Em Foco 0804

Sudeste tem recessão de 0,8%, Rio Grande do Sul não cresce nada e  crescimento do Brasil fica em apenas 0,1%. Enquanto isso, Nordeste cresceu 3,7% e todos os seus indicadores econômicos foram superiores à média nacional. Tema do Em Foco do Diario de Pernambuco desta quarta-feira, por Vandeck Santiago. A foto da página é de Juliana Leitão.

O Nordeste não é SP

Vandeck Santiago  (texto)
Juliana Leitão  (foto)

Eu vou falar sobretudo do Nordeste, mas antes permitam-me dizer que compreendo perfeitamente os queixumes e azedumes de São Paulo e do Sudeste, neste momento. Tem esse problema da falta d’água, que sozinho já é suficiente pra deixar qualquer um irritado, como a gente aqui do Nordeste sabe muito bem. Tem o problema da política: o candidato a presidente que teve 70% dos votos de São Paulo perdeu as eleições. Ainda no campo da política: dois dos quadros mais vitoriosos da política paulista, José Serra e Geraldo Alckmin, do PSDB, foram derrotados em três disputas nacionais seguidas. E, como machado que corta Chico também corta Francisco, do outro lado também tem exemplos: políticos de dimensão nacional do PT, de São Paulo, tiveram os nomes envolvidos em escândalos e alguns até acabaram condenados à cadeia, como José Dirceu, no caso do Mensalão.
Na economia também há dados a acrescentar, como a desaceleração na indústria e no consumo. Em 2014, por exemplo, o Sudeste teve uma recessão de 0,8%, com uma derrocada na indústria de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro (no mesmo período, o Brasil cresceu 0,1%).
Há uma sucessão de fatores criando um ambiente favorável à irritação nessa região (para vocês terem uma ideia, em São Paulo, capital, estão brigando até contra a implantação de ciclofaixas…).
No exato momento em que escrevo este artigo, vejo notícia que acaba de ser divulgada informando que o Rio Grande do Sul (saímos do Sudeste, agora estamos no Sul) “cresceu” 0% em 2014. Ou seja, nada. E o Rio Grande do Sul teve uma supersafra de grãos ano passado. Mas sua indústria teve queda e suas exportações para a Argentina caíram.
Fiz esse arrodeio todo, indo de São Paulo ao Rio Grande do Sul, para mostrar que embora tudo que está acontecendo na política e na economia do Brasil diga respeito ao Brasil e aos brasileiros, as regiões estão vivendo momentos diferentes.
Lá pra baixo há muitos motivos para queixumes e azedumes. Aqui em cima, menos.
É aí que entra o Nordeste. Como vocês viram, em 2014 o Brasil cresceu míseros 0,1%, e o Sudeste teve uma recessão de 0,8%. E o Nordeste? Olha a surpresa: o Nordeste cresceu 3,7%, segundo o Índice de Atividade Econômica regional, do Banco Central, divulgado semana passada, com escassa repercussão (dos veículos nacionais, vi apenas no Valor Econômico). Nos próximos dias deve sair o resultado do crescimento do Ceará, que deve ficar em torno de 4%, segundo estimativas do Ipece (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará). Pernambuco em torno de 3% e a Bahia, 1,5%.
O desempenho do Nordeste foi superior à média nacional em todos os indicadores: agricultura, indústria, serviços e varejo. No chamado “varejo ampliado” (onde entram deste automóveis até material de construção), as vendas no Nordeste cresceram 2,1%, segundos dados do Banco Central. No Sudeste caíram 3,5%. A economia nordestina depende mais do setor público (transferências governamentais etc.), enquanto a do Sudeste é baseada no mercado privado (em que os efeitos da crise têm sido são mais intensos), e isso explica porque aqui as pessoas continuam consumindo e mantendo o mercado em nível de estabilidade, diz o economista Adriano Sarquis, diretor do Ipece.
O crescimento do Nordeste não é uma bolha, concordam economistas citados na matéria do Valor. O ciclo de crescimento da região não chegou ao fim. “Mas o impacto que está sendo sentido no resto do país chegará aqui também”, diz o cientista político Marcos Costa Lima (UFPE), com quem conversei ontem. “O Nordeste cresceu nos últimos anos por impulso deliberado do governo federal. Este crescimento pode cair. Para que a região se mantenha na dianteira que está hoje é preciso que as lideranças regionais se articulem e tomem posição em defesa da região”.
Articulação. Tomada de posição. Não azedumes e queixumes.