Em Foco 0906

Voto não é algo que você coloca numa caixa e eles ficam todos lá, quietinhos, só esperando a hora de serem resgatados. Não é assim para a oposição nem para o governo. Tema do Em Foco por Diario de Pernambuco desta terça-feira por Vandeck Santiago. A imagem que ilustra a página é autoria de Igo Estrela.

Aécio vem aí (ou não?)

Vandeck Santiago (texto)

O senador Aécio Neves será reconduzido à presidência do PSDB em julho e na ocasião pretende divulgar uma “carta de princípios à nação”, uma lista de propostas do partido para combater os problemas econômicos do país. Noticia a imprensa que a ação do senador faz parte de uma contraofensiva a críticas que tem recebido dentro da própria legenda e à movimentação do outro tucano que almeja candidatar-se à Presidência da República em 2018, o atual governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Quando tem atores fortes no cenário, as eleições costumam começar pelo menos quatro anos antes – a de 2018, por exemplo, já tem os palanques (pré-)montados de Lula pelo PT e de Aécio x Alckmin pelo PSDB.
Além da “carta”, Aécio também vai começar a fazer o que já deveria estar fazendo: viajar pelo Brasil. As primeiras viagens dele já estão marcadas, em 26 de junho, para o Amazonas. Logo após a eleição escrevi aqui nesta coluna que a melhor coisa que ele poderia fazer era viajar país adentro, sobretudo pelo Nordeste. Ter contato direto com a pobreza, tomar um banho de Brasil pobre. Identificar face a face os problemas brasileiros, tornar-se conhecido nas áreas que lhe negaram os votos. Montar um gabinete de estudos para analisar a realidade visitada. Algo assim como o Lula fez nos anos 1990, com a sua Caravana da Cidadania (a foto nesta página mostra o petista em Mirandiba, Sertão pernambucano, em 14 de março de 1993).
Em vez disso, o senador acabou sendo tragado pela agenda dos protestos de rua (que acompanhou de longe, em convocatórias virtuais) e por uma vizinhança conservadora que não lhe acrescenta um voto sequer. Caiu numa armadilha que, pelo menos temporariamente, o deixou com imagem de mau perdedor e ligado a posturas que não são compartilhadas pelos líderes tradicionais do PSDB. “A oposição não deve escorrer para o populismo, e sim apontar caminhos”, escreveu em artigo para O Globo, neste domingo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – que tem se destacado pela clareza e sobriedade na análise da crise do governo e do comportamento que os oposicionistas devem adotar. “A oposição de hoje será governo amanhã”, continua FHC no texto citado: “Não nos aflijamos antes do tempo”. Parecem palavras escritas sob medida para Aécio e outros oposicionistas.
Aécio saiu da campanha presidencial com uma derrota amarga mas com um robusto capital: cerca de 51 milhões de votos e a distinção de ter sido o candidato tucano mais bem votado numa disputa de 2º turno. Claro que votos não são algo que você coloca numa caixa e eles ficam todos lá, quietinhos, só esperando a hora de serem resgatados. Não é assim para a oposição nem para o governo – para este, porém, eles permitiram algo concreto, o poder; para o adversário derrotado os votos não garantem nada concreto, mas tornam-se um referencial importante, um atestado matematicamente comprovável de que ali está um candidato competitivo.
Só isso não será suficiente para Aécio ter garantida a oportunidade de novamente disputar a presidência. Do outro lado está um político vitorioso, o governador reeleito do maior estado do Brasil. Como senador e presidente nacional do PSDB, Aécio leva a vantagem da mobilidade – pode estabelecer a agenda de viagens que bem entender, enquanto Alckmin só pode fazê-lo nos finais de semana. Não adianta chegar nos lugares e não ter uma mensagem clara, capaz de ser bem aceita pelos que vivem lá. Neste momento, então, a melhor coisa que o senador mineiro pode fazer é procurar dar o máximo de consistência à sua “carta de princípios” e botar o pé na estrada.