transporte individual. (Tânia Passos)

 

O que é preciso para termos  transporte de qualidade?

Há muito tempo não havia investimentos na infraestrutura do transporte público. E o que é preciso para o ônibus andar? Que tenha corredores exclusivos. Agora com esses corredores que estão sendo construídos o transporte vai poder fluir e não ficar preso nos engarrafamentos. Com isso, nós acreditamos que a população que hoje não utiliza o transporte público vai passar a usar.
A climatização é uma das críticas. Outra é com relação a demora nos intervalos.

O maior problema é que não temos pistas exclusivas e os ônibus ficam presos nos engarrafamentos. Não é uma questão de aumentar a frota. Há trechos na Agamenon em que a velocidade do ônibus é de 5km/h e a expectativa com os corredores é de uma velocidade média de 25km/h. Quanto a climatização isso será modificado com a licitação do transporte público. O edital exige climatização em todos os coletivos, mas isso deverá  trazer impacto na tarifa.
Fora dos horários de pico, muitos ônibus trafegam vazios ao lado de uma fila de carros. Como atrair esse público?

Acho que a instalação dos corredores e a mudança dos ônibus nos moldes do BRT (Transporte Rápido por Ônibus) será uma oportunidade para atrair o público da classe média. No show de Paul Macartney a classe média usou o ônibus e aprovou. Falta divulgação. As pessoas precisam saber que o ônibus fica mais vago for a dos horários de pico.
Já nos horário de pico com aquela superlotação ficará bem mais difícil, não é?

Na verdade teremos ônibus maiores e articulados e com um aumento da velocidade. A tendência é que não fique tão superlotado. Mas não se pode esperar que só tenha passageiros sentados, do contrário a tarifa ficaria impraticável.

Cadê os geladinhos?

Diario de Pernambuco

Por Tânia Passos

Há hoje apenas 37 ônibus com ar-condicionado e cadeiras estofadas que fazem parte do sistema público de transporte da Região Metropolitana do Recife.

O luxo, que sai por R$ 2,67, 0,52 centavos a mais do que o anel A do ônibus convencional, representa apenas 1,2% da frota de 3 mil veículos da RMR. Atualmente há quatro linhas disponíveis no sistema geladinho: Aeroporto (opcional), Candeias (Opcional), Recife/Porto de Galinhas e Gaibu/Barra de Jangada.

Na viagem que fizemos na linha Aeroporto, havia bastante espaço e a temperatura interior estava agradável. A promotora de vendas Diana Maria Vieira, 46 anos, costuma pegar o geladinho, mas reclama que as opções são restritas. “Se for fazer uma rota diferente a gente tem que ir para o convencional. Outro problema é  a demoram”, revelou.

Para o especialista em mobilidade urbana, César Cavalcanti, além da melhoria do conforto, rapidez e regularidade nas viagens é preciso também outras medidas para frear a frota de veículos nas cidades. “São necessárias políticas de restrição ao automóvel, entre elas o pedágio urbano, rodízio de placas, sobretaxa do combustível. Isso terá que ser feito. A única questão é quando?”, ressaltou.

Os ônibus da RMR transportam por dia 2,1 milhões de passageiros. Cerca de 60% desse universo são transportados nos horários de pico (manhã, tarde e noite).

ônibus vazios e carros parados

 

 

Diario de Pernambuco

Por Tânia Passos

Vazios por dentro e congestionados por fora. Após os horários de pico, a frota de três mil ônibus que circula na Região Metropolitana do Recife recebe uma demanda de cerca de 40% e muitos trafegam praticamente vazios.

Não há, no entanto, atrativo suficiente para conquistar o usuário do carro, que sai de casa depois das 8h, muitas vezes sozinho em seu veículo. Lado a lado: ônibus vazios e uma fila de carros a qualquer  hora.

A ocupação irracional do espaço das vias, que só tende a piorar, está longe de ser invertida. A melhoria do transporte público deve levar em conta o conforto, a segurança, a rapidez, regularidade e um outro fator subjetivo, que vai de encontro a tudo isso: o desejo do usuário em adquirir o próprio carro ou moto justamente para fugir do transporte público.
O administrador João Paulo Marinho, 27 anos, mora em Camaragibe e trabalha em Boa Viagem. Passava das 10h, da última quinta-feira, quando o encontramos em um ônibus da linha Setúbal/Príncipe, na altura da Pracinha de Boa Viagem, na Conselheiro Aguiar.

Além dele, havia outros cinco passageiros. Não foi difícil perceber o contrasenso do ônibus com mais de 80% das cadeiras vazias e uma fila de carros passando ao lado da janela de João Marinho. “Não teria nenhuma dúvida em trocar de lado se pudesse, disse o passageiro, apesar do relativo conforto.
E ele não é o único. Uma média de 3.500 novos carros entram em circulação a cada mês na capital pernambucana. E cerca de 8 mil mensais na Região Metropolitana.

“O transporte público terá que ser mais rápido para concorrer com os carros. Se o ônibus atingir uma média de 30 quilômetros, na pista exclusiva, fará uma diferença grande”, revelou o especialista em mobilidade urbana e coordenador regional da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), César Cavalcanti.
Para a assistente financeira Aline Carvalho, 29, há duas questões que ela considera imprescindíveis para melhorar a qualidade do transporte público: conforto e regularidade. “A gente passa muito tempo esperando o ônibus. É calor do lado de fora e aqui dentro. No meu carro, eu teria ar-condicionado e sairia a hora que quisesse”, afirmou a futura motorista.
O patamar desejado por Aline, João Paulo e outros milhares de usuários do transporte público já faz parte da vida do administrador de empresas Alexandre Tavares, motorista há 13 anos, foi com ele que pegamos uma carona na Avenida Antônio de Góes para continuar a viagem até o centro e saber o que precisa ser feito para ele fazer o caminho de volta para o transporte público.

“Precisa que melhore. Nosso serviço é ruim. Não há conforto, segurança e muito menos regularidade no horário das viagens. Não há como se programar”, reclamou.

Alexandre havia saído da casa dele, no bairro de Piedade, Zona Sul, em Jaboatão dos Guararapes, às 11h05, para um almoço no Derby com um colega. Parou para abastecer em um posto, onde pegamos a carona, e só conseguiu chegar ao seu destino por volta das 12h20. “Uma hora e quinze minutos. Quase o tempo de ir até João Pessoa”, criticou. E quem disse que no trânsito é possível se programar?