O problema deve estar na lista dos mais antigos da humanidade. Historicamente não se tem uma data certa de quando a humanidade começou a traçar diferenciações entre os gêneros mas, o fato, é que mesmo com a informação ao estalar dos dedos, com tentativas (e algumas conquistas) diárias, a gente acaba conhecendo sempre alguém vítima dessa chaga chamada machismo. O tema foi o assunto do Em Foco do Diario de Pernambuco desta sexta-feira, por Marcionila Teixeira.
Um grito contra o machismo
por Marcionila Teixeira
Naquele dia, Elvira Freitas precisava desabafar. Se possível, escrever uma mensagem para o mundo inteiro ler. De certa forma funcionou. O longo e envolvente texto preparado pela adolescente de 16 anos alcançou o recorde pessoal de quase 400 curtidas e 38 compartilhamentos na página dela no Facebook. O mérito de Elvira não está somente na quantidade de mãozinhas que saltam na tela representando o símbolo conhecido como legal. Está principalmente em trazer à tona um debate mais que atual de forma extremamente criativa. Além de mobilizar os internautas para apoiar sua luta, levou a mensagem para os colegas da escola onde estuda, o Colégio Dom, em Olinda, de uma forma nunca vista antes. E, mesmo quem não concordou com o ponto de vista dela, ao menos ouviu seu desabafo.
Tudo começou quando Elvira, filha do cantor Lirinha, ex-Cordel do Fogo Encantado, entrou em um debate sobre machismo no Twitter ao retrucar uma mensagem de um jovem morador de Arcoverde, cidade pernambucana onde nasceu. A troca de argumentos chegou a ponto da adolescente sentir-se ofendida, apesar de apoiada por um bom número de seguidores.
Em um trecho do texto postado no Face posteriormente, ela explica o sentimento, comum a tantas mulheres brasileiras. “Ontem me disseram que o machismo não existe. Ontem tentaram me calar. Tentaram me calar dizendo que preciso ter dezoito anos e que nem tenho ‘filho pra criar’ para poder falar alguma coisa. Tentaram me calar dizendo que minha luta não existia. Tentaram me calar dizendo que as pessoas que me escutam, me escutam por conta do meu pai. Tentaram me calar dizendo que luto contra o machismo porque sou lésbica. Tentaram me calar dizendo que me faço de vítima. Tentaram me calar dizendo que sou dramática. Tentaram me calar me chamando de louca. Tentaram nos calar dizendo que a nossa luta, nossa luta de todos os dias, não existe.”
Nos corredores do colégio, Elvira ainda fez mais para ilustrar e fortalecer a postagem no Facebook. Chamou 20 pessoas, entre alunos e professores, para posarem para fotos segurando um cartaz com os dizeres: “Eu luto contra o machismo”. Em uma atitude simples, mas repleta de protagonismo, a adolescente também levou para o colégio um debate que alcançou em cheio o público-alvo, alternativa a qualquer palestra monótona ofertada normalmente nas escolas.
Elvira nem sabia, mas a causa que defende está na crista da onda. O Daily Mail, jornal do Reino Unido, incluiu o Brasil em uma lista de países inseguros para mulheres viajarem sozinhas em uma reportagem sobre “os lugares mais perigosos para mulheres viajantes”. Segundo a publicação, dados do Ministério da Saúde brasileiro apontam que o número de estupros aumentou 157% entre 2009 e 2012, “impulsionados pela cultura machista do país.”
“Não me calei porque amo meu mundo o suficiente para querer justiça. E querer justiça, meus amigos, é sim lutar. É sim lutar contra o machismo que existe, mata, estupra e dói”, desabafou a estudante.
Em outro trecho, Elvira enxerga o que muitas não conseguem ver e apela para a união entre as mulheres. “Diferentemente do que nos ensinaram nossa vida toda, nós não somos suas inimigas, somos suas irmãs e estamos sempre aqui, contra qualquer tipo de opressão. Nossa luta começa em casa, na escola.”
Ponto para o grupo que apoiou diretamente a menina em sua empreitada. Ponto para quem compartilha o fim do machismo, sejam homens, mulheres, adolescentes ou adultos.