Em Foco 2604

País aparece na 16ª posição de um ranking de 158 nações avaliadas em estudo da ONU sobre felicidade. Tema do Em Foco do Diario de Pernambuco de domingo, por Luce Pereira. A arte que ilustra a página foi produzida por Jarbas.

Sorria, você está no Brasil

Luce Pereira (texto)
Jarbas (arte)

Bem no olho do furacão que sacode esses tempos bicudos, o cidadão está em dúvida entre se muda para Marte ou Pasárgada quando lê as conclusões do Informe Mundial sobre a Felicidade 2015, onde o Brasil aparece como o 16º país mais feliz entre os 158 pesquisados. Assim, com as barbas de molho e pego de surpresa, o cidadão pode ter duas reações possíveis diante da notícia: ou cai para trás de tanto rir (e aí acaba por assinar embaixo do que diz o estudo) ou se mostra de uma indignação feroz (e então desmoraliza o resultado).
As redes sociais refletiram estes dois comportamentos, na última sexta-feira, praticamente na mesma proporção, o que leva a crer que, divulgados em péssima hora, estudos assim não fariam a menor diferença se permanecessem na gaveta. No entanto, o líder do trabalho em nome das Nações Unidas, Jefrey Sachs, da Universidade de Columbia (EUA), disse, ao comentar a pesquisa, que “este documento mostra como o bem-estar social pode ser alcançado. Não é apenas uma questão econômica, mas também de justiça, honestidade, confiança e boa saúde”. E assim colocou mais pulga atrás da orelha de brasileiros ressabiados com a realidade atual.
Se o ponteiro que mede o nível de insatisfação dos habitantes segue desassossegado, soa quase como chiste as explicações sobre os objetivos do estudo, que está em sua quarta edição anual (da última para cá, o Brasil avançou oito posições): “Cada vez mais a felicidade é considerada um indicador adequado de progresso social e um objetivo da política pública. Um número crescente de governos locais e nacionais estão usando dados e pesquisas sobre ‘felicidade’ em sua busca por políticas que permitam que as pessoas tenham uma vida melhor”, conclui o trabalho.
Dá a impressão, neste caso, que a pesquisa fala apenas dos três primeiros colocados, que aparecem como o suprassumo da felicidade: Suíça, Islândia, Dinamarca, Noruega, Canadá, Finlândia, Holanda, Suécia, Nova Zelândia. Aviso aos internautas que buscavam argumentos para questionar as conclusões: nenhum desses países está na lista dos dez apontados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como os que mais registram suicídios (Lituânia, Coréia do Sul, Guiana, Cazaquistão, Eslovênia, Japão, Sri Lanka, Letônia, Belarus). A situação econômica dos felizardos, a organização social e a decisão de tornar as pessoas o alvo das ações do poder público justificam, de fato, o lugar confortável que os nove ocupam no ranking.
Naturalmente, se a felicidade fosse avaliada no estudo por aspectos subjetivos (confiança, otimismo, persistência …), a posição do Brasil entre os vinte países mais felizes do planeta provocaria orgulho, não ironia. Afinal, não é pouco manter o bom humor, a alegria e a solidariedade quando o barco onde todos navegam atravessa mares os mais revoltos. A felicidade do Brasil parece de nascença. Só se explica, até agora, pela teimosia do povo em assinar embaixo do que diz o poeta sobre a vida: “É bonita, é bonita e é bonita”.