22 de novembro de 2024

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

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Marcos Braz – Correio Braziliense

No púlpito da igreja evangélica Assembleia de Deus, em Rio Verde (GO), jovens entoaram o coro “Bolsonaro, você não vai perder, eu posso ouvir o choro do PT”, após culto. A cena ocorreu no domingo, e as imagens viralizaram. Casos assim se tornaram comuns nesta campanha eleitoral, polarizada entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual chefe do Executivo. Igrejas têm sido usadas na campanha para pedir voto e até mesmo intimidar pastores, padres e fiéis que divergem de ideologias ligadas à extrema direita. Não há legislação, porém, que tipifique o assédio religioso. Em Luziânia (GO), a líder espiritual da Comunidade Mel de Deus, Débora Mendes, instruiu fiéis a votarem em Bolsonaro no segundo turno, alegando que o PT é entidade maligna, “do inferno”. Ela sustentou ter se certificado de que nenhum integrante do grupo católico votaria em Lula.
O outro episódio envolve a senadora evangélica Eliziane Gama (Cidadania-MA). Ela foi alvo de uma nota de repúdio, formulada pela Convenção Estadual das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Maranhão (Ceadema), por ter anunciado apoio a Lula. Advogado especialista em direito eleitoral, Felipe Corrêa afirmou que o Brasil nunca teve uma legislação específica para tratar casos de abuso de poder religioso. “Houve um esforço na Justiça Eleitoral, diante dessa crescente de casos de preferência religiosa nas eleições, de buscar incluir o abuso de poder religioso como uma forma de abuso eleitoral. Mas a gente nunca teve uma legislação específica sobre isso, e a tentativa de se fazer por interpretação do TSE também não foi aceita”, explicou. Em 2020, o ministro Edson Fachin — que à época era presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — foi o relator do recurso da vereadora de Luziânia Valdirene Tavares dos Santos, cujo mandato tinha sido cassado pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) por pedir votos em evento na Assembleia de Deus da cidade. A reunião com pastores de outras filiais foi convocada pelo pai da candidata, Sebastião Tavares, dirigente da igreja no município.
Fachin propôs um novo entendimento, no sentido de se admitir que o abuso de poder religioso pudesse ser investigado como interferência no processo eleitoral. O ministro argumentou que a separação entre Estado e religião era necessária para garantir ao cidadão autonomia na escolha de representantes políticos. O magistrado salientou que a Justiça Eleitoral deveria impedir que qualquer força coagisse moral ou espiritualmente a plena liberdade de voto.
A Corte, porém, por maioria de votos, rejeitou a possibilidade de apuração da prática abusiva por parte de autoridade religiosa. Corrêa disse que se o resultado da Corte tivesse sido outro, haveria segurança jurídica. “Possibilitaria que a Justiça Eleitoral fosse atrás dessas condutas. Elas não são passíveis de investigação e punição justamente por conta desse entendimento atual do Tribunal Superior Eleitoral”, opinou. “Então, o entendimento que se tem hoje na Justiça Eleitoral é de que abuso de poder religioso não configura um fato punível e investigável no processo eleitoral.”

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