Foto: Evaristo Sá/AFP

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Correio Braziliense

Quinze anos depois, Marina Silva está de volta ao Ministério do Meio Ambiente — que passa a incluir na denominação a expressão Mudanças Climáticas (MMAMC). E chega para cumprir a determinação de Luiz Inácio Lula da Silva de fazer da preservação ambiental uma política de Estado, conforme o presidente se comprometeu com a comunidade internacional durante a participação na COP27, em novembro passado, logo após a eleição. O meio ambiente estará presente em todos os ministérios por meio da “política de transversalidade”.
“A emergência climática se impõe. Queremos destacar a devida prioridade daquele que é, talvez, o maior desafio global vivido presentemente pela humanidade. O governo, que sempre foi protagonista nessa discussão, não se furtará a exercer esse papel de liderança, por meio deste ministério. Essa diretriz passa por recuperar, fortalecer e criar arcabouços institucionais em prol de uma governança climática robusta e articulada, de forma a tratar o tema com a necessária transversalidade, com a participação de todas as instâncias governamentais”, salientou Marina.
A sinalização aos demais ministros pôde ser vista pela presença de integrantes do primeiro escalão do governo Lula, incluindo o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB); a primeira-dama Janja Lula da Silva; o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa; mais cinco ministros e a nova presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros.
Ao discursar na posse de Marina, Rui Costa reforçou a importância que o meio ambiente terá no governo ao afirmar que todos os ministérios terão como objetivo colocar o Brasil como referência em sustentabilidade nos próximos anos. “O Ministério do Meio Ambiente será convidado a participar, desde o início, de todas as concepções desses projetos, substituindo aquela visão antiga de que só entrava depois do projeto pronto para analisar se estava adequado ou não ao Marco Legal. Vamos inverter isso”, garantiu.
Marina anunciou a implementação do Conselho Nacional sobre Mudança do Clima, que será comandado pelo próprio Lula, junto com outros ministérios e sociedade. Já a Secretaria de Autoridade Nacional de Mudança Climática, que terá status de autarquia, será lançada até março para ser submetida ao Congresso até o mês seguinte. Será responsável por produzir subsídios, regular e monitorar instrumentos que devem ser criados para a Política Nacional sobre Mudança do Clima.
A ministra deixou claro, ainda, que o MMAMC retomará os programas de combate ao desmatamento e preservação dos biomas. Para tanto, o Sistema Florestal Brasileiro retorna à pasta, assim como a Agência Nacional de Águas (ANA). Além disso, será criado o Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais.
Também foram criadas quatro secretarias para aumentar a capacidade institucional e desfazer os retrocessos, como classificou Marina, da última gestão: a Extraordinária de Controle do Desmatamento e Ordenamento Territorial; a de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável; a de Bioeconomia e a de Gestão Ambiental Urbana e Qualidade Ambiental.
No discurso, a ministra teceu críticas à gestão ambiental do governo de Bolsonaro (PL), que, segundo ela, colecionou retrocessos e agravou a situação do desmatamento. “O que vivemos nesses anos que se passaram foi um completo desrespeito pelo patrimônio ambiental brasileiro. Nossas unidades de conservação foram atacadas por pessoas que se sentiram autorizadas pelo mais alto escalão do governo”, afirmou.
Como “símbolos tristes” do governo Bolsonaro, a ministra lembrou as mortes do indigenista Bruno de Araújo Pereira, do jornalista inglês Dom Phillips e do líder indígena Janildo Oliveira Guajajara.


Palácio lotado para posse

 A posse de Marina Silva no comando do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática (MMAMC) foi uma das mais concorridas dos últimos três dias. Além de reunir algumas dos personagens mais importantes do novo primeiro escalão governamental, obrigou vários dos convidados a acompanharem a cerimônia, que se realizou no Palácio do Planalto, por telões colocados do lado de fora.
Uma das convidadas ilustres, a ativista e coordenadora do Movimento da Juventude Indígena brasileira, Txai Suruí, se reunirá hoje com Marina a fim de apresentar o programa Novo Acordo Verde, que lista ações voltadas a zerar as emissões globais até 2050. Como pano de fundo, a recuperação econômica do país no neste período pós-covid-19.
De acordo com Txai, o avanço da implementação do programa vinha sendo discutido com o PT antes mesmo da campanha eleitoral por meio do senador Jacques Wagner (PT-BA), futuro líder do governo no Senado. Mas, com a posse de Marina, a intenção é que o MMAMC assuma a coordenação e a execução.
“Agora tem a Marina, que vem com essa proposta não só de transversalidade, mas de trazer a pauta ambiental para o lugar que merece”, disse Suruí ao Correio.

O acordo foi apresentado, em 2021, na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26) pelo deputado Alessandro Molon (PSB-RJ). A tentativa foi de inserir o Brasil novamente no debate da crise ambiental mundial. Agora, com a retomada da prioridade que o meio ambiente terá no governo, Txai enxerga um bom momento para retomar o assunto.
“Sei que os povos indígenas focavam na luta pela vida, pela urgência que se tinha. Mas a gente tem outras propostas, principalmente no que se relaciona com a bioeconomia. A gente entende que o meio ambiente está além e, por isso, é importante a transversalidade, o diálogo com os povos originários. Gostei da sensibilidade da Marina em trazer, também, os povos tradicionais. Os quilombolas, os extrativistas, os ribeirinhos também fazem parte desse ecossistema”, destacou.
A transversalidade proposta por Marina se manifestou, sobretudo, no elogio que fez ao vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin. A ministra fez elogios ao colega de governo ao ressaltar que o discurso de posse no MDICS, mais cedo, já enfatizava a necessidade de conjugar o desenvolvimento por meio da retomada da indústria nacional com as iniciativas de preservação ambiental.
Ainda assim, Marina tem um problema administrativo para cuidar a curtíssimo prazo: a volta da Agência Nacional de Águas (ANA), cuja presidente cumpre mandato. Segundo a ministra, ela e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva respeitarão a permanência de Verônica Sánchez à frente da autarquia. (Com Agência Estado)
O dicionário de Marina

Boiadas

Referência à fala do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na reunião ministerial de abril de 2020. Sales sugeriu alterar legislações para afrouxar as políticas de fiscalização ambiental no Brasil enquanto as atenções da população estavam na pandemia de covid-19.


Desmonte

Marina se referiu à decisão da antiga gestão de retirar do MMA o controle sobre o Serviço Florestal Brasileiro e da Agência Nacional de Águas. Houve, também, decretos que limitavam a atuação do Ibama e do ICMBio.


Pária ambiental

A expressão foi usada pelo ex-presidente do Banco Central, Pérsio Arida, membro do governo de transição. Para ele, o Brasil tem capacidade de atrair capital estrangeiro e “deixar o papel de pária global” para liderar as discussões ambientais.


Transversalidade

Conceito do novo modelo de atuação do MMA, que, segundo Marina, deve dialogar com governos de estados, prefeituras e as demais pastas da Esplanada.


PPCDAM

O Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia, criado por Marina, em 2004, reduziu 83% do desmatamento na floresta até 2012. Foi engavetado no governo Bolsonaro.

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