Herdeiros violência

Elas correm pelas ruas com a típica alegria infantil. A cena lúdica esconde as mazelas às quais são submetidas dentro e fora de casa. Estão dentro de um círculo vicioso de violência, que deve transformá-las em futuros agressores. As tintas carregadas da avaliação fazem parte de uma pesquisa realizada pelo Centro de Análises Econômicas e Sociais (CAES) da PUC-RS em três comunidades do Recife: Canal do Arruda, Chão de Estrelas e Santo Amaro. O diagnóstico Infância e violência: cotidiano de crianças pequenas em comunidades do Recife constata que a opressão tornou-se cultural. Pior. Hierárquica, onde o pai bate na mãe, que agride o filho e este reproduz o comportamento agressivo com os menores que ele.
“Existe uma violência cotidiana que subjuga, que faz sofrer de forma silenciosa um contingente não oficial de pessoas indefesas, que são justamente as crianças”, atesta o coordenador da pesquisa, o sociólogo e professor Hermilio Santos. Ele vai mais além: “A gente encontrou os pais batendo nas suas companheiras. E as mulheres são as que mais batem nos seus filhos. A gente encontrou também no Recife um nível elevado de crianças batendo em outras crianças nas escolas. Um batendo no outro. Não significa que uns batem nos outros indistintamente. Bate naquele que ele considera, aos seus olhos, hierarquicamente inferior. Isso é difícil. Isso não é polícia que resolve.”

Os dois parágrafos acima foram escritos pela editora assistente de Economia, Leianne Correia, e abrem a série de cinco reportagens que teve início nesta segunda-feira, na editoria de Local do Diario de Pernambuco. Com a repórter fotográfica Teresa Maia, ela percorreu os becos de três comunidades recifenses que foram alvo de pesquisadores gaúchos. As crianças que vivem por lá são a última ponta de um cotidiano onde o desrespeito é hierárquico. Por isso que a série ganhou o título de Herdeiros da violência. Na sexta-feira, último dia de publicação do especial no jornal, entra no ar o conteúdo ampliado na internet, com vídeos, gráficos e galerias de imagens. É material para ler e pensar. E não ficar só nisso.