Internação compulsória de dependentes criticada por especialistas e governo

Especialistas e representantes do governo criticaram nessa terça-feira (15), em debate na Câmara, o uso da internação compulsória para dependentes químicos como política pública. A representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Eliana Addad, condenou o que chamou de “judicialização da saúde”. “Por que determinar a internação compulsória pelo simples fato de usar droga? Por que a privação de liberdade se não houve descumprimento da lei?”, indagou ela, que participou de audiência promovida pelo grupo de trabalho de saúde mental da Comissão de Seguridade Social e Família.

Ruas do Recife já têm muitos dependentes de crack. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press
Ruas do Recife já têm muitos dependentes de crack. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press

Representante da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Márcia Caldas afirmou que a lógica de punir o usuário, em vez de tratá-lo, é equivocada, e que as alas psiquiátricas dos presídios estão lotadas de pessoas que fizeram uso abusivo de drogas.

“A política pública, como está sendo empregada hoje, conta com o apoio do clamor popular e simplesmente recolhe e segrega o usuário de droga, com a nítida postura de punir. E punir não é uma forma de resolver, pois primeiro a pessoa precisa querer ser tratada”, afirmou.

Para o Assessor Técnico de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde, Daniel Daltin, a discussão sobre a criminalização do usuário é fundamental. “O usuário deve continuar sendo visto e tratado como criminoso?”, questionou.

Em relação à política do governo de atendimento aos dependentes químicos, ele destacou que os hospitais psiquiátricos, vulgarmente conhecidos como manicômios, são estruturas em extinção e não integram a Rede de Atenção Psicossocial (RAP) do Ministério da Saúde.

Maus-tratos
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Internação compulsória causa polêmica no Recife

Nove noites sem dormir, consumindo crack, foram a gota d’água para Lourdes (nome fictício), 26 anos, tomar a decisão de se internar em uma clínica de reabilitação. Depois de experimentar a pedra por curiosidade, aos 17 anos, ela embarcou no vício e na prostituição em uma cracolândia de Santo Amaro. Agora tenta se recuperar em uma unidade do Programa Atitude, do Recife. Lourdes foi uma das participantes da audiência pública realizada nessa segunda-feira, na Câmara de Vereadores do Recife, para discutir o projeto de lei federal 7.663/2010, que prevê internação involuntária (com autorização da família ou parecer médico) para usuários.

Usuária tenta deixar o vício mais uma vez. Foto: Bruna Monteiro/DP/D.A Press
Usuária tenta deixar o vício mais uma vez. Foto: Bruna Monteiro/DP/D.A Press

A proposta não encontra consenso entre segmentos que atuam com dependentes e o debate foi acalorado. A audiência foi convocada pelo vereador Luiz Eustáquio (PT), que é autor de projeto de lei municipal (17/2013) nos mesmos moldes do 7.663, mas que também institui a internação compulsória (com autorização judicial)  e mantêm a comunidade terapêutica Oásis da Liberdade, em Igarassu.

O deputado Osmar Terra (PMDB-RS), autor da proposta federal, participou da audiência e evitou usar o termo “internamento compulsório”. “A ideia é criar a internação involuntária. Depois da desintoxicação, o usuário terá condições de decidir se continua o tratamento”, explicou.

Outro ponto polêmico é o credenciamento das comunidades terapêuticas na rede pública. Os espaços são criticados porque usam a religião na recuperação. “Não podemos cair na catequese compulsória”, destacou Rafael West, coordenador estadual do Atitude.

Demanda

O psiquiatra Evaldo Melo, que atua há 40 anos com o tema, destacou que a internação involuntária já acontece no país. “Mas precisamos de um serviço público que dê conta do crescente número de usuários de drogas”, destacou Melo, que trabalha no Insituto Raid, unidade particular de recuperação. O projeto 7.663 segue para votação na Câmara dos Deputados em 8 de maio e o municipal passará pelas comissões de Legislação e Justiça e Direitos Humanos.

Do Diario de Pernambuco

Internação obrigatória em debate no Recife

A internação compulsória de dependentes químicos volta a ser discutida em audiência pública na Câmara do Recife e reacende a polêmica sobre ações de saúde e segurança voltadas a usuários de crack. Apesar de ser apoiado por parte dos setores de segurança pública dos municípios, o projeto de lei número 17 de 2013 passa longe de ser unanimidade, especialmente entre profissionais que lidam com dependentes e lembram que devem ser feitas ressalvas importantes antes que a medida se torne lei.

De acordo com o próprio vereador autor do projeto, Luiz Eustáquio (PT), se aprovado, atualmente o projeto não teria como ser cumprido. “Apresentamos um projeto que foi aprovado pelo orçamento do então prefeito João da Costa, para a criação de uma clínica pública de internação e tratamento, mas até o momento a ideia não se tornou realidade. Mesmo com os Caps que temos disponíveis, não há como garantir que a intervenção seja satisfatória”, afirma.

Usuários de crack estão por todas as cidades do Brasil. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press
Equipes da Prefeitura do Recife fazem mapeamento dos usuários de crack. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press

Atualmente, o Recife conta com seis Centros de Atenção Psicossocial Especializados (Caps), mas o modelo de tratamento, normalmente, é realizado três vezes por semana, sem opção de internamento, o que se mostra insuficiente para combater o problema. “Mesmo com parcerias, hoje temos praticamente três instituições que oferecem internamento, mas para apenas uns 90 pacientes, quando temos bem mais de 900”, complementa Eustáquio.

Segundo o vereador, no entanto, o projeto é uma forma de forçar o poder público a se posicionar sobre o assunto, investir na recuperação de dependentes e criar uma rede eficiente de combate ao crack.

Para a psicóloga clínica da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Irinéa Catarino, é preciso ter em vista a abordagem humanizada de todo o processo, que não deve ser feito com base na força e violência e só aplicado em casos específicos. “É preciso se munir de todos os meios possíveis para que a pessoa procure voluntariamente ajuda. A intervenção só deve ser feita a partir de uma necessidade médica, com autorização judicial, quando o paciente representar um risco de morte para si ou para terceiros”, defende.

Do Diario de Pernambuco

 

Recife debate internação compulsória de dependentes químicos

Por Raphael Guerra

“A cidade está doente. Do rico ao pobre”. A frase é de Léo (nome fictício), 40 anos. Há 11, ele perdeu tudo para o crack. Passou a peregrinar pelas ruas e dormir em calçadas. A pedra já consumiu boa parte da memória, mas ele ainda se lembra dos familiares, sobretudo dos apelos para que procurasse tratamento. Mesmo em estágio avançado de dependência, não quis ser internado e pôs em risco a vida dos mais próximos. O caso dele não é isolado. Um projeto de lei em tramitação na Câmara de Vereadores do Recife pretende implementar a internação compulsória para dependentes químicos e de álcool. A medida já está em vigor na cidade de São Paulo desde janeiro. Autoridades e especialistas ouvidos pelo Diario foram unânimes em apontar o projeto como positivo para casos em que há risco de morte ao usuário e perigo à família e à sociedade.

Muitos usuários de crack estão pelas ruas do Recife. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press
Muitos usuários de crack estão pelas ruas do Recife. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press

A solicitação de internação poderá ser feita por um familiar ou pela polícia, mas caberá à Justiça a decisão, com base na avaliação de um médico especializado, que vai identificar se o paciente já não tem mais discernimento e corre risco de morte. “Essa escolha pode ser imprescindível para garantir a vida da pessoa. A internação involuntária, que já é realizada aqui, não pode se tornar rotina. Após a desintoxicação, o paciente tem o direito de decidir se quer continuar o tratamento”, pontuou o psiquiatra e psicanalista Evaldo Melo. O projeto de lei, do vereador Luiz Eustáquio (PT), prevê que dependentes sejam encaminhados aos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) Especializados. Atualmente há seis no Recife.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seccional Pernambuco, Pedro Henrique Reynaldo, também é a favor do projeto, que está sob análise de quatro comissões para ir a votação no plenário, possivelmente neste mês. “Mas a voz determinante para a internação deve ser do médico e não do delegado”, reforça. O secretário de Segurança Pública do Recife, Murilo Cavalcanti, tem a mesma opinião. “Essa é uma questão de saúde e tem que ser discutida caso a caso. Quando não há mais escolha, o estado tem que intervir”. Procurado pelo Diario, o Ministério Público de Pernambuco não quis comentar o assunto.

Saiba Mais

Os detalhes do projeto de lei municipal

Na internação compulsória, a avaliação será feita por profissionais de saúde especializados, mediante decisão Judicial

A solicitação poderá ser feita por médicos, pela polícia ou pela família

O médico especializado vai determinar quando será o término da internação

Na internação involuntária, o encaminhamento será feito após solicitação de familiar ou representante legal

O término da internação involuntária ocorrerá após nova solicitação da família ou representante legal, ou por determinação do médico

Na internação voluntária, o encaminhamento à avaliação será feito após pedido por escrito do paciente e aceito pelo médico

Nos três casos, os dependentes em situação de risco serão encaminhados aos Centros de Atenção Psicossocial Especializados (CAPS-AD)

Especialistas serão ouvidos sobre internação compulsória de viciados

A Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado realiza audiência pública na tarde desta terça-feira para debater a internação compulsória de viciados em drogas. O Projeto de Lei 7663/10, que trata do tema, teve recentemente sua urgência aprovada. O autor do requerimento para a audiência, deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), lembra que a internação compulsória foi adotada pelo governo de São Paulo, mas, por não ser consensual, gerou grande polêmica, com discussões mais ideológicas e partidárias que técnicas. Para ele, o assunto ainda não foi discutido com a profundidade que merece.

Participarão do debate:

os deputados Osmar Terra (PMDB-RS), autor do PL 7663/10, e Givaldo Carimbão (PSB-AL), relator do projeto;
o professor titular do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ronaldo Laranjeira, um dos maiores especialistas sobre drogas no País;
o integrante da Associação Brasileira de Psiquiatria Rodrigo Godoy Fonseca;
o professor da Universidade Federal de Campinas Luís Fernando de Tófoli;
o presidente Nacional da Federação de Comunidades Terapêuticas Evangélicas do Brasil (Feteb), Pr. Wellington A. Vieira;
a representante do Conselho Federal de Psicologia Rosemeire Aparecida da Silva;
o diretor-executivo do Viva Rio, Rubem César Fernandes;
a presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Penitenciária (Consej), Maria Tereza Uille Gomes; e
o presidente do Colegiado dos conselhos, Aloísio Antônio Andrade de Freitas.

A audiência será às 14 horas, no plenário 6 da Câmara.

Da Agência Câmara