Em Foco 0307

Cidade que abriga a Arena Pernambuco, que recebeu cinco jogos neste Mundial da Fifa, São Lourenço da Mata fez parte da Copa mas a Copa não fez parte de São Lourenço de Mata. Ela manteve-se como uma desconhecida ilustre, distante, acompanhando os acontecimentos pela TV. É o que destaca o texto de Em Foco do Diario desta quinta-feira, assinado por Silvia Bessa.

Entre ilustres e excluídos

Balanços oficiais do governo e oficiosos feitos por populares mostram frustrações e sucessos de Pernambuco como sede da Copa

Silvia Bessa

O anfitrião merecia (merece) mais. Hoje estamos em dívida com São Lourenço da Mata. Essa é minha primeira parcial da Copa em Pernambuco. Passei a régua depois de ver que o governo acaba de divulgar o balanço oficial do evento no estado. Não falo de uma qualquer. É daquela que serviu de sede para a grandiosa Arena. Da cidade onde talvez houvesse mais moradores por metro quadrado com altas expectativas quanto ao incremento da economia, da melhoria de vida. Daquela então cidade-dormitório da Região Metropolitana do Recife sob a qual recaíram grandiosas promessas de melhoria da infra-estrutura. De um município mencionado por anos na Imprensa do Brasil e do exterior.
Nas ruas, com o apagar das luzes do espetáculo padrão Fifa encerrado oficialmente no domingo com o jogo entre Costa Rica e Grécia, a população faz suas revelações. E deixa claro que São Lourenço fez parte da Copa mas a Copa não fez parte de São Lourenço. Manteve-se como um desconhecido ilustre, distante, acompanhado pela TV.
Lamenta-se, diga-se em endosso ao coro dos moradores. Porque há coro.
É lá que se ouve, por exemplo, um diretor de colégio estadual, chamado André Dantas, dizer sentir como se a Arena não pertencesse à cidade. Imagine só o quanto as pessoas se sentiram à margem do espetáculo. Mais cidadãos do município pensam semelhante a ele. Sequer um telão para que o clima da vizinhança da Arena chegasse à zona urbana, à sede, foi instalado.
Em São Lourenço, eram (são) raríssimos os turistas circulando pelo comércio, mercados, pontos turísticos. Falta até balanço do fluxo turístico no local, para se ter ideia do quão ínfimo é o número. Não havia hotéis para receber os turistas. Muito menos os grandes empreendimentos que seriam levantados em função do falado projeto da Cidade da Copa, que não saiu do papel. Talvez por todos esses motivos e mais alguns, sentimento de pertencimento é algo desconhecido pelos anfitriões locais.
Cita-se o caso de São Lourenço porque há duas lentes com as quais se deve analisar Pernambuco como sede da Copa de 2014. Uma grande angular, na qual se tem uma perspectiva geral, ampliada do mundial, em que se sobressaem os números, sobretudo os do governo. E uma segunda lente, macro objetiva, focada em detalhes, em que se captura os efeitos da Copa sobre uma comunidade, com as respectivas alegrias e frustrações, parecidas com as vistas em São Lourenço.
Abatendo-se a dívida com São Lourenço, ponderando-se aqui que ainda há promessa de ela ser quitada ou reduzida ao longo de décadas, a lente grande angular revela que o saldo parcial da Copa em Pernambuco tende a ficar no positivo. A se tirar pela Secretaria Extraordinária do estado (Secopa), que apresentou estatísticas ontem relativas ao fluxo de turistas, à mobilidade dos torcedores, à segurança e à saúde.
Os de turismo chamaram a atenção. Anunciou o presidente da Empetur, André Correia, que Pernambuco recebeu mais de 400 mil visitantes no mês de junho. O cálculo teve como parâmetro a quantidade de desembarques (266 mil pessoas) no aeroporto do Recife. A ela foi acrescentada a projeção dos que chegaram à cidade de automóveis e por outros meios. A Empetur fez pesquisa junto aos visitantes e concluiu que 47,9% dos turistas do estado vieram por meio de avião.
A pesquisa completa encomendada pela Secretaria de Turismo, por meio da Empetur, será divulgada ao final da Copa. André Correia nos antecipou alguns números que corroboram à tese da concentração dos turistas – e, por dedução, do dinheiro concentrado em poucos municípios: Recife, Olinda e Jaboatão concentraram a maior parte dos turistas brasileiros e estrangeiros. A taxa de ocupação nos hotéis do Recife alcançou 91%; nos demais municípios da Região Metropolitana, ficou em torno de 85%. No que diz respeito ao turista que por aqui passou, aquilo que mais chamou a atenção de André Correia foi o perfil dos visitantes: “53,9% dos torcedores vieram em família”, disse.
Aos poucos o sucesso do transporte público para a Arena nesta Copa, que atendeu a 129 mil usuários; e os sistemas de segurança e saúde aos poucos passarão a ser vistos por lentes específicas.
Tomara que elas façam um fiel retrato da realidade e que nos faça avaliar a nossa conta, acertos e erros, créditos e débitos.