Bares nas ruas e calçadas: zero de acessibilidade

 

As calçadas já não são mais o limite. Insatisfeitos com o espaço interno dos bares e restaurantes, os donos dos estabelecimentos e os clientes, que antes já invadiam o passeio público, agora tomaram o meio da rua. Em época de confraternização, como é conhecido o mês de dezembro, as infrações dobram, segundo a Dircon. Ontem, esse tipo de comportamento podia ser visto em vários pontos da capital, inclusive em bairros considerados nobres.

Alheios a qualquer risco de serem vítimas de um atropelamento, os ocupantes de uma mesa do Bar Terraço, na esquina entre a Rua da Hora e a Barão de Itamaracá, no Espinheiro, bebiam divertidamente, na tarde de ontem, em plena via pública, ocupando um pedaço da rua. “Estou tão feliz que não pensei no perigo de atropelamento. Sei que esse cone realmente não me protege”, comentou uma das clientes, referindo-se a um cone colocado na rua pelos funcionários do bar.

O gerente do Terraço, que pediu para não ter o nome publicado, disse que só fazia aquele tipo de evento uma vez por ano. “É nossa confraternização, por isso coloquei as mesas e as cadeiras na rua”, explicou. Questionado sobre a licença da Prefeitura do Recife para usar a via pública, ele disse que tinha obtido autorização. Roberta Valença, da Diretoria de Controle Urbano (Dircon), no entanto, disse que em nenhum momento o órgão permite o fechamento de vias públicas a partir de um pedido particular de um bar. “Ofertamos licença apenas em casos de festas de rua, abertas ao povo”, esclareceu.

Na Rua Mamede Simões, no centro da capital, a situação era a mesma na tarde de ontem. Várias mesas e cadeiras de bares expostas em plena via pública. O espaço para a passagem de carros era mínimo. O endereço já é velho conhecido da Dircon que realiza blitz e, depois, os donos de bares voltam a utilizar a rua de forma particular. “Os donos dos outros estabelecimentos colocam as mesas na rua, então fazemos o mesmo”, disse o gerente do Puxinanã, Alexandre Duarte. Segundo Duarte, essa prática é corriqueira e os clientes apoiam. “Tem cliente que prefere ficar do lado de fora para fumar. Às vezes a gente liga o ar-condicionado e mesmo assim eles não querem ficar dentro”, disse. O gerente disse, ainda, que os donos de bar da via estão se mobilizando para apresentar uma solicitação à Dircon pedindo a liberação da rua para essa prática.

Proibição

Roberta Valença, da Dircon, disse que a colocação de mesas e cadeiras na rua é ilegal e pode ser punida com multa e até fechamento do estabelecimento. “Fazemos rondas todos os finais de semana e sempre alertamos para essa ilegalidade. Esse comportamento é cultural e o próprio cidadão deveria negar-se a sentar em bares e restaurantes que colocam as mesas na via pública”, alertou.

Ainda de acordo com a diretora da Dircon, o problema é comum na periferia do Recife, em bairros como Casa Amarela e Ibura, por exemplo. “Entendemos que o comércio é o meio de vida de algumas pessoas, mas é necessário obedecer a lei”, disse. Denúncias para a Dircon: 3355-2121.

Saiba mais

Irregularidades previstas na Lei das Calçadas, da Prefeitura do Recife

Obstruir ou concorrer, direta ou indiretamente, para a obstrução de valas, calhas, bueiros ou bocas de lobo ou impedir, por qualquer forma, o escoamento das águas pluviais

Utilização de marcos ou quaisquer tipos de barreiras físicas ou arquitetônicas nos passeios sem autorização do órgão competente

Despejo de águas pluviais ou de infiltração, água de lavagem, despejos domésticos e quaisquer outras águas servidas ou de esgotos sobre os passeios

Caixas de inspeção fora das especificações e/ou passeios danificados por concessionárias ou entidades a ela equiparadas
 
Colocar sobre a faixa exclusiva de circulação de pedestres, material de construção, mesas, cadeiras, banca ou quaisquer materiais ou objetos, quaisquer que seja a finalidade, excetuando-se os casos regulados por legislação específica, e, previamente autorizados pelo município

Passeio inexistente, em desacordo com as especificações ou em mau estado de conservação

Valor das multas

O valor da multa aplicada pela Dircon varia de acordo com a quantidade de mesas e cadeiras disponibilizadas na via pública

As multas custam entre R$ 100 e R$ 500

No caso de reincidência, o valor da multa é dobrado

As denúncias podem ser feitas para a gerência de apreensão da Dircon, no número 3355.2121

Fonte: Dircon

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calçadas ocupadas pelos ambulantes

Não basta apenas requalificar as calçadas, mas também garantir a sua livre circulação e acessibilidade. Não é o que acontece, por exemplo, com o entorno da Avenida Conde da Boa Vista, que teve os passeios requalificados com pisos intertravados. Mesmo assim, foi tomada por ambulantes, que comercializam os produtos em tabuleiros. A ocupação prejudica a circulação de pedestres que usam a faixa de rolamentos para trafegar. Não precisa nem dizer que o comércio no local é de produtos piratiados.

Multa pesada para quem não cuidar das calçadas, em São Paulo

 

 

Pelo menos no Recife a ideia não vingou, mas em São Paulo a proposta é aplicar multas pesadas para o proprietário que não cuidar das calçadas. O conceito é o mesmo de que o imóvel é particular. Quem não cuidar da própria calçada vai pagar caro por isso. Vale para qualquer
dono de casa e de apartamento. E para órgãos públicos também.

Na capital paulista, a nova lei vai mudar o valor da multa para as calçadas com problemas. Antes, esse valor era determinado pelo tamanho do estrago. Mas agora o que importa é a largura da fachada do imóvel são R$ 300 por metro. Uma casa com cinco metros de frente, por exemplo, pagará R$ 1.500 de multa -seja qual for a irregularidade na calçada.

Essa lógica, no entanto, é contestada por muitos urbanistas que consideram a calçada um equipamento vital dentro da estrutura da mobilidade urbana. O que se questiona, por exemplo, é porque se investe em viadutos e pontes para os carros e não pode fazer o mesmo para o pedestre?

 

Acessibilidade não acessível: Ensaio sobre a cegueira nas ruas do Recife

Segunda matéria sobre a série acessibilidade não acessível. Aqui o deficiente visual Júlio Tabosa mostra as dificuldades de circulação em um trecho “tecnicamente” acessível. Matéria publicada no dia 03 de agosto de 2009.

 

 

Tânia Passos

taniapassos.pe@dabr.com.br

Um teste simples de equilíbrio. Ficar de pé com uma perna só e abrir os braços. Tente fazer o mesmo de olhos fechados e irá perceber o grau maior de dificuldade, mesmo sem sair do lugar. Imagine então andar pelas ruas da cidade sem ter a mínima ideia de onde está pisando e o que vai encontrar pela frente.

Segundo o censo do IBGE de 2000, em Pernambuco eram mais de 900 mil deficientes visuais, dos quais cerca de 9.340 eram cegos e 146 mil tinham uma grande dificuldade permanente de enxergar. Estes dois últimos grupos estão à mercê das inúmeras barreiras que dificultam a acessibilidade.

Sejam buracos, orelhões, árvores e as temíveis bocas de lobo. Reduzir o abismo que separa a acessibilidade plena da realidade das ruas é um dos desafios dos gestores públicos e de todos nós.

Foi aos 19 anos que Júlio Tabosa, hoje com 52, perdeu a visão. Ele chegou a passar cinco anos trancado dentro de casa com medo do mundo. Mas decidiu ir à luta. Fez um curso de locomoção na Associação Pernambucana dos Cegos (APEC).

Hoje preside a Associação Beneficente dos Cegos de Pernambuco, uma casa de apoio aos cegos do interior do estado, na Estrada dos Remédios, no bairro de Afogados.

Para se deslocar na área urbana, utiliza o transporte público. Sem nenhum tipo de ajuda, Júlio concordou em fazer uma espécie de “ensaio sobre a cegueira” pelas ruas do Recife. E assim como no romance do escritor português José Saramago, ele sabe que é preciso confiar no outro

“Por mais que o cego aprenda a caminhar sozinho pelas calçadas, precisa confiar nas pessoas. Seja para pegar o ônibus certo ou atravessar o semáforo. Sempre aparece alguém para ajudar, mas há também os que dão informação errada. Se possível, é melhor confirmar com mais de uma pessoa e confiar”, ressaltou.

O ensaio pelas ruas teve início no Corredor Leste-Oeste, uma das mais recentes e importantes obras do município no sistema viário da cidade contemplada com acessibilidade.

O mesmo local onde o cadeirante Edvaldo Gonçalves, da primeira matéria da série, já havia apontado dificuldades nas rampas do entorno da Praça do Derby e na falta de continuidade dos acessos. Júlio iniciou sua caminhada no mesmo ponto da praça.

E assim como ensina o manual de locomoção para cegos, procurou a linha do canto esquerdo da calçada e seguiu em frente com a segurança de quem parece enxergar tudo.

Poucos metros à frente, o primeiro obstáculo. Um banco de concreto em um espaço que deveria estar livre. Mesmo com a bengala, quase tropeçou. Um susto para quem observa e só mais uma barreira para Júlio contornar e seguir em frente. Dessa vez, um pouco mais pela direita, pois já não parecia tão certo de que o caminho à sua esquerda estivesse livre.

Encontrou pela frente um orelhão, sem sinalização no piso. A batida foi inevitável. Mais na frente, ao lado de uma parada de ônibus, mais dois orelhões. Um ao lado do outro. Júlio tentou livrar o primeiro, mas esbarrou.

Ele contornou pelo lado contrário e deu de cara com o segundo. Foram três orelhões e três batidas emuma mesma calçada. Um sofrimento desnecessário se a acessibilidade tivesse sido respeitada. E o mais grave, em um espaço que em tese já recebeu ações e investimentos para esse fim.

As barreiras nas calçadas não são o maior temor dos cegos. O principal inimigo deles são as bocas de lobo, verdadeiros precipícios que surgem do “nada” pelo caminho. Uma lição que Edson José de Amorim Oliveira, 18 anos, já aprendeu. “Certa vez eu caminhava pela Avenida Guararapes com uma colega cega e caí em uma boca de lobo. Ela me ajudou a sair. É difícil encontrar um cego que não tenha sido vítima de uma boca de lobo”, revelou.

A preocupação é tanta que Edson faz um apelo desesperado. “Se não fizessem nada em acessibilidade e tapassem todas as bocas de lobo nós nos sentiríamos mais seguros”, desabafou o jovem, que chega ao extremo de exigir tão pouco quando tem o direito legítimo a tudo.

Remoção – Em nota, a Secretaria de Serviços Públicos da Prefeitura do Recife informou que os orelhões da praça vão receber pisos táteis e que os técnicos da Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) vão estudar uma forma de sinalizar os bancos das calçadas.

Especialista em acessibilidade, a arquiteta do Crea Ângela Carneiro tem outra sugestão. “A solução é remover os bancos da calçada. Eles podem ficar no interior da praça, mas não na calçada que deve estar livre de obstáculos”, explicou. 

 

Calçadas esburacadas e cadeirantes reféns

Vídeo mostra a dificuldade de uma mãe para levar a filha cadeirante a uma escola, por causa das péssimas condições das calçadas. A cena é em São Paulo, mas bem que poderia ser no Recife.

Quando será que o poder público vai entender que precisa assumir a responsabilidade dos passeios? Se um terço da população da Região Metropolitana do Recife se desloca a pé porque o direito a essa Mobilidade é ignorada. Carros ganham vias pavimentadas, túneis e viadutos, enquanto os pedestres e cadeirantes são deixados em último plano.

De quem é a culpa por uma calçada inacessível?



Movido pela indignação e sentimento de cidadania, o arqueólogo Paulo Tadeu de Albuquerque me enviou fotos que registram as péssimas condições da calçada, que abriga a mais importante parada de ônibus da Rua Joaquim Nabuco, nas Graças, onde todas as linhas para a Zona Oeste param e passam por ela.

Segundo o relato de Paulo Tadeu, a parada fica junto ao laboratório CERPE e à Faculdade Maurício de Nassau. Além disso, ela é a única parada que atende aos cegos do Instituto dos Cegos do Recife, situado a menos de 100 metros.

“Diariamente e a qualquer hora se assiste ao triste espetáculo de ver esses seres humanos especiais se prostrarem ao chão”, lamentou o arqueólogo.

Ele conta ainda que contactou a Empresa de Manutenção e Limpeza do Recife (Emlurb), o Governo do Estado, o laboratório CERPE e a Faculdade Maurício de Nassau. Ninguém, no entanto, se sentiu na obrigação de resolver.

“Eles dizem que a responsabilidade é  do número 600 dessa rua”, revelou. Talvez seja mesmo  mais fácil lavar  as mãos. A legislação atual do município estabelece que a manutenção das calçadas está sob a responsabilidade do proprietário do imóvel.

Mas também determina, que se o proprietário não o fizer, o municípioexecuta a manutenção necessária e cobra em forma de imposto. Na prática, isso não vem sendo feito, mas vale ressaltar que o município tem sim responsabilidade.

Já em relação às condições da parada de ônibus, cabe ao Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano oferecer condições dignas e isso se traduz também no quesito acessibilidade.

Em relação à faculdade e ao laboratório, que se beneficiam diretamente com o passeio, poderiam colaborar, mas nesse caso, não seriam obrigados. A responsabilidade social é uma questão de consciência, ou se tem ou não. E ao proprietário do nº 600, alguém sabe de quem se trata? Ele, claro não fica de fora.

 

O X da mobilidade

 

A mobilidade urbana talvez seja hoje um dos temas mais importantes dentro da estrutura das cidades. E isso acontece por uma razão simples: as pessoas precisam se deslocar de forma segura e confortável para ter acesso aos serviços, lazer, centros de compras ou apenas o direito de ir e vir.
Essa preocupação que se faz mais evidente hoje é relevante devido ao crescimento desordenado das cidades e do aumento, sem freios, da frota de veículos. Que pedaço  cabe a cada um de nós?

A discussão ganha contornos mundiais por se tratar de um problema que afeta a todos, desde as condições das vias, das calçadas, da qualidade do transporte público, do espaço ocupado pelo transporte individual, seja motorizado ou não.

No caso da Região Metropolitana do Recife, o desafio da mobilidade envolve um entendimento metropolitano com soluções que não podem ser isoladas. Começamos hoje uma caminhada virtual no sentido de ampliar as discussões, apontar problemas, soluções e criar um canal de comunicação entre aqueles que buscam uma mobilidade urbana e necessária. Sejam bem vindos!

Multa para quem não cuidar das calçadas

 

Não sei se lá em São Paulo eles exageram na dose, mas tudo que for pelo bem das calçadas tem algo de positivo. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, acaba de sancionar uma lei que, além de aumentar a área mínima do passeio de 90 centímetros para 1,20 metros, ainda aumentou o valor da multa para quem não cumprir a legislação. E a multa também ficou mais salgada.

Na capital paulista, a multa passa a ser de R$ 300 por metro linear de calçada danificada. Antes, ela não ultrapassava o valor de R$ 510, mesmo em áreas de grandes dimensões.

O problema dessas leis é a aplicabilidade delas. No Recife, a Lei de Calçadas, aprovada desde 2003, não conseguiu reverter a situação dos passeios. Nem mesmo nas calçadas de órgãos públicos. É quase tentador acreditar que tudo pode ficar perfeito, por decreto, mas na prática a realidade é bem mais complexa.

Há urbanistas que defendem o estímulo de impostos para a conservação dos passeios por parte dos proprietários. Pode ser uma alternativa. Outros, afirmam que o espaço das calçadas é de uso público e, portanto, a responsabilidade é dos órgãos públicos, da mesma forma que as vias têm investimentos para os carros. Confesso que acho este último raciocínio mais pertinente.

Se levarmos em conta que são investidos milhões na construção de viadutos e rodovias e para as calçadas nada. Na verdade, ninguém se sente responsável por elas. E, pensar que só aqui na Região Metropolitana do Recife a estimativa é que um terço da população, ou seja, mais de um milhão de pessoas se desloca a pé é, no mínimo, razoável para não dizer obrigação, apostar na melhoria dos passeios.

E só para não perder a oportunidade dêem uma olhada nas calçadas do centro de Bogotá, um exemplo de acessibilidade em um país da América Latina, que não chega nem perto da situação econômica do Brasil.