O metrô do Recife já perdeu 12 mil usuários em 2015

 

Tarifa do metrô do Recife custa R$ 1,60 desde 2012 e é a menor do país. Foto Alexandre Gondim DP/D.A.Press
Tarifa do metrô do Recife custa R$ 1,60 desde 2012 e é a menor do país. Foto Alexandre Gondim DP/D.A.Press

No ano em que o metrô do Recife completa três décadas de operação, o principal modal de transporte de massa da Região Metropolitana passa por sua maior crise: a falta de confiança dos passageiros em relação à segurança nos trens. Assaltos, furtos, quase diários, e até mortes acenderam um alerta na direção da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), que fez um reforço de sessenta seguranças terceirizados para conter a onda de medo. O desafio é restabelecer a confiança no sistema e trazer de volta parte dos usuários que está deixando o metrô.

Metrô Recife - Arquivo/DP
De dezembro do ano passado até agora, houve uma queda no número de passageiros de até 3% de um universo de quase 400 mil, o que significa cerca de 12 mil pessoas. Sem pesquisa de satisfação, a CBTU ainda não sabe mensurar se a redução se deu por questões econômicas ou de falta de segurança. Mas, na prática, não é difícil encontrar usuários que só usam o metrô por não ter outra opção ou de passageiros que já começam a mudar a rotina das viagens para evitar o trem.

Estação Werneck do metrô, Linha Centro, Recife - Foto Guilherme Veríssimo DP/D.A.Press
Estação Werneck do metrô, Linha Centro, Recife – Foto Guilherme Veríssimo DP/D.A.Press

Morando quase em frente à estação Aeroporto, na Zona Sul do Recife, a dona de casa Maria Santiago, 42 anos, decidiu não usar mais o modal. “Agora só ando de ônibus. Fiquei assustada depois desses casos de violência”, revelou. Somente com o marido, o militar David Santiago, 42 anos, ela aceitou ir ao Centro de metrô na última quarta-feira. “Ela não queria vir de Metrô de jeito nenhum. Só aceitou porque veio comigo”, completou Santiago.

A direção do metrô reconhece o problema e as dificuldades, mas já adiantou que não tem como resolver essa questão sem ajuda. O pedido de socorro já foi feito ao governo do estado no sentido de uma parceria com a Polícia Militar nas 12 estações de integração do Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano, que integra o ônibus com o metrô.

Para a CBTU, as integrações são a principal porta de entrada do comércio informal na área interna do sistema. A direção da empresa também acredita que muitos dos assaltantes entram disfarçados de ambulantes. “Fica difícil fazer a distinção e esse tipo de comércio dentro do metrô também não é permitido. Mas não há como nossos seguranças fazerem um embate direto e tomar a mercadoria. A polícia tem que estar presente”, afirmou o engenheiro da CBTU-PE, Bartolomeu Carvalho. O acordo vem sendo negociado nas duas esferas de governo, mas ainda sem definição.

Para o professor de engenharia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fernando Jordão, especialista em transporte ferroviário, a situação do metrô do Recife é preocupante. “O que está acontecendo com o metrô do Recife é um problema de segurança pública. É lamentável que um sistema tão importante para a população esteja se preocupando com segurança e não em melhorias do serviço”, criticou o professor. No ano passado, o Sindicato dos Metroviários realizou três paralisações para protestar contra a falta de segurança não apenas para os usuários, mas também dos trabalhadores.

Metrô Recife - Foto Annaclarice Almeida DP.D.A/Press
Metrô Recife – Foto Annaclarice Almeida DP.D.A/Press

Déficit na receita dificulta operação

O metrô do Recife trabalha com déficit de mais de 70% no orçamento anual. O serviço é bancado pelo governo federal, que aplica por ano cerca de R$ 300 milhões. A única fonte de renda vem da venda de bilhetes. A receita anual com passagens é de cerca de R$ 66 milhões e representa pouco mais de 24% na cobertura das despesas.

De acordo com o engenheiro da CBTU-PE, Bartolomeu Carvalho, é preciso um esforço dos três níveis de governo para ajudar o modal a se manter, principalmente com a tual crise econômica. “O metrô, mesmo pertencendo ao governo federal, trabalha para o estado. Hoje, metade das pessoas que usam o metrô não paga nada. E não temos nenhum tipo de subsídio”, aponta Carvalho.

Ele compara, por exemplo, o metrô do Rio de Janeiro, que é privado e tem isenção no ICMS (Imposto de Circulação de Mercadoria e Serviço) sobre a energia. “A energia é onde está o nosso maior custo. Pagamos por ano R$ 26 milhões e se tivéssemos isenção no imposto, haveria uma economia de 25% nesse valor”, revelou Bartolomeu.

Além de não oferecer isenção, o governo do estado, por meio do Consórcio Grande Recife, órgão gestor do Sistema de Transporte Público de Passageiros, não repassa, desde 2012, o valor referente ao cartão VEM. A dívida já ultrapassa os R$ 30 milhões. “É um dinheiro que nos faz muita falta. Infelizmente tivemos que colocar essa causa na justiça”, afirmou Carvalho. Por nota, o consórcio disse reconhecer parte da dívida, mas não informou qual o valor é reconhecido.

E para piorar a receita, o metrô tem a menor tarifa do país: R$ 1,60, a mesma desde 2012. “Acredito que a população poderia ajudar caso o bilhete fosse do mesmo valor da tarifa A do ônibus de R$ 2,45”, sugeriu Fernando Jordão da UFPE.

Fonte; Diario de Pernambuco

O metrô do Recife e a privada

 

Estação Werneck do metrô, Linha Centro, Recife - Foto Guilherme Veríssimo DP/D.A.Press
Estação Werneck do metrô, Linha Centro, Recife – Foto Guilherme Veríssimo DP/D.A.Press

A paralisação do metrô, no último final de semana, a partir de uma decisão dos próprios funcionários do sistema que se recusaram a trabalhar por causa da falta de segurança, chama atenção para um grave problema no transporte público: o vandalismo das torcidas dos times pernambucanos. Os trens e as estações do sistema foram alvo de ataques de vândalos. Até pedras foram arremessadas contra os veículos. Pelo menos dessa vez, não lançaram nenhuma privada. Em maio do ano passado, uma pessoa morreu ao ser atingida por privada lançada da arquibancada no estádio do Arruda.

Não por acaso, a violência das torcidas tem trazido intranquilidade aos trabalhadores do metrô. E não apenas a eles, os ônibus também são alvo da fúria de torcedores nos dias de jogo. A Avenida Conde da Boa Vista, por exemplo, tem sido um verdadeiro saco de pancadas. E quem responde por isso? A propagação da violência encontra espaço, onde a punição é artigo de luxo.

Uma vez ouvi de um consultor em trânsito, que segurança não é um problema do transporte público, mas sim uma questão de polícia. Parece lógico, mas não há como a polícia estar presente em todas as estações, paradas, ônibus e trens. É impossível garantir esse tipo de segurança. As empresas também precisam oferecer segurança própria e dispor de uma forma mais eficaz para se comunicar com a polícia, sempre que necessário.

No final de semana passado, a Secretaria de Defesa Social (SDS) chegou a apresentar um plano de segurança com 68 policiais para fazer a segurança no metrô e não foi suficiente.O Sindicato dos Metroviários chamou atenção para o fato dos policiais não terem sido posicionados nas estações. Isso talvez possa ser melhorado, mas o fato é que há uma insegurança no sistema não apenas para os trabalhadores, mas também para os usuários. A mudança só será sentida quando a punição passar a ser encarada na medida da responsabilidade de quem a pratica, assim como a prisão dos que lançaram a privada matando uma pessoa.