De janeiro a março, 122 crianças e adolescentes sofreram violência sexual no Grande Recife

Dados alarmantes sobre exploração sexual de crianças e adolescentes no Grande Recife foram divulgados nesta terça-feira durante o lançamento da campanha do dia 18 de maio, que trata justamente desse tema. O evento foi realizado na sede do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, no bairro das Graças, e contou com a presença de diversos atores no combate ao abuso e exploração sexual.

Este ano, considerando a situação da Rede de Proteção no atendimento às situações de Violência Sexual, a campanha tem como tema “Fortalecimento da Rede de Proteção para o Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes: Proteger é coisa nossa”. De janeiro a março deste ano, 122 crianças e adolescentes sofreram abuso sexual.

Entidades temem que exploração aumente na Copa do Mundo. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press
Meninas são as maiores vítimas dos abuso sexuais. Foto: Blenda Souto Maior/DP

O objetivo é comprometer a sociedade e o poder público no que se refere à necessidade de pautar a temática dessa violência, assim como primar pelo aperfeiçoamento e fortalecimento da Rede de Proteção, considerando a estruturação dos equipamentos e qualificação do atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. A coordenação da Rede de Enfrentamento apresentou as peças publicitárias que foram produzidas para a campanha e informou as atividades que serão realizadas para celebrar a data.

Mas o que mais chamou a atenção dos presentes foi a apresentação dos dados revelados pelo delegado Ademir de Oliveira, gestor da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Segundo o policial, nos três primeiros meses deste ano, apenas nas quatro DPCAs que existem no Grande Recife, foram registrados 122 casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes. “Isso não representa nem 10% da quantidade real, porque muitos casos não são denunciados à polícia”, alertou Ademir de Oliveira.

Dados foram revelados na manhã desta terça-feira. Foto: Wagner Oliveira/DP
Dados foram revelados na manhã desta terça-feira. Foto: Wagner Oliveira/DP

De todos os casos ocorridos, seis vítimas tinham entre 14 e 17 anos. As outras 116 vítimas sofreram estupro de vulnerável, ou seja, tinham idades entre zero e 13 anos. “Com base nesses dados, podemos afirmar que 60% dos casos de abuso tiveram como vítimas crianças e adolescentes de zero a 11 anos. Foram 24 casos de zero a seis anos e 47 ocorrências com vítimas de 7 a 11 anos”, detalhou o delegado. A maior parte dos abusos foram praticados contra vítimas do sexo feminino, num total de 96 casos. Já do sexo masculino foram 26 registros.

Agressor

Também foi revelado o perfil do agressor dessas crianças e adolescentes. Ainda de acordo com o delegado Ademir de Oliveira, dos 122 casos registrados, grande parte deles foram cometidos por pessoas muito próximas, geralmente da família. “Foram notificados 14 casos praticados pelo pai, 21 pelo padrasto, 11 por um tio, oito pelo avô e cinco por um desconhecido. Isso mostra que os casos quase sempre acontecem dentro da casa das vítimas e muitas delas têm medo de denunciar por sofrerem ameaças”. apontou o delegado.

Programação

Nesta quarta-feira será realizado um seminário sobre o fortalecimento da Rede de Proteção para o Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. O evento será no auditório Denis Bernardes, no CCSA, na UFPE. Já no próximo dia 18 acontecerá uma caminhada com concentração do Parque 13 de maio, a partir das 14h. E desde o dia 5 até o dia 31 deste mês estão sendo realizadas ações e atividades com o tema da campanha das instituições, órgãos públicos, comunidades e municípios.

Aprovado aumento da pena mínima para estupro de menor ou deficiente

Da Agência Câmara

A Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados aprovou proposta que aumenta a pena mínima de oito para 10 anos de reclusão nos casos de estupro de menores de 14 anos ou de pessoas doentes ou com deficiência física, mental ou intelectual – a pena máxima é mantida em 15 anos.

Foto: Paulo Paiva/Esp DP/D.A Press
Foto: Paulo Paiva/Esp DP/D.A Press

A proposta, que modifica o Código Penal (Decreto-lei 2.848/40), também garante a pessoas com necessidades especiais o direito à prática sexual, desde que sejam capazes de manifestar sua vontade. A ideia é que o sexo no contexto de relacionamentos afetivos não seja enquadrado como crime.

Resistência
Hoje, a lei considera estupro de vulnerável o ato sexual envolvendo pessoas com deficiência que não tenham “discernimento para a prática do ato” ou que não possa, por qualquer motivo, oferecer resistência.

A iniciativa inclui entre os casos de estrupo a relação sexual sem consentimento e exige provas de que o réu tenha se aproveitado dessa situação para que seja condenado. A ideia é que o sexo em relacionamentos afetivos não seja enquadrado como crime.

Manifestação da vontade
“Se de um lado, a gente reconhece que é possível que uma pessoa com determinado grau de deficiência manifeste a sua vontade e tenha uma vida sexual ativa, de outro lado, a gente pune quando essa agressão é contra pessoas que não tenham condições de resistir ou manifestar a sua vontade”, explicou a relatora na comissão, Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Defensora da medida, Feghali apresentou substitutivo ao texto original, o Projeto de Lei (PL) 1213/11, do deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT), para agravar a pena para estupro de vulnerável, já que o projeto apenas acrescentava a necessidade de consentir no ato sexual.

Delegacias
A co-fundadora do Movimento Down, Christiane Aquino, também defendeu a proposta, que, em sua visão, confere maior autonomia sexual às pessoas com deficiência. Ainda assim, ela acredita que a sociedade deve ter atitude e incentivar a acessibilidade para combater esse tipo de crime.

“Existem delegacias que não têm interpretes de libras, então uma pessoa surda-muda, que depois da agressão não conseguir se socorrer, mas chegar a uma delegacia para relatar o que ocorreu e não tiver um intérprete, ela nunca vai conseguir relatar o crime ocorrido”, disse.

Abuso
A proposta agrava pela metade a pena nos casos em que o criminoso é parente, cônjuge ou parceiro da vítima; ou se é seu tutor, curador ou empregador, quando o agressor conviva ou tenha convivido com a vítima em contexto de relação íntima. O aumento da pena nesta última hipótese não é previsto na lei atual.

Lesão ou morte
Ainda conforme o texto, se do abuso sexual resultar lesão corporal grave, a pena mínima passa de 10 anos para 12 anos de reclusão – hoje a pena máxima é de vinte anos. Caso resulte em morte, o tempo mínimo de prisão aumenta de 12 anos para 20 anos – a pena máxima é de trinta anos pela lei em vigor.

Tramitação
A proposta ainda será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (inclusive quanto ao mérito), antes de seguir para o Plenário.

Cresce número de adolescentes estupradores

 

Um problema grave e silencioso tem chegado com cada vez mais frequência aos gabinetes da Gerência de Polícia da Criança e do Adolescente (GPCA) e aos consultórios de psicologia. O abuso sexual praticado por adolescentes é, segundo especialistas, um fenômeno novo e que tem preocupado autoridades e psicólogos. Do início do ano, até o final de maio, 16 casos de estupro, onde os autores são menores de 18 anos, foram registrados pela delegacia especializada. Desses, 10 foram de meninos contra meninas e seis entre meninos. As estatísticas revelam ainda que, na maioria dos casos, o abusador é um primo, um irmão ou um vizinho da vítima, que, em geral, é menor de 12 anos. Esse tipo de abuso é percebido em todas as classes sociais, embora tenha mais notabilidade nas camadas mais pobres. Apenas no mês de janeiro, a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase), recebeu 11 adolescentes de todo o estado para cumprir medida socioeducativa por ato infracional correspondente ao crime de estupro.

 

Para o juiz da Vara Regional da Infância e Juventude, Humberto Vasconcelos, e alguns psicólogos que trabalham com crianças, o que tem motivado a ocorrência desses abusos praticados por adolescentes é a falta de orientação sexual nas escolas e também dentro de casa. “É necessária uma intervenção urgente. É preciso prevenir. Invadir as escolas para orientar esses adolescentes”, aponta Vasconcelos. A coordenadora do Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ações Sociais (Cendhec), Valéria Nepomuceno, diz que a carência de estudos e pesquisas sobre esse fenômeno é um grande dificultador para seu entendimento e possível enfrentamento. “É uma situação relativamente nova, mas não temos onde pesquisar suas causas. O Cendhec já recebeu alguns casos de abusos sexuais contra crianças que foram praticados por adolescentes, mas, encaminhamos para a polícia. O que precisamos é saber porque essas coisas estão acontecendo e de políticas públicas efetivas”, afirma Valéria.

 

Especialista em psicologia infantil, Carlos Brito destaca duas causas para a ocorrência desses abusos. “Acredito que a erotização da infância estimula essa cultura de antecipar cada vez mais a infância e as crianças são jogadas na adolescência sem preparação. Além disso, as mídias disponíveis promovem ainda mais essa erotização e as crianças são apresentadas à sexualidade muito cedo”, destaca Brito. Ainda segundo o psicólogo, o outro fator que contribui para esse cenário é a ausência de discussões nas escolas sobre o tema sexo. “Existe uma necessidade urgente de discutir essa problemática. Os namoros estão acontecendo cada vez mais cedo entre estudantes. As escolas precisam abordar esse assunto”, alerta.