Em Foco 0407

Mais uma vez no sufoco, a Seleção brasileira passou pela Colômbia e está na semifinal da Copa do Mundo. Momento para chorar, de alegria ou alívio. Tema, aliás, do Em Foco deste sábado do Diario, que antecipou em algumas horas o sentimento. O texto é de Luce Pereira.

A lágrima de ouro

Chorar faz parte do espetáculo, o que necessariamente não implica em despreparo, temor, insegurança, mas em emoção pura, que leva a maioria dos jogadores a passar a vida em revista

Luce Pereira

Nada garante que durante a execução do Hino Nacional, hoje, os comandados de Luiz Felipe Scolari não desabem novamente no choro. Ou mesmo se o duelo entre Neymar e James Rodríguez for esticado para uma sofrida e interminável cobrança de pênaltis. Afinal, por mais que se tente, lágrimas não se mantêm presas por obra e graça de psicólogos, sobretudo quando os protagonistas são garotos com nervos e hormônios à flor da pele, sob pressão para deixar um país sorrindo de orelha a orelha. Que chorem, pois não cresceram no lado mais gelado do planeta e sim nos trópicos onde grassam homens com alma de moleque, sem vergonha de chorar até com beijo de novela. Isto, é claro, se a mocinha da história não for a companheira da vida real.
Chorar faz parte do espetáculo, o que necessariamente não implica em despreparo, temor, insegurança, mas em emoção pura, que leva a maioria dos jogadores a passar a vida em revista durante, por exemplo, os poucos minutos antes do início da etapa decisiva da partida, a cobrança das penalidades. Pensam especialmente em Deus e na família, que, para muitos é a mesma coisa. Imaginam os próprios pais (no estádio ou na frente de uma TV), naquele momento, lembrando de toda uma vida – as lutas pela sobrevivência, o sofrimento do começo, as esperanças, as sonhadas conquistas do filho – e então, naturalmente, olho vira queda d´água. Afinal, não vieram do Olimpo, mas da vida como ela é.
Pois que chorem.
Se isso acontecer de novo, hoje, talvez não sejam criticados, somente recebam a solidariedade de um país que, também, vai ouvir o hino com o coração transformado em manteiga. É da natureza dos brasileiros. Por que então chorar seria privilégio apenas da plateia? Já não basta só ela poder roer unha, rezar e ter reações as mais estranhas na hora de demonstrar sua paixão?
Chorem, meninos, e que este choro seja de emoção e alegria. A começar pela Copa que o país fez, oportunidade rara de levar ao mundo a certeza de que ainda não inventaram povo mais feliz, alegre, acolhedor e otimista, apesar dos revezes e de ter testada, tantas vezes, sua imensa capacidade de renascer das cinzas. Se derem a César o que é de César, o sucesso desta festa do futebol mundial tem que ser creditado na conta dessa gente. É por ela, inclusive, que os arraiais do Recife decidirem prolongar a brincadeira: em cada um, telão para que a corrente nacional se fortaleça e o resultado da partida seja comemorado como São João mandou, à moda do povo daqui.
Lágrimas à parte, o certo é que milhões de brasileiros estarão, em campo e fora dele, ao lado da Seleção, torcendo não para que Neymar supere James Rodríguez ou qualquer concorrente no número de gols, mas para que todos os atletas deem o melhor de si jogando o que sabem. Assim, vencer mais uma será apenas consequência desta determinação e da consciência de que o show não deve parar. Não antes de 13 de julho quando o Brasil poderá, enfim, chorar a sonhada lágrima de ouro.