Em 12 de janeiro de 1978, o Diario de Pernambuco anunciava: a Ponte da Torre iria abaixo naquele dia em menos de dez segundos. A implosão seria a primeira de uma via elevada no Brasil, um fato histórico. A medida – adotada para pôr fim às enchentes do Rio Capibaribe conforme prometido pelo presidente Ernesto Geisel, que esteve no Recife em julho de 1975, por ocasião da “tragédia do século” que culminou no boato do estouro de Tapacurá – gerou uma grande expectativa na população. O resultado? Em vez de aplausos, uma vaia estrondosa. Apesar de meia tonelada de explosivos, a Ponte da Torre não caiu. E o Recife ganhou mais uma história para seu anedotário, com direito a frevo-gozação, ops, frevo-canção.
A Ponte da Torre, na verdade, seria reconstruída mais larga e mais alta. Sua estrutura na época permitia o acúmulo de materiais que, com a elevação da vazão, acabava facilitando a invasão das águas do Capibaribe bairros recifenses adentro. A obra era de responsabilidade do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), ao custo de Cr$ 26 milhões, incluindo também a remodelação da Ponte do Derby.
Conforme chegava a data da implosão, a curiosidade só crescia. Os explosivos foram colocados na base da ponte por 180 trabalhadores, sob orientação do engenheiro-chefe Giovanni Gondim. Na véspera, duas viaturas de polícia ficaram de prontidão para evitar que curiosos detonassem os explosivos antes do previsto. Moradores de edifícios e residências na Rua Conde do Irajá foram visitados por técnicos do Dnocs e da construtora contratada.
No dia 13 de janeiro de 1978, a capa do Diario trazia como imagem principal o momento da implosão, mas a chamada em uma coluna antecipava o fracasso: “Ponte fica firme após implosão”. “Quinhentos quilos de explosivos não foram suficientes para derrubar a Ponte da Torre. A multidão que comparecera ao local para assistir à primeira implosão no Recife, irrompeu numa grande vaia, quando, dissipada a poeira das explosões, ao meio-dia, a ponte permaneceu como estava”, informava o texto. Três repórteres fotográficos ficaram a postos em pontos estratégicos para registrar o acontecimento.
O engenheiro Hugo Takahashi, responsável pelo trabalho e com dez prédios postos abaixo no currículo, justificou-se: “houve algumas falhas técnicas, mas o principal motivo, mesmo, foi o de não termos levado muito a sério a infraestrutura da ponte. A qualidade do concreto é baixa, mas a ferragem é muito boa, impedindo que houvesse a implosão conforme havia sido programada”, disse ao jornal.
Difícil foi convencer depois os operários contratados para recolher os entulhos. Os engenheiros responsáveis tiveram que fazer uma inspeção na estrutura da ponte, comprovando que todos os explosivos haviam sido detonados, para que todos voltassem ao trabalho. Se a implosão tivesse sido bem-sucedida, as três mil e 800 toneladas de material seriam recolhidas em dez dias. Com o fracasso, o prazo subiu para 30. A demolição da estrutura seria feita por três guindastes.
Na página A7, o título da cobertura: “Ponte da Torre resiste ao impacto da implosão”. A sirene soou às 12h15, permanecendo por dez minutos alertando a população para o acontecimento antes que os explosivos fosses acionados. “Deu chabu!”, “Botaram traque de massa para a ponte implodir” e outros comentários revelavam a decepção do público com o resultado. A reportagem do Diario calculou que mais de mil pessoas se aglomeraram nas margens do rio – a uma distância mínima de 200 metros – desde as 11h para assistir de perto a primeira implosão de ponte no Brasil. Teve até quem ficou em botes.
No dia 15 de janeiro, o engenheiro japonês Hugo Takahashi aparece na capa do Diario, anunciando que naquela data, às 8h, uma nova implosão ocorreria na Ponte da Torre, desta vez com um novo processo, utilizando 80 quilos de explosivos. Mais uma vez, a ponte não caiu completamente. O trabalho teria quer concluído com maçaricos para cortar as barras de ferro.
Desta vez não havia público, pela divulgação tardia e proposital do horário da implosão. Takahashi criticou os locutores pelo exagero da primeira implosão: “eles estão acostumados a irradiar futebol e pensaram que seria a mesma coisa. Queriam dizer um monte de palavras para um acontecimento de trinta segundos e disseram um amontoado de bobagens”. O diretor-regional do Dnocs, Artur Lopes de Araújo, explicou: “O que a gente espera é que a ponte seja abalada nas suas bases, não que ela caia. Se cair, será o contrário daquilo que esperamos”.
No dia 16 de janeiro de 1978, a chamada na capa do Diario era de que a Ponte da Torre continuava de pé após a segunda tentativa. A implosão virou piada, e acabou num frevo-canção intitulado E a ponte não caiu, de Mario Griz, interpretado por Beto de Paula. A letra: Eu ri, você também/ todo mundo riu/ a bomba estourou/ mas a ponte não caiu/ o engenheiro pela TV/ anunciava a nova implosão/ E a galera na beira do rio/ mandava o japonês/ para a ponte que não caiu.
E no final de tudo, a ponte foi derrubada como? A promessa de Geisel foi cumprida?
A ponte foi erguida sobre a base da que foi demolida, Henrique.
Massa, Goethe! Adoro essas histórias meio malucas do Recife! 🙂