Em Foco 0811

O Nordeste tem uma série de indicadores positivos em escala nacional, na economia e nas áreas sociais. Mangabeira Unger, que foi ministro de Assuntos Estratégicos do governo Lula de 2007 a 2009, preparou um estudo que, infelizmente, não saiu do papel no primeiro governo de Dilma Rousseff. Intitula-se “O desenvolvimento do Nordeste como projeto nacional”. Tema do Em Foco do Diario deste sábado, por Vandeck Santiago.

NE como projeto nacional

Região teve melhorias em todos os indicadores, mas é hora de passar a uma nova fase e ser alvo de um choque de ciência, tecnologia e inovação, diz professor de Harvard

Vandeck Santiago

O professor Mangabeira Unger adora torradas de pão. Comeu umas duas dezenas (daquelas fininhas) enquanto conversávamos no final de tarde num apartamento de uma pessoa amiga dele, na Avenida Boa Viagem. O professor estava no Recife para fazer uma das coisas em que é mestre: dar palestras. Ele é professor de Harvard (Barack Obama foi seu aluno), tem 30 livros publicados em diversos idiomas e é um dos pensadores mais criativos do país. Se o leitor ainda não associou o nome à pessoa, acrescento uma informação para facilitar a tarefa: Mangabeira Unger é aquele camarada de ar intelectual que você já deve ter visto na televisão dando entrevistas em português mas com um tremendo sotaque estrangeiro. Ele foi criado nos EUA e está lá há mais de 50 anos, o que explica sua forma de falar. “Falo com sotaque, mas não penso com sotaque, como muitos políticos brasileiros”, diz ele.
As torradas são apenas uma curiosidade. Lembro-me do professor por causa delas, por dois outros motivos: primeiro porque ele está de novo no Brasil, dando entrevistas e palestras; segundo, porque acabamos de sair de uma eleição em que o Nordeste teve grande evidência. Mangabeira Unger foi ministro de Assuntos Estratégicos do governo Lula de 2007 a 2009 (a entrevista que menciono acima ocorreu em 2010). No cargo ele preparou um estudo que, infelizmente, não saiu do papel no primeiro governo de Dilma Rousseff. Intitula-se “O desenvolvimento do Nordeste como projeto nacional”, e está disponível na internet.
Um documento preparado por um camarada com a estatura intelectual dele é para ser lido, no mínimo, como referência. Mas desconfio que nem no Ministério da Integração Nacional ele, o documento, é considerado como tal. Para executá-lo, Mangabeira Unger viajou pelo interior nordestino e pelas capitais, reuniu-se com movimentos sociais, empresários, prefeitos, governadores. “Não há solução para o Brasil sem solução para o Nordeste”, diz ele.
O Nordeste é hoje uma reunião que, diferentemente do que ocorria em um passado não tão remoto, tem uma série de indicadores positivos em escala nacional, na economia e nas áreas sociais. Enquanto o crescimento nacional deve ficar agora em 0,6%, o previsto para o Nordeste é 4%. Em relação às vendas do comércio, a região mantém o primeiro lugar. Para vocês terem uma ideia, a taxa mais baixa neste setor entre os estados nordestinos (a do Piauí, com 3,3%) é mais de duas vezes a média nacional, 1,4%. Já em relação à miséria, a única região onde ela teve queda em 2013 foi o Nordeste (subiu no Sudeste). É hora, então, de passarmos a uma nova fase, para além do consumo e da criação de empregos – a de ter o Nordeste como projeto nacional.
O estudo do professor Mangabeira prevê, entre outras coisas, 11 ações imediatas para o Nordeste; diretrizes para a política agrícola e industrial (destaque para as pequenas e médias empresas); investimentos em infraestrutura (como a construção de estradas que tirem do isolamento um grande número de localidades) e um choque de ciência, tecnologia e inovação na região, com a criação de um plano específico para isso. Não é um programa pronto e acabado, mas é na pior das hipóteses um documento que deveria ser revisitado pelo novo governo Dilma (e pelos que lhe fazem oposição e querem melhorias para a região).