Em Foco 0904

Estudo da Universidade de Houston, publicado no Journal of Social and Clinical Psychology, mostra que Facebook contribui para depressão de usuários com perfil de baixa autoestima. Tema do Em Foco do Diario de Pernambuco desta quinta-feira, por Luce Pereira. A ilustração da página é de Jarbas.

Verde é a grama do vizinho

Luce Pereira (texto)
Jarbas (arte)

Psicólogos de renomadas universidades do país vivem a repetir que comparar pode ser péssimo negócio, sobretudo se as referências se mostram desiguais, por exemplo, a própria vida e a de alguém famoso. O mal está em não se levar em conta a trajetória individual, o que quase sempre resulta em frustração, autoestima lá embaixo e até depressão. Porém, o terreno nunca pareceu tão fértil para a prática deste verbo, uma vez que a armadilha aparece diante dos olhos, a um simples deslizar de dedos em telas de aparelhos como smartphones. Ontem, um estudo da Universidade de Houston, publicado no Journal of Social and Clinical Psychology, reforçou a certeza de que esta preocupação não arrefece, nos meios acadêmicos. Muito pelo contrário.
Desta vez o vilão atende pelo nome de Facebook, uma palavra incorporada à rotina de milhões, mundo afora, especialmente de jovens obcecados pela ideia de que a superexposição pode lhes render, no mínimo, a chance de sair do anonimato. O estudo usou 154 pessoas com idade entre 18 e 42 anos, que acessam o aplicativo todo santo dia, e a elas foram entregues questionários nos quais os pesquisadores avaliaram o nível de comparação social e os sintomas de depressão. Os sinais da doença tornaram-se mais visíveis em universitários e a explicação estaria no fato de, ainda não tendo vida e a carreira estruturadas, serem mais afetados por belas fotos e experiências empolgantes ou positivas postadas pelos amigo da lista. O trabalho, inclusive, diz que ao se deparar com realidades virtuais aparentemente mais bonitas e felizes, a tendência de quem tem a autoestima baixa é sofrer alteração de humor.
O assunto vem rendendo pano para as mangas, a cada olhar mais acurado dos pesquisadores sobre o exército silencioso de infelizes atingidos pelas imagens e realidades sob medida postadas em redes sociais. Em julho de 2013, a bola da vez foi o Instagram, apontado em análise do site Slate como responsável por deixar o céu de muitos internautas cheios de nuvens negras a cada olhar para a “grama verde do vizinho”, neste caso, fotos postadas sobre lugares e situações desejáveis por qualquer mortal. Aliás, na avaliação do Slate em que o Instagram aparecia como a rede social que mais causava depressão, Hanna Krasnova, pesquisadora da Universidade de Hombolt (Berlim), defendia que os efeitos de uma foto são muito mais devastadores, nestes usuários, do que os de um simples post, incapaz de causar qualquer inveja. Para piorar, então, haveria ainda uma espécie de “efeito espiral” resultando em competição, pois a tendência seria a pessoa que se sente em desvantagem tirar uma foto aparentando ainda mais felicidade.
O novo título do Facebook como alimentador de tristezas, via comparações, vem no rastro de um estudo que já havia sido feito uma ano antes pelos sociólogos Hui-Tzu Grace Chou e Nicholas Edge, da Utah Valley University (EUA), sob o título Eles são mais felizes e têm vidas melhores que a minha: O impacto do uso do Facebook na percepção sobre a vida alheia. Uma das conclusões a que a dupla chegou: a ideia de que a vida dos outros é melhor cresce entre as pessoas que acesssam o aplicativo por mais tempo. Portanto, melhor começar a considerar que há vida fora das redes sociais e do mundo virtual como um todo.
Aliás, a falta de autopoliciamento no uso de gadgets (aparelhos digitais portáteis), de um modo geral, tem colocado na frente de terapeutas um número cada vez maior de vítimas da nomofobia, a síndrome dos viciados em telefones celulares e internet, que muitas vezes vem associada a conhecidos transtornos de ansiedade (transtorno bipolar, síndrome do pânico…). É quanto se paga por desistir da redescoberta de um mundo que não tem preço – o real.