Quando a lei não vale para todos

 

Sem legislação, as cinquentinhas circulam impunes no Recife Foto - Paulo Paiva DP/D.A.Press
Sem legislação, as cinquentinhas circulam impunes no Recife Foto – Paulo Paiva DP/D.A.Press

Uma média de 40 mil multas é aplicada por mês no trânsito do Recife. Pode parecer muito, mas em um universo de cerca de um milhão de veículos, o mais provável é que um grande volume de infrações passe despercebida. Além dos motoristas de carros, ônibus, caminhões e motos que escapam da fiscalização, muitos outros recifenses estão longe de ser multados, por falta de regulamentação ou legislação específica, apesar de previstas no Código de Trânsito Brasileiro.

Distância entre as faixas de pedestre dificulta travessia Foto Paulo Paiva DP/DA.Press
Distância entre as faixas de pedestre dificulta travessia Foto Paulo Paiva DP/DA.Press

Fazem parte dessa lista os veículos ciclomotores (cinquentinhas), as carroças com tração animal – a lei municipal ainda não foi regulamentada – e até mesmo pedestres e ciclistas, por vezes na contramão da legislação por falta de educação de trânsito ou de infraestrutura viária.

Multar pedestres pode parecer piada, mas está previsto no código. O artigo 24 normatiza a competência dos órgãos e entidades executivas para planejar, regulamentar e operar o trânsito do pedestre. No Brasil, nenhum município fez isso ainda. Talvez precisem oferecer antes as condições necessárias de travessia.

Um dos obstáculos é a distância entre as faixas ou semáforos de pedestre. Há casos no Recife, como a Avenida Domingos Ferreira, em que faixas ficam 1 km uma da outra. Não por acaso, uma pessoa é atropelada por dia na cidade. Em 2013, foram registrados 398 atropelamentos, média de 33 acidentes por mês.

Os ciclistas também são passíveis de multa. Não é difícil encontrá-los na contramão. Mas assim como no caso dos pedestres, falta regulamentação municipal. Para a Associação Metropolitana dos Ciclistas do Grande Recife (Ameciclo), a discussão deve ocorrer posteriormente à melhoria nas condições de circulação.

“É preciso discutir parâmetros equivalentes. Motoristas recebem treinamento, fazem testes e dispõem de uma infraestrutura viária. O ciclista não tem nada disso. Seria uma atitude injustificável”, diz Daniel Valença, coordenador da Ameciclo.

Para a presidente do Conselho Estadual de Trânsito (Cetran-PE), Simíramis Queiroz, a regulamentação nos municípios precisa ser acompanhada de trabalho educativo. “É importante que os municípios promovam campanhas entre ciclistas e pedestres, uma vez que não há tradição no Brasil de aplicar multas, mesmo previstas no Código.”

Lei que impede a circulação de carroças de tração animal nas vias do Recife, ainda não foi regulamentada Foto - Paulo Paiva DP/D.A.Press
Lei que impede a circulação de carroças de tração animal nas vias do Recife, ainda não foi regulamentada Foto – Paulo Paiva DP/D.A.Press

Livres de multa estão também os carroceiros de tração animal. A lei municipal aprovada em 2013 não foi regulamentada. Um dos princípios da legislação é proteger os animais de maus-tratos. Já as cinquentinhas, sem legislação específica, são as que oferecem maior risco de acidentes. Apesar disso, muitos circulam nelas sem capacete e nem medo de serem flagrados.

Multa para pedestres ainda depende de regulamentação

As regras de trânsito não se aplicam apenas aos motoristas. Os pedestres que descumprem as normas estabelecidas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) também estão sujeitos a multas e autuações. O problema é que embora essa penalidade esteja prevista em lei, na prática ela ainda não se aplica. Isso porque há 14 anos, desde quando o CTB foi instituído, os órgãos que atuam no controle de trânsito aguardam uma regulamentação por parte do Contran (Conselho Nacional de Trânsito) sobre a forma como será aplicada a autuação de pedestres que descumpram as proibições estabelecidas na Lei Federal 9.503, de 23 de setembro de 1997.

De acordo com o artigo 254 do CTB, os pedestres são proibidos de permanecer ou andar na pista de rolamento; andar fora da faixa própria ou cruzar pistas de rolamento em viadutos, pontes e túneis; atravessar a via dentro das área de cruzamento; utilizar a via em agrupamentos capazes de perturbar o trânsito, e desobedecer à sinalização de trânsito específica. As exceções valem apenas nos casos onde existe uma permissão específica em relação a essas restrições. A multa prevista para quem desobedecer essas proibições corresponde a 50% do valor da infração de natureza leve, o que corresponde a R$ 26,60.

Segundo a Urbes – Trânsito e Transporte, que é o órgão responsável pela fiscalização e aplicação de multas dentro dessa modalidade de infração, nenhum pedestre foi autuado em Sorocaba pelos agentes de trânsito porque até o momento o Contran não regulamentou a forma como ela será aplicada, não possibilitando a realização dessa autuação.

O engenheiro de Trânsito, Adalberto Nascimento, reconhece que a aplicabilidade da legislação no que se refere à multa de pedestres é muito complicada e é justamente por esse motivo que ainda hoje não foi regulamentada. Além dos custos operacionais para a emissão da multa, que não seriam cobertos pelo valor cobrado, ele afirma que a forma de abordagem e identificação do infrator, inclusive com o endereço para o envio da multa, seriam inconsistentes. “A não ser se cada pessoa tivesse um chip de identificação, mas o custo desse sistema seria ainda maior e completamente fora da realidade do nosso país”, comenta.

Campanhas educativas

Na avaliação do engenheiro, a educação para a o trânsito ainda é o caminho mais eficiente e barato para se reduzir o número de acidentes no trânsito. Mas para que isso ocorra, ele afirma, é preciso que esse trabalho não se limite a campanhas pontuais, como acontece com a Semana do Trânsito. “A educação para o trânsito deveria ser uma disciplina escolar, como já acontece em outros países, pois assim se cria uma cultura desde a infância de que essas regras devem ser respeitadas, tanto da parte do motorista quanto do pedestre”.

Nascimento afirma que embora muitos projetos de tráfego urbano contemplem todos os dispositivos de segurança para proteger o pedestre, como passarelas, faixas e semáforos, nem sempre eles são utilizados adequadamente. Como exemplo disso, ele cita os casos de atropelamentos ocorridos em rodovias, como na Raposo Tavares, em que pedestres são atropelados ao tentarem cruzar a pista. Outro ponto defendido por Adalberto Nascimento é que as campanhas de conscientização passem a mostrar imagens reais dos efeitos da imprudência no trânsito, tanto de pedestres como motoristas, para que as pessoas possam ser impactadas e passem a adotar uma postura mais preventiva.

A Urbes – Trânsito e Transportes informou que mantém campanhas de educação para o trânsito que incluem a orientação dos pedestres sobre a importância de realizar uma travessia segura. “A recomendação é de atenção, seja para pedestres ou condutores e, notadamente para condutores, que respeitem o limite de velocidade estabelecido, bem como para que evitem avançar o sinal de parada”, esclarece a Urbes em nota.

Pedestres reclamam

Apesar da ausência de regulamentação na aplicação de multas para pedestres, a maioria das pessoas afirma estar ciente das normas que devem ser obedecidas por quem caminha no trânsito e que procura seguir, mas que isso nem sempre é recíproco por parte os motoristas. A dona de casa Creuza de Campos, 65 anos, garante que sempre procura as faixas de pedestres ou um local seguro para atravessar a rua. Mas diz que, ainda assim, fica um pouco insegura ao atravessar o semáforo, mesmo quando ele fica vermelho para o tráfego de veículos. “Eu espero todos os carros pararem antes de atravessar, pois já vi muitos carros e motos avançarem mesmo com o sinal fechado”. Mas ela reconhece que muitas pessoas também abusam se arriscando nas travessias das ruas.

O aposentado José Carlos de Oliveira Machado, 58 anos, considera que o problema maior no trânsito é que as pessoas quando estão dirigindo esquecem que também são pedestres em muitas situações. “Se cada um fizesse a sua parte, certamente o número de acidentes reduziria bastante”. Como motorista, ele garante que procura ter esse comportamento que espera de outros condutores quando está caminhando pelas ruas. Ele não considera, porém, que a melhor solução não é a multa. “Já temos multas demais.”

Embora tenha conhecimento das infrações previstas por lei para os pedestres, a dona de casa Maria Aparecida Gomes, 39 anos, acredita que o maior problema que observa no trânsito da cidade ainda é a falta de respeito dos motoristas nas travessias de pedestres. Ela conta que tirou a sua habilitação quando morava na Espanha e fica impressionada com a diferença de comportamento no Brasil. “Na Espanha os motoristas são obrigados a parar na faixa de pedestre, mesmo quando não existe semáforo, além de dar preferência na passagem para os pedestres em cruzamentos”, cita. Quando está na direção, Maria diz que tenta seguir essas regras, mas que nem sempre consegue, pois corre o risco de ter a traseira do seu carro atingido por quem vem atrás. “Infelizmente é uma questão de comportamento coletivo que precisa ser revisto”, reclama.

Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul (Via Portal do Trânsito)

Denatran regulamentará utilização de bicicleta elétrica

 

O Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) vai apresentar, até o fim do mês, um conjunto de normas para regulamentar a utilização de bicicletas elétricas em todo o País. A expectativa é de que as novas regras permitam que os veículos trafeguem em ciclovias e que seus condutores não precisem de habilitação específica. A nova regulamentação deve entrar em vigor antes da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável a Rio+20.

De acordo com a proposta estudada pelo Denatran, os veículos com velocidade de até 20km/h e com motor de até quatro quilowatts de potência serão enquadrados em normas específicas de circulação. A decisão de definir novas regras em âmbito nacional foi tomada após uma reunião, na última terça-feira, entre a direção do Denatran e representantes do governo estadual e da Prefeitura do Rio de Janeiro.

No esboço das novas regras, também foi discutida a permissão do tráfego dos veículos pelas ciclovias, e a isenção da necessidade de licenciamento ou emplacamento. Os usuários de bicicletas elétricas também poderão circular sem habilitação específica e sem o risco de serem abordados por agentes da Lei Seca, como aconteceu com um ciclista no Rio, no final do mês de abril.

Para Fernando Avelino, diretor do Detran do Rio, a conferência Rio+20 e o debate sobre sustentabilidade foram argumentos que sensibilizaram a direção do Denatran para a aprovação de uma nova regulamentação. “A gente tinha que chegar na Rio+20 com essa questão equacionada. Todos nós somos favoráveis à regulamentação correta e também ao meio ambiente, e essas bicicletas vão ao encontro desses interesses de sustentabilidade”.

A decisão foi comemorada por ativistas da mobilidade sustentável. “Se as bicicletas elétricas representam a diminuição significativa do fluxo de trânsito, incentivam as pessoas a usarem mais as bicicletas e favorecem um investimento maior na malha de ciclovias, pelo aumento da demanda, então isso só tem a trazer benefícios. A discussão jurídica é ínfima perto desses benefícios”, afirmou Fred Sampaio, do movimento carioca Respeite Um Carro a Menos.

As regras definitivas ainda estão sendo estudadas por uma comissão do Denatran, que avalia uma forma de definir as novas regras sem ferir o Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Pela atual legislação, qualquer modelo de bicicleta elétrica é classificado como veículo ciclomotor, que precisa de emplacamento e habilitação específica. Além disso, os condutores são obrigados a usar capacetes e roupas especiais sob pena de multa e apreensão do veículo e da carteira de habilitação.

A polêmica sobre a regulamentação das bicicletas levou a Prefeitura do Rio a publicar um decreto equiparando os modelos elétricos às bicicletas tradicionais, de propulsão humana e gerou controvérsia entre a prefeitura e o Denatran. Na última semana, a Prefeitura de São Paulo também anunciou que a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) estuda quais medidas adotará para regulamentar o uso dos veículos.

Fonte: Agência Estado (via Portal do Trânsito)

Ciclista: livres para infrigir

Ciclista na contramão e transportando duas crianças

Tânia Passos
taniapassos.pe@dabr.com.br

Na escala da mobilidade, o ciclista é o segundo mais importante. Só perde para o pedestre. A defesa pelas ciclovias é uma das principais bandeiras quando o assunto é integração dos modais e melhoria do tráfego. Mas há um aspecto que precisa ser visto com preocupação: as infrações dos ciclistas. Sempre ignorado nas políticas de mobilidade, o ciclista, em geral, não se sente integrante do sistema de mobilidade e ignora as leis de trânsito criando regras próprias. Como o transporte não é regulamentado pelo município, não há como aplicar multa e eles ficam livres para infrigir.

De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, os veiculos não motorizados devem se adequar às normas de circulação dos veículos motorizados, mas cada município deve fazer sua regulamentação. “Aqui em Pernambuco nenhum município regulamentou as normas de circulação dos veículos não motorizados. Sem o instrumento do licenciamento não há como aplicar a multa”, explicou a presidente do Conselho Estadual de Trânsito (Cetran), Simíramis Queiroz.

Seja por falta de punição, descuido ou conhecimento, o fato é que o trânsito das bicicletas na cidade é confuso e arriscado. E para piorar não há ciclovias ou ciclofaixas suficientes para pemitir uma melhor mobilidade por parte do ciclista. “No caso de não haver ciclovia, o ciclista tem que trafegar na via de acordo com as normas, mas muitos pedalam na contramão”, afirmou a presidente do Cetran. A estudante Jéssica Lima, 19 anos, conta que já foi atropelada por uma bicicleta em plena faixa de pedestre. “Alguns não param quando o sinal fecha e o pedestre acaba sendo vítima. Isso já aconteceu comigo”, revelou.

Ciclista ignora o sinal vermelho da ciclovia

Durante quase duas horas, o Diario acompanhou o tráfego na Avenida Boa Viagem e constatou que os ciclistas ignoram o sinal vermelho na ciclovia, sem nenhuma hesitação. “Se não tiver pedestre passando na faixa, eu não paro”, admitiu o ciclista Cleonildo da Silva, 34 anos, porteiro. Ele mora no Ibura e trabalha em Boa Viagem. A bicicleta é o seu meio de transporte. “Eu não vou dizer que cumpro todas as normas de trânsito de minha casa até o trabalho. Os carros não respeitam o ciclista e, em alguns casos, a gente tem que se defender, mesmo que seja errado”, justificou.

Pedalar na contramão, aliás, deixou de ser exceção há muito tempo. Flagrar esse tipo de irregularidade é fácil. Na Avenida Jaime da Fonte, no bairro de Santo Amaro, onde há duas vias largas nos dois sentidos, é comum encontrar ciclistas circulando pela contramão. Foi lá que encontramos a dona de casa, Sandra Maria Cabral Cavalcanti, 45 anos, transportando os dois netos em uma bicicleta pela contramão. Um neto no bagageiro e outro dentro de uma caixa no quadro da bicicleta, o que também não é permitido.  “É o único transporte que eu tenho, mas vou ter mais cuidado para não ir pela contramão”.  Apesar dos riscos, ela conta que nunca sofreu um acidente.

 

Desprovidos de segurança

Enquanto transporta um dos netos em uma caixa no quadro da bicicleta, a dona de casa Sandra Maria Cabral, que circulava na contramão, também ignora outras normas de segurança, inclusive para ela mesma. De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), entre os equipamentos de segurança, a bicicleta deve dispor de campainha, sinalização noturna e espelho retrovisor do lado esquerdo. A bicicleta dela não dispõem de nenhum desses equipamentos e para piorar, ela também pedalava de chinelo. “Essa é a bicicleta que eu tenho e aqui eu consigo levar juntos os meus netos”, afirmou.

A incoerência é que os ciclistas, que mais usam a bicicleta como meio de transporte, são, talvez, os que dispõem de menos equipamentos de segurança. É o caso do ciclista Amaro Barbosa Farias, 53 anos, ambulante, que mora em Peixinhos e trabalha na Estação Central do Metrô Recife. “Eu venho para o trabalho todos os dias de bicicleta e gasto menos tempo do que se viesse de ônibus”, comemorou. A bicicleta dele, no entanto, é quase um atentado à segurança. Para começar não tem freio e nenhum tipo de sinalização, mesmo ele fazendo percurso noturno. “Eu circulo pela Agamenon e PE-15 para chegar em casa. É perigoso e já sofri um acidente uma vez, mas é o meu transporte”, afirmou.

 

 

 

Regulamentação para manobristas e flanelinhas

 

 

 

No Paraná, o deputado estadual, Mauro Savi (PR), quer aprovar um projeto para regulamentar o serviço de manobrista e do guardador de veículo, também conhecido como flanelinha, pelo menos por essas bandas. O objetivo do projeto é atribuir responsabilidades aos prestadores desses serviços e segurança para quem necessita deles.

O projeto propõe ainda que a empresa prestadora desse tipo de serviço tem que ser regularmente constituída, ter em seus quadros motoristas devidamente registrados e habilitados e ainda possuir local adequado e seguro para o estacionamento dos veículos. Utopia?

No caso da Região Metropolitana do Recife para essa lei ser aplicada, seria necessária que outra já estivesse sendo cumprida: que os estabelecimentos oferecessem estacionamento de acordo com a demanda.

Um detalhe básico, que não pode ser esquecido, é que tudo acaba acontecendo na rua. Até mesmo os serviços das empresas com manobristas deixam os carros são estacionados em vias públicas, dificilmente em estacionamentos privados. O mesmo se aplica aos guardadores de veículos. Os flanelinhas de todos os dias.