Amigos de Carlos Percol
A saudade contada em lembranças
Sávio Gabriel
Nos documentos oficiais, o nome completo era Carlos Augusto Ramos Leal Filho. Para a vida, era simplesmente Carlos Percol. Jornalista, foi secretário de Imprensa da Prefeitura do Recife e ex-assessor de imprensa de Eduardo Campos, com quem conviveu durante oito anos, até os últimos dias da vida, encerrada de maneira trágica no acidente do dia 13 de agosto de 2014. Além da família, Percol deixou também uma legião de amigos. Pessoas que presenciaram os momentos marcantes da vida do jornalista e que, com a partida prematura dele, têm uma coletânea de histórias para contar. São relatos que revelam uma irmandade que venceu a barreira do tempo, a correria do dia a dia e que permanecerá sempre na memória.
Se Percol pudesse ser descrito com uma palavra, o termo seria “intenso”. Foi assim que Rubem Barreto, Fernando Macena, Tiago Mariano, Felipe Piereck, Daniel Cavalcanti, Felipe Almeida, Renato Rissato e Jadiael Alexandre o descreveram. “Deus só leva dessa forma as pessoas que prestam. Que eram iluminadas. Percol viveu tudo e foi muito rápido. Ele festou muito, se divertiu muito, trabalhou muito”, comentou Rissato.
Todas as histórias que o grupo viveu junto são motivos para risadas e alguns comentários que dão a dimensão de como eram próximos. Algumas chamam a atenção. É o caso do dia em que Rissato e Percol se conheceram. “Fiz intercâmbio e, quando voltei, minha turma de colégio tinha se aproximado da turma dele. Estavam todos lá em casa, incluindo Percol”. Naquele dia, o então estudante de jornalismo iria fazer uma prova na faculdade e depois voltaria para o evento. “Ele entrou no ônibus e dormiu. O ônibus foi para o centro da cidade e voltou para Boa Viagem. Ele acordou quando estava próximo da minha casa e acabou voltando para a festa sem ter feito a prova”, lembrou, aos risos.
Boêmio, Percol sempre se reunia com o grupo em barzinhos localizados no Recife. Muitas vezes, os encontros aconteciam justamente nos dias em que o Sport Club do Recife – outra paixão do jornalista – estava jogando. Filho do ex-ponta-direita do time pernambucano, Carlinhos Ramos, o jornalista tinha muito orgulho da trajetória do pai. “Uma vez, estávamos assistindo ao jogo em um bar. Um senhor, que estava na mesa ao lado, comentou que se fosse na época de Carlinhos seria bem melhor. Percol escutou, foi lá, conversou bastante com ele, sem se apresentar como filho do jogador. Só depois é que ele falou sobre o pai”, lembrou Fernando Macena.
Para Jadiael, entre tantas histórias, a que ficou mais marcada foi quando convidou Percol para ser o padrinho do filho. “Era uma pessoa que eu gostava bastante. Eu fui padrinho do casamento dele e ele do meu. Foi uma pena não termos concretizado isso na igreja, porque ele faleceu antes do batizado do meu filho”. Coincidentemente, na madrugada deste dia 13 de agosto de 2015, a esposa de Jadiael, Maria Laura, deu a luz ao segundo filho do casal, Jorge Gomes Neto. O parto estava marcado apenas para 3 de setembro. “Quis o destino antecipar o nascimento do meu filho e trazer a alegria quando era só tristeza”, diz Jadiael.
Livro
Percol tinha a pretensão de registrar os bastidores da campanha presidencial de Eduardo Campos em um livro. “Ele tinha esse sonho. Já tinha comentado comigo que tinha a vontade de pegar todo esse momento que estava vivendo e publicar”, disse Jadiael. Segundo ele, o jornalista já estava guardando alguns materiais que serviriam de base para a publicação.
Fernando Macena lembrou que o amigo ficou em dúvida se iria para a campanha de Eduardo Campos ou se ficaria no estado dar um apoio local ao ex-governador. “A dúvida foi até o momento em que Eduardo realmente exigiu ele. Percol era intenso e Eduardo precisava dessa intensidade. Precisava estar em todas as regiões do país. E ele sabia que Percol era o homem, porque foi ele quem percorreu o estado, lá em 2006, quando Campos tinha apenas 3% das intenções de voto”.
No aniversário de 30 anos, Percol reuniu os amigos em um restaurante da Zona Sul do Recife. Entre os convidados, estava Eduardo Campos. “Estávamos todos lá, no grupinho, conversando sobre as farras, coisa que sempre fazíamos, quando Eduardo se aproximou”, contou Fernando. Nesse momento, contou ele, todos ficaram em silêncio e foram surpreendidos pelo ex-governador. “Eduardo virou para a gente e disse: ‘podem continuar conversando, que essas histórias de vocês aí eu sei tudinho. Percol me conta tudo’”.
Orgulho
Todos os amigos do jornalista Carlos Percol tinham muito orgulho da trajetória profissional dele. “Às vezes, vemos pessoas apontando o dedo para outras por coisas banais. Seja porque gostam de beber ou porque jogam video-game. Percol fazia as duas coisas e era um expoente profissional. Estava fazendo muito sucesso”, salientou Daniel Cavalcanti. “O lado profissional era motivo de muito orgulho porque ele era um cara que tava ali com a gente, que viveu muita coisa conosco, e estava crescendo”, acrescentou Renato Rissato, lembrando que o amigo já foi estagiário, trabalhou em loja de shopping e teve sua primeira experiência em campanhas políticas com Jacilda Urquisa, ex-prefeita de Olinda. O último trabalho de Percol antes de ingressar na campanha de Eduardo Campos, em 2006, foi em uma ONG no Cabo de Santo Agostinho.
Apesar do cargo que ocupava, a modéstia era uma de suas principais características. “Percol era muito discreto e simples. Ele precisava estar ali com Eduardo o tempo todo, mas mantendo a discrição. A figura era Eduardo”, pontou Daniel. Os amigos lembram que, apesar da rotina corrida, o jornalista sempre dava um jeito de encontrar os companheiros.
Acidente
No dia 13 de agosto de 2014, os amigos de Percol estavam trabalhando. “Eu estava operando na bolsa (de valores), quando de repente as ações começaram a cair. Disseram que o avião de Eduardo Campos tinha caído. Gelei na hora”, lembrou Felipe Almeida. Imediatamente, ele entrou em contato com Daniel. “Recebi a ligação e entrei em contato com Cecília, que era a esposa. Ela me pediu para rezarmos que não fosse ele”. A partir de então, Daniel era o responsável por dar as informações aos amigos por meio de mensagens de texto ou ligações. “A última mensagem que Percol nos enviou foi às 9h21 daquele dia, dizendo que ia embarcar”, contou Felipe.
Relação com Dona Alzira
Após o acidente, os amigos do jornalista tiveram uma preocupação especial com dona Alzira Braga, mãe de Percol. “Ela era uma preocupação muito grande nossa, porque eles eram muito unidos e Percol tinha um cuidado muito grande com ela. Uma vez, fui ao cemitério e visitei o túmulo dele. Se Percol pudesse pegar um interfone e me ligar para me pedir alguma coisa, ele diria o seguinte: quando puder, dá uma alisadinha (sic) na minha mãe lá”, contou Daniel Cavalcanti.
Desde o acidente, os amigos já fizeram três grandes encontros que contaram com a participação de dona Alzira. “No fim do ano passado, organizamos um almoço e compramos um buquê de flores para ela. No dia das mães, também nos encontramos e levamos uma orquídea. Percol sempre dava uma orquídea para ela nessa data”, lembrou Daniel. O último encontro com a mãe do jornalista foi no dia 15 de julho, aniversário de Percol.
A tragédia do dia 13 de agosto de 2014 deixou um vazio grande no grupo de amigos. A ausência, no entanto, é apenas física. Carlos Percol continua presente na vida de cada um dos irmãos que ele colecionou ao longo da vida.