No dia 28 de julho de 1938, Lampião, Maria Bonita e dez cangaceiros foram mortos por soldados das volantes de Pernambuco e Alagoas, comandados pelo tenente João Bezerra. Os corpos foram saqueados no local. As cabeças foram levadas em um cortejo macabro até Maceió. Em julho de 2008, para marcar os 70 anos do triste fim do casal mais famoso do banditismo no Nordeste, o Diario de Pernambuco publicou uma série de quatro cadernos especiais.

A proposta, aprovada sem ressalvas pela editora geral Vera Ogando, apesar do alto custo que as viagens demandariam, seria percorrer os locais do Nordeste mais emblemáticos da época do cangaço. Os sobreviventes da época deste Nordeste sangrento seriam ouvidos e suas histórias contextualizadas por pesquisadores. Por isso que os cadernos foram enfeixados dentro do projeto “Documento”. Porque jornal serve para isso.  Contar histórias e tornar-se história. E o Diario de Pernambuco, um mais citados pelos entendidos de cangaço, trouxe um material moderno, com design concebido pelo editor de arte Christiano Mascaro.

O experiente fotógrafo Julio Jacobina ficou encarregado das imagens. Para nos acompanhar na jornada, convidei o pesquisador garanhuense Antonio Vilela, que conhecia locais e personagens que poderiam enriquecer o material. Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Sergipe e Bahia foram visitados. Chão, pó, poeira. E muitos relatos de ousadia e covardia na bagagem.

O primeiro caderno de 8 páginas, publicado no dia 7 de julho, trouxe a história de Virgulino Ferreira da Silva, o agricultor e almocreve que depois, por vingança a um ambiente violento, tornou-se o temido Lampião. O pernambuco apenas era seguidor de uma “linhagem” de personagens nordestinos que tiveram seus nomes cantados nas feiras do interior, respeitados e temidos ao mesmo tempo. O historiador Frederico Pernambucano de Mello ajudou a explicar aos leitores o que Cabeleira, Lucas da Feira, Jesuíno Brilhante e Antônio Silvino tinham em comum com Lampião. Cada um tinha razão para pegar em armas e enfrentar a polícia.

No dia 14 de julho, o segundo caderno foi publicado já destacando o sucesso de Lampião como bandoleiro, a sua viagem a Juazeiro do Norte. Já como chefe de bando, ele foi à “Meca do Nordeste” – usei este termo no caderno, uma referência erudita à forma como os primeiros escritores do cangaço tratavam a terra do Padre Cícero, mas isto foi considerado “over” por alguns colegas de redação – para receber patente do Exército e combater a Coluna Prestes. Sem confirmação oficial da alcunha de capitão, mas de armas novinhas em folha, continuou a sua lida sem se meter com os revolucionários. Cada um no seu quadrado.

As páginas centrais do segundo caderno foram dedicados à derrota mais emblemática de Lampião, quando ele foi escorraçado de Mossoró. A cidade do Rio Grande do Norte se orgulha disso e todos os anos encena o feito. É lá que está enterrado Jaracaca, cangaceiro que foi baleado e preso, que virou santo por ter sido executado pela polícia. No dia de finados, seu túmulo chega a ser mais visitado do que os combatentes locais.

No dia 21 de julho, o terceiro caderno foi publicado destacando a entrada das mulheres no cangaço. Nas suas andanças pela Bahia, Lampião caiu de encantos por Maria Déa, que tornou-se Maria Bonita. O toque feminino no bando mudou os hábitos dos bandoleiros. O especial traz histórias de amor e outras trágicas. Ou as duas ao mesmo tempo.

Nas páginas centrais, um toque de almanaque e de revista de história. O ilustrador Greg fez um excelente trabalho facilitando o entendimento do leitor sobre o dia a dia dos cangaceiros, suas táticas, roupas, apetrechos e linguajar. Até Lampião iria aprovar.

No dia 28 de julho, o último caderno especial, que foi publicado justamente no mesmo dia do ataque a Angicos, em Sergipe. Na capa, ao invés de imagens dos cangaceiros, uma foto de Julio Jacobina do local onde tombaram Lampião e Maria Bonita, em preto e branco para manter a unidade gráfica concebida por Mascaro. O local virou ponto turístico e o acesso se dá de barco a partir de Piranhas, simpático município alagoano na outra margem do Rio São Francisco.

A última página central foi dedicada aos personagens que participaram ativamente deste período movimentado no Nordeste. O cangaceiro Candeeiro foi baleado, mas conseguiu escapar da emboscada de Angicos. Os outros foram soldados e alguns chegaram a participar do ataque final.  Alguns já morreram, mas contaram suas histórias. Obrigado a todos por conseguir registrar tudo isto. Um dia vira livro.

Em frente à casa onde nasceu Maria Bonita, uma pose para a posteridade: Julio Jacobina, Antonio Vilela, Chirleno (motorista), Paulo Goethe e a viatura do jornal…

No dia 28 de julho de 1938, Lampião, Maria Bonita e dez cangaceiros foram mortos por soldados das volantes de Pernambuco e Alagoas, comandados pelo tenente João Bezerra.