Em Foco 0511Um em cada dez motociclistas acidentados deixa o hospital amputado, paraplégico, quadriplégico ou com algum outro tipo de limitação física permanente. Um problema grave que foi reforçado pelo Comitê Estadual de Prevenção de Acidentes com Moto de Pernambuco, que divulgou novos e preocupantes números sobre este problema no trânsito nosso de cada dia. Tema do Em Foco do Diario desta quarta-feira, por Juliana Colares.

Epidemia sem controle

Cerca de 90% dos leitos das enfermarias do Hospital da Restauração são ocupados por vítimas de acidentes de motocicleta

Juliana Colares

Os acidentes de moto continuam dizimando uma geração saudável, quase sempre em idade produtiva. O Comitê Estadual de Prevenção de Acidentes com Moto de Pernambuco reuniu ontem a imprensa para anunciar que, na contramão da meta mundial de redução estabelecida pela Organização Mundial de Saúde, o número de motociclistas mortos no trânsito vai aumentar este ano. Foram 757 em 2013. Deverão ser 820 até o fim de dezembro. Sessenta e três mortes a mais. Oitocentas e vinte mortes preveníveis.
Em agosto de 2010, o especial Caminho sem volta, publicado pelo Diario, já dava a sentença: os acidentes de moto fizeram surgir uma nova epidemia. Ontem, o comitê estadual divulgou dados que não deixam dúvidas quanto ao recrudescimento desse grave – e reconhecido, local e nacionalmente, – problema de saúde pública.
Em 2005, a emergência do Hospital da Restauração atendeu a 2,5 mil condutores e passageiros de motocicletas. Em 2009, foram 2,9 mil, segundo dados divulgados à época. Entre setembro de 2013 e setembro de 2014, mais de 10 mil prontuários daquele hospital registraram os acidentes de moto como causa dos internamentos. Esse número representa quase a metade de todas as 21.674 vítimas de causas externas  – acidentes de trânsito e ferimentos com arma de fogo (14% do total) e com arma branca (6%) – atendidas na unidade.
Além da quantidade, a gravidade dos ferimentos decorrentes de acidentes de moto chama a atenção dos profissionais de saúde. Um em cada dez deixa o hospital amputado, paraplégico, quadriplégico ou com algum outro tipo de limitação física permanente. Cerca de 90% dos leitos da enfermaria do HR são ocupados por vítimas de acidentes de moto. Um grave problema de saúde pública com enorme impacto financeiro – estudo feito este ano com 104 pacientes da Restauração mostra que o tratamento deles custou ao SUS mais de R$ 30 milhões.
Uma epidemia multifatorial que cresceu na esteira da ineficiência do transporte público, da imobilidade do trânsito, do aumento do poder aquisitivo das classes C e D, dos baixos custos desse tipo de veículo, da perspectiva de emprego e renda sobre duas rodas, das facilidades que o veículo representa para quem vive no campo ou nos centros urbanos, de uma fiscalização ineficiente e de uma perspectiva educacional – que reflete no trânsito e é mais ampla que as campanhas de educação no trânsito – que deixam a desejar.
Um caminho traçado anos atrás e que no Nordeste tem contornos, ao mesmo tempo, de desenvolvimento e de subdesenvolvimento. Uma epidemia grave que matou, só em Pernambuco, 881 pessoas em 2011 e 918 em 2012. Que deve tirar a vida de duas pessoas por dia no estado neste ano, além de deixar tantas outras com sequelas graves. Que se transformou em problema maior que a violência urbana. Em 2010, quando o Caminho sem volta foi ao ar (o especial pode ser conferido em www.diariodepernambuco.com.br/caminhosemvolta), já dizíamos que, apesar de estarmos diante de um cenário complexo e de difícil retorno, é possível seguir em frente. Ainda é. Mas é preciso andar mais rápido.