Em 8 de agosto de 1928, o escritor Mário de Andrade, em visita ao Recife, foi com os amigos conhecer um peixe-boi que vivia em um tanque no Parque Amorim. Usar sirênios da família dos triquequídeos como atração turística continuou sendo uma aposta da capital pernambucana ao longo do século 20. E esta relação forçada entre recifenses e mascote ganhou um símbolo que, aos 52 anos de idade, neste último domingo saiu da vida aquática para entrar de vez na história. Xica – antes era Chico, por incapacidade de identificação de seu sexo quando filhote – viveu por 22 anos na Praça do Derby. Uma história que se confunde com os maus-tratos sofridos pela cidade.
Entre 1970 e 1992, quando finalmente foi transferida para Itamaracá, com a inauguração do Centro de Mamíferos Aquáticos, Xica era visitada por dezenas de pessoas, principalmente crianças. Pena que sua residência não era das melhores. Por conta das dimensões reduzidas do seu tanque, acabou ficando “corcunda” e com queimaduras. No seu novo e espaçoso lar, acabou mantendo a vida solitária, não fazendo contato com os outros das espécie. Mesmo assim, engravidou duas vezes. O segundo filhote, com má formação, ainda resistiu por três anos.
Xica também era filhote quando foi capturada, em 1963, em um curral de pesca em uma praia do município de Goiana. Ficou por sete anos em um tanque de um fazendeiro, até surgir o interesse da Prefeitura do Recife. Já em 1970, o ainda Chico sofreu com as enchentes registradas no mês de agosto, quando o tanque do Derby foi tomado pelas águas da chuva. Em 1975, o mesmo drama se repetiu. Após um dos maiores dilúvios da história, entre 17 e 18 de junho, as autoridades se esqueceram do peixe-boi. Pois não é que o animal permaneceu no seu lugarzinho, alimentando-se do capim que vinha boiando pela correnteza?
Os maus-tratos, mesmo que de forma involuntária, transformaram Xica em um símbolo pelos direitos dos animais. A Associação Pernambucana de Defesa da Natureza (Aspan), com o apoio do Projeto Peixe-Boi/Ibama-FMA, iniciou em 1991 uma campanha para a transferência de Xica. Um ano depois, coincidentemente o da realização da Rio-92 – a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – a mascote do Recife foi viver o resto dos seus dias em Itamaracá. Levantar o animal de quase 400 quilos e três metros de comprimento exigiu uma verdadeira operação de guerra.
Xica morreu aos 52 anos de idade, mais do que a média da sua espécie. Ficou na memória de gerações de recifenses.
Eu ja fui visiar algumas vezes quando criança
Bonito testo, parabéns, nunca cheguei a ver-lá! Que pena…