Por Mirella Falcão *
Como mensurar o sonho de uma vida melhor, a partir de um emprego mais qualificado? Tudo isso tem a ver com o projeto Estaleiro Atlântico Sul (EAS) e é a prova de que o impacto econômico nem sempre pode ser medido em cifras. Por esta razão, quando a Transpetro anunciou que suspenderia as encomendas de 16 navios contratados ao EAS, procurar saber como os 5 mil trabalhadores do empreendimento reagiram à notícia era essencial.
Tentamos contactar aos funcionários por telefone, na segunda-feira, sem sucesso. O medo de se expor ao passar qualquer informação não deixava a conversa avançar. Por este motivo, infelizmente, na primeira reportagem com a repercussão do fato, a visão mais próxima dos trabalhadores se limitou ao discurso dos líderes sindicais. Outras reportagens foram produzidas a partir de especialistas e de uma entrevista com o presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Mas ainda faltavam os trabalhadores.
Talvez, conversando pessoalmente, fosse possível conquistar a confiança deles e conseguir os depoimentos. Mas como chegar até eles? O EAS não liberaria o nosso acesso para conversar com os funcionários, visto que não era do interesse da empresa. Eles também não vivem reunidos em uma vila. Ao contrário, estão dispersos por diversos municípios. Veio o sinal: uma fonte me deu a dica de que, todos os dias, entre 5h e 5h30, os funcionários que moram em Ipojuca se concentram em frente a uma faculdade do município para esperar o transporte que os leva ao estaleiro.
Decidimos arriscar. Madrugamos (com o detalhe de que eu havia deixado o jornal às 23h, no dia anterior) e às 3h30 partimos rumo a Ipojuca. Por medo de nos atrasar, chegamos bem antes do horário dos ônibus, às 4h40. O tempo foi passando e nada dos trabalhadores. Até que surgiram alguns funcionários da Refinaria Abreu e Lima, que também aguardavam o transporte para Suape, e confirmamos que estávamos no lugar certo.
Por volta das 5h45, começaram a chegar os primeiros funcionários do EAS. Ao serem abordados, a maioria não queria falar com a reportagem, como já era esperado. Mas, para minha surpresa, houve quem topasse dar entrevista e, ainda, ser fotogrado. Consegui depoimentos bem ricos. A fotógrafa que me acompanhava, Teresa Maia, teve a ideia de seguir os ônibus e registrar a descida dos trabalhadores, para fazer uma foto com um maior volume de pessoas. O mais provável era que nos barrassem, pois o acesso ao Porto de Suape e, principalmente, às dependências do EAS, é muito restrito. Mas era o nosso papel tentar. Seguimos os ônibus e quando percebemos já estávamos dentro do EAS. Mas a nossa presença por lá não durou muito tempo. Mal a fotógrafa começou a captar as imagens, fomos expulsos pelos seguranças.
Ao retornar para a redação, no final da tarde, recebi alguns telefonemas dos funcionários que eu entrevistei, solicitando que eu não citasse nomes, nem publicasse as imagens deles. Faz parte. Já estava preocupada em prejudicar alguém com a minha reportagem. Afinal, o objetivo era defender os empregos e não provocar demissões. Dessa forma, optamos por não revelar os nomes de ninguém e acredito que não comprometeu o resultado deste trabalho, publicado na edição desta quinta-feira do Diario, no caderno de Economia.
* Repórter de Economia